quarta-feira, maio 22, 2013

debate sp 3


Ainda no debate em São Paulo, o Luiz Carlos Oliveira Jr descreveu duas das características mais marcantes do cinema do Samuel Fuller: o gosto pelo plano-sequência e o que ele denominou de “montagem de choque” - esta última expressão, na verdade, vem dos franceses, da “Cahiers du Cinéma”, dos anos 50. Na véspera do debate, eu havia revisto “Dragões da Violência” (1957), e essa noção de “montagem de choque” não me sai da cabeça desde então. A questão, pra mim, está no “choque”. Não sei mesmo se este é o termo mais adequado.

Fuller alimenta certamente uma interpretação mais instintiva e original dos conceitos de continuidade e raccord. Os cortes parecem talvez mais associados a uma ideia escorregadia de intensidade dramática. O que faz com que sejamos constantemente surpreendidos. Fuller gosta de sequencias de closes, mudanças repentinas de escala, descontinuidades espaciais, etc. Sem cerimônia, ele vai de um plano médio de um duelo entre dois homens, para o close detalhe do olho de um deles.

Eu compreendo que “choque” tenha sido nos anos 50 um termo apropriado para dar conta da experiência de ver filmes como “Dragões da Violência”. O cinema hollywoodiano mais, digamos, hegemônico, via muitos dos procedimentos de Fuller como “erros”, “idiossincrasias”, como evidências de uma certa primitividade – até mesmo a “Cahiers du Cinéma” recorreu a estão noção de primitivo. É natural, portanto, que a montagem de Fuller fosse vista em relação de antagonismo com a maior parte da produção cinematográfica que lhe era contemporânea, que o espectador se sentisse genuinamente chocado.

Hoje, no entanto, superada muitas destas questões, não vejo em Fuller uma vontade se afirmar em oposição ao que quer que seja. Tampouco sinto-me chocado. Choque implica em conflito, confronto. É de outra ordem a sensação que vem por exemplo do duelo logo no início de “Dragões da Violência”. Existe uma urgência, uma surpresa, talvez uma agressividade sensível... Não sei. Mas esta é a aventura da crítica, o que faz dela algo criativo, e instigante: descrever, dar nome, criar conceitos para aquilo que o cinema já descobriu. 

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