sábado, outubro 07, 2006

The host ***


The host” está certamente entre os melhores filmes deste festival. E é um dos que mais gostei. Não conhecia o cinema do coreano Bong Joon-ho (este é seu terceiro longa) e fiquei completamente embasbacado por seu talento. O filme traz a trágica (e cômica) história da família Park. Eles moram na beira do rio Han, onde anos atrás produtos químicos foram despejados direto de uma base militar americana. O patriarca Park Hie-bong (Hie-bong Byeon) tem uma barraquinha de comida às margens do rio. Seu filho mais velho, Park Kang-du (Kang-ho Song), preguiçoso e um tanto idiota, porém generoso e terno, é pai de uma sensata pré-adolescente (a única da família). A filha do meio é arqueira do time olímpico coreano e o filho mais novo militou pela redemocratização do país e está desempregado. Uma família burlesca, brancaleônica. Num belo dia de sol, surge um monstro no rio aterrorizando toda a cidade e levando com ele a neta querida. É a hora da verdade para cada membro dos Park, que decidem enfrentar o monstro em busca da menina.

The host” é um filme de gênero. Mas talvez seja mais preciso acrescentar um “neo” ou um “pós” ao termo. Pois Bong trabalha nas fronteiras internas do que seria um filme de gênero, nos apresentando um formato deliciosamente esquizofrênico, indo do melodrama à ficção política, do thriller de horror à comédia fantástica, sem nunca perder o controle. Esse hibridismo desconcertante é próprio do nosso tempo. Talvez seja mais exato defini-lo como um filme-experiência de gênero. O cineasta está claramente interessado na experimentação cinematográfica (montagem, mise-en-scène, enquadramento, direção de atores), e nos impressiona pela ousadia de estilo. Por vezes, em cenas como a tentativa de fuga da menina e a ação do filho caçula com bombas caseiras contra o monstro, Bong intervém no ápice da tensão, inserindo detalhes (ora cômicos, ora contemplativos) em ritmo lento. “The host” é o maior entretenimento.

Mas não se engane. Este é um longo essencialmente político. Do prólogo à última seqüência e sua atmosfera contaminada pelo agente laranja, Bong pontua “The host” com algumas estocadas políticas, que, pela forma como são feitas, apontam para deliberada intenção política de seu trabalho. Na verdade, o filme é baseado num caso verídico que levou um americano a ser processado por ordenar o despejo de produtos químicos no rio a um subordinado coreano. E os americanos são pintados aqui como os mais agressivos exportadores de incompetência burocrática e desinformação. Eles decidem que o governo coreano é incapaz de lidar com a situação e se sentem obrigados a intervir, vendendo uma arma química ainda experimentação (o tal agente laranja), e realizando inúmeros testes em cidadãos que poderiam ter contraído um suposto vírus. Cenas mais tarde, um oficial americano confessa não ter encontrado o tal vírus em nenhuma das pessoas que foram apreendidas (e eventualmente mortas em decorrência dos exames para detectar e erradicar a doença), mas conclui que o vírus poderia estar escondido na cabeça da vítima e ordena a operação. Qualquer semelhança com a busca pelos mísseis de destruição em massa não é mera coincidência. Filmaço.

ps: Pelo que sei, “The host” ainda não foi comprado por aqui. Mas, segundo o João F. de Marcelo Mattos, do Almanaque Virtual, “Memórias de um assassinato”, segundo filme do cineasta coreano, está saindo em DVD no Brasil.

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