domingo, setembro 30, 2007

quatro americanos


Fay Grim °

“Fay Grim” é uma espécie de continuação de “As Confissões de Henry Fool” (1997) – talvez o último projeto de boa recepção de Hal Hartley e pelo qual recebeu o prêmio de melhor roteiro no Festival de Cannes. Dessa vez, Fay, a ex de Henry Fool, se vê envolvida numa trama totalmente nonsense de espionagem global. E mais uma vez: Hartley parece interessado única e exclusivamente em copiar Godard. Não dá para entender a onipresença do enquadramento entortado (algo que um Terry Gillian, por exemplo, faz tão bem, mudando de gênero a cada ângulo torto), nem todas aqueles procedimentos de distanciamento (das interpretações a utilização da faixa sonora). O grande problema é que as decisões do cineasta americano parecem todas marcadas por um certo cinismo, pela “pose” modernosa e supostamente inteligente. E Hartley é ainda mais infantil quando o filme parece assumir uma postura denuncista. Neste sentido (diante, por exemplo, da abertura dos arquivos confidenciais da CIA), “Fay Grim” é extremamente redundante e um tanto bobo em todo que diz.

A entrevista **

Impressiona o quão previsível é este filme de Steve Buscemi. Apesar de serem aparamente opostos (ele é um jornalista sério, correspondente de guerra; ela, uma atriz de filmes B de segundo escalão que alcançou a fama pela beleza), sabemos desde o início que “A entrevista” durará até concluir que, na verdade, eles são igualzinhos: para eles a vida é pura e simplesmente um exercício de atuação. Buscemi (para variar, soberbo como protagonista) ainda consegue gerar alguns momentos de interesse e afasta qualquer aproximação mais simplista entre eles (tipo pai e filha, amantes...), mas exagera na caracterização dos personagens e parece por demais consciente do “naturalismo” buscado, e dos caminhos e desfecho de seu longa.

Antiga alegria ***

Muito legal este filme de Kelly Richardt. A cineasta americana trabalha no acúmulo de detalhes e sutilezas. “Antiga alegria” é pura nuance. Separados por tempo indeterminado, e levando vidas completamente diferentes, dois amigos de infância tentam reviver as raízes de sua relação numa viagem às montanhas. Durante a viagem, todo tipo de frivolidades marcam as conversas entre eles. Mas à noite, depois de algumas cervejas e baseados, Kurt diz o que realmente tem em mente: “Sinto sua falta Mark. Quero que sejamos amigos, mas parece que há uma barreira entre nós”. Na verdade, essa viagem é uma busca pelo que Mark e Kurt foram um dia, um retorno a uma certa inocência.

Mas não foi apenas a amizade deles que mudou. A cidade mudou, os tempos mudaram. E eles parecem sofrer pela primeira vez o impacto dessa realidade. É este o verdadeiro interesse de Richardt: traçar a amizade entre dois homens e registrar o momento exato em que ela termina. Kurt e Mark parecem carregar um certo senso de alienação e arrependimento. Mas a culpa não é deles, nem de ninguém. É o tempo. Invencível.

Planeta terror ****

Há uma frase em “Planeta terror” que parece sintetizar o ótimo filme de Robert Rodriguez: "Em algum momento na vida, você encontra utilidade para todos os talentos inúteis que você tem". Na verdade, o cinema de Rodriguez sempre se deu no âmbito do gênero. Seus filmes são propositalmente “vagabundos”, passam ao largo do que nós temos como cinema de bom gosto, e jogam “psicoticamente” com diversos significantes de cinema comercial que o realizador adorava como espectador. Mas o fato é que a relação com o grindhouse lhe fez bem, muito bem. Pois neste gênero tudo é permitido (aos atores, à história, à mise-en-scene...), sem pudor algum. Rodriguez parece livre de compromissos narrativos e fez de “Planeta terror” um vigoroso exercício de vitalidade cinematográfica. Ao espectador, só nos resta entrar no clima. Diversão garantida.

quarta-feira, setembro 26, 2007

três orientais


A maldição da flor dourada °

Ao contrário de muitos por aí, gosto bastante de “Herói”. Neste caso, a “americanização” (não sei se essa é a expressão mais correta) apontou/realçou o talento de Zhang Yimou para outros caminhos. As lutas coreografadas à perfeição, a obsessão pelo trabalho das cores e a idéias de heroísmo estavam aqui a serviço, sublinhadas por míticas histórias de amor. O cineasta chinês nunca havia atingido um grau tão sofisticado. “Heróis” é um espetáculo visual!

