sábado, abril 16, 2011

caché...


Vi “Caché” diversas vezes. Não sei se gosto do filme. Alguns filmes me deixam assim, como se essa não fosse uma questão. O cinema de Michael Haneke pode ser visto como um discurso sobre uma classe-média à beira da dissolução, como um diagnóstico das feridas a arranharem uma idéia humanista de Europa. Sempre disposto a caminhar entre uma premissa um tanto moralizante e uma prática cinematográfica marcada por um certo sadismo para com seus personagens e espectadores, Haneke, como bem disse Cléber Eduardo, é uma espécie de “Dr. Mabuse do cinema contemporâneo”. E, em “Caché”, o seu projeto cinematográfico atinge o ápice de manipulação. Acho, inclusive, que a origem dos vídeos anônimos – que aparentemente funcionam como o gancho narrativo da trama do longa e se misturam sem nenhuma diferença de textura em relação aos outros tipos de imagem que compõem a história – deve ser levada a sério. De qualquer maneira, o que me chamou atenção dessa vez foi a convivência de europeus e argelinos em “Caché”.

É curioso: mesmo nos sendo apresentado como um sujeito dissimulado, mesmo sendo suspeito de ser o autor das fitas anônimas, há todo um processo de vitimização do personagem argelino, enquanto Georges, o francês, o protagonista, é acusado de todos os males do filme. Neste sentido, parece curiosamente haver uma certa nostalgia pelo retorno a uma política bem definida de oposições, em que, teoricamente, se podia distinguir com maior clareza os “mocinhos” dos “bandidos”. E por fim, fica curiosamente a suspeita de um narcisismo europeu às avessas - “Caché”, então, se aproximaria estranhamente de uma cada vez mais vasta produção hollywoodiana empenhada em “compreender” o problema da África (“Diamante de sangue”, “O senhor das armas”, “Jardineiro fiel”, entre outros). Haneke parece situar a Europa como fonte de todos os males sociais do mundo. Uma perspectiva que não deixa de ser eurocêntrica.

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