domingo, setembro 30, 2007

quatro americanos


Fay Grim °

“Fay Grim” é uma espécie de continuação de “As Confissões de Henry Fool” (1997) – talvez o último projeto de boa recepção de Hal Hartley e pelo qual recebeu o prêmio de melhor roteiro no Festival de Cannes. Dessa vez, Fay, a ex de Henry Fool, se vê envolvida numa trama totalmente nonsense de espionagem global. E mais uma vez: Hartley parece interessado única e exclusivamente em copiar Godard. Não dá para entender a onipresença do enquadramento entortado (algo que um Terry Gillian, por exemplo, faz tão bem, mudando de gênero a cada ângulo torto), nem todas aqueles procedimentos de distanciamento (das interpretações a utilização da faixa sonora). O grande problema é que as decisões do cineasta americano parecem todas marcadas por um certo cinismo, pela “pose” modernosa e supostamente inteligente. E Hartley é ainda mais infantil quando o filme parece assumir uma postura denuncista. Neste sentido (diante, por exemplo, da abertura dos arquivos confidenciais da CIA), “Fay Grim” é extremamente redundante e um tanto bobo em todo que diz.

A entrevista **

Impressiona o quão previsível é este filme de Steve Buscemi. Apesar de serem aparamente opostos (ele é um jornalista sério, correspondente de guerra; ela, uma atriz de filmes B de segundo escalão que alcançou a fama pela beleza), sabemos desde o início que “A entrevista” durará até concluir que, na verdade, eles são igualzinhos: para eles a vida é pura e simplesmente um exercício de atuação. Buscemi (para variar, soberbo como protagonista) ainda consegue gerar alguns momentos de interesse e afasta qualquer aproximação mais simplista entre eles (tipo pai e filha, amantes...), mas exagera na caracterização dos personagens e parece por demais consciente do “naturalismo” buscado, e dos caminhos e desfecho de seu longa.

Antiga alegria ***

Muito legal este filme de Kelly Richardt. A cineasta americana trabalha no acúmulo de detalhes e sutilezas. “Antiga alegria” é pura nuance. Separados por tempo indeterminado, e levando vidas completamente diferentes, dois amigos de infância tentam reviver as raízes de sua relação numa viagem às montanhas. Durante a viagem, todo tipo de frivolidades marcam as conversas entre eles. Mas à noite, depois de algumas cervejas e baseados, Kurt diz o que realmente tem em mente: “Sinto sua falta Mark. Quero que sejamos amigos, mas parece que há uma barreira entre nós”. Na verdade, essa viagem é uma busca pelo que Mark e Kurt foram um dia, um retorno a uma certa inocência.

Mas não foi apenas a amizade deles que mudou. A cidade mudou, os tempos mudaram. E eles parecem sofrer pela primeira vez o impacto dessa realidade. É este o verdadeiro interesse de Richardt: traçar a amizade entre dois homens e registrar o momento exato em que ela termina. Kurt e Mark parecem carregar um certo senso de alienação e arrependimento. Mas a culpa não é deles, nem de ninguém. É o tempo. Invencível.

Planeta terror ****

Há uma frase em “Planeta terror” que parece sintetizar o ótimo filme de Robert Rodriguez: "Em algum momento na vida, você encontra utilidade para todos os talentos inúteis que você tem". Na verdade, o cinema de Rodriguez sempre se deu no âmbito do gênero. Seus filmes são propositalmente “vagabundos”, passam ao largo do que nós temos como cinema de bom gosto, e jogam “psicoticamente” com diversos significantes de cinema comercial que o realizador adorava como espectador. Mas o fato é que a relação com o grindhouse lhe fez bem, muito bem. Pois neste gênero tudo é permitido (aos atores, à história, à mise-en-scene...), sem pudor algum. Rodriguez parece livre de compromissos narrativos e fez de “Planeta terror” um vigoroso exercício de vitalidade cinematográfica. Ao espectador, só nos resta entrar no clima. Diversão garantida.

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