Desde então, Yimou parece deslumbrado com tudo isso. Seus filmes seguintes parecem interessados em bater a todo custo a sofisticação deste filme. O "Clã das Adagas Voadoras" ainda guardava algumas qualidades por debaixo daquela insanidade cromática e motora. Mas “A Maldição da Flor Dourada” não. Aqui há overdose e muita preguiça. Yimou inverteu as prioridades: mais vale a retumbância visual (que, convenhamos, já é lá evidente) do que a construção dramática e dos planos. O cineasta filma de maneira irritantemente burocrática, sem atmosferas e ritmo, sem se relacionar com nada. E mesmo nas seqüências de luta (impressionantemente “fakes”), Yimou parece mesmo engolido por um “complexo” de grandeza. “A Maldição da Flor Dourada” é apenas um novelão mexicano com pitadas shakespearianas (com direito a caso entre a Imperatriz e seu enteado e filhos disputando o trono), muito dinheiro e efeitos.

Luxury Car *

Na dá para conceber “Luxury car” como vencedor do Un Certain Regard 2006. É péssimo este filme de Wang Chao – assistente de direção de Chen Kaige por muitos anos. O longa começa como uma viagem de busca ao seio familiar, regada de conflitos geracionais, e termina como um melodrama raso com pitadas de policial urbano. A idéia era falar dessas duas Chinas (a rural e a urbana) convivendo num mesmo tempo, mas o filme se desenvolve por meio de viradas mirabolantes a ponto do ridículo. O cineasta é extremamente didático em termos narrativos, precário nas interpretações e até mesmo primário tecnicamente - com uma fotografia um tanto artificial trabalhando contra o longa (vide a foto aí ao lado). Em algumas seqüências, me senti mesmo bem constrangido.

Humilhação *

Assistir “Humilhação” do japonês Masahiro Kobayashi foi para mim uma experiência antropológica impressionante. É difícil compreender o que se passa com a jovem Yuko (Fusako Urabe), personagem central do filme. Após ser seqüestrada e fazer o governo negociar seu resgate, ela retorna ao Japão e passa a ser humilhada por estranhos e conhecidos – e olha que Kobayashi se baseou em fatos reais. De bom, há a imagem/barulho do mar quase sempre na (extra)tela e a maneira como o Iraque se faz presente como uma evocação de todo um leque bem específico de sentimentos. Fora isso, “Humilhação” é um filme bruto (num mal sentido mesmo) em seus enquadramentos (que parecem completamente desconectados da narrativa), nas interpretações dos atores, em sua faixa sonora. Às vezes parece preguiça; noutras dá a entender uma busca por um “não estilo”. A câmera parece se esforçar na trepidação, investindo em movimentos estranhíssimos. E em nenhum momento (excetuando, talvez, as cenas em que a protagonista engole sua comida) o sofrimento daqueles personagens é exatamente palpável ou por nós compartilhado... E aí, como se já não bastasse a distância cultura entre eu e o filme, “Humilhação” vai aos poucos esvaziando sua dramaticidade.

quinta-feira, setembro 20, 2007

festival do rio

Mais um Festival do Rio! O segundo do Kinos!

A seleção até que está boa, melhor do que a do ano passado, pelo menos. Com sempre, muitos ficaram de fora (Hou Hsiao-hsien, Wong Kar-wai, Brian De Palma, Cronenberg, o trio Tsui Hark, Ringo Lam & Johnnie To, os irmãos Coen, Bela Tarr, o novo Sokurov...) e impressiona a quantidade de filmes de 2005. A Première Brasil também continua num bom nível, em especial (mais uma vez) os documentários. As mostras paralelas é que continuam caindo em qualidade – e os filmes de John Wayne serão exibidos em DVD.

Mas Festival é Festival. Abaixo, algumas indicações. Os que já vi seguem com uma cotação – o que não quer dizer que não vá escrever sobre eles. Muitos já foram comprados para exibição no Brasil. Mas nunca se sabe, eles podem levar dois anos e no fim saírem apenas em DVD – vide “Last days”, do Gus Van Sant.

Os que não posso deixar de ver:

Síndromes e um Século, de Apichatpong Weerasethakul *****
O Estado do Mundo, de Wang Bing, Pedro Costa, Apichatpong Weerasethakul, Chantal Akerman, Vicente Ferraz e Ayisha Abraham
Cristóvão Colombo - O Enigma, de Manoel de Oliveira
Sempre Bela, de Manoel de Oliveira *****
Floresta dos Lamentos, de Naomi Kawase
Império dos Sonhos, de David Lynch
Paranoid Park, de Gus Van Sant
A Prova de Morte, de Quentin Tarantino
Não Toque no Machado, de Jacques Rivette
Go Go Tales, de Abel Ferrara
I'm Not There, de Todd Haynes
Mulher na Praia, de Hong Sang-Soo
O Sol, de Aleksandr Sokurov ***
Armênia, de Robert Guédiguian
O Expresso Darjeering, de Wes Anderson
Eu Não Quero Dormir Sozinho, de Tsai Ming-liang **
Shortbus, de John Cameron Mitchell ***
Hana, de Hirokazu Kore-Eda
Lust, Caution, de Ang Lee
Silenciosa Luz, de Carlos Reygadas

Os que tenho curiosidade de ver:

Nascido e Criado, de Pablo Trapero
4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias, de Cristian Mungiu
Antes Que o Diabo Saiba Que Você Está Morto, de Sidney Lumet
Uma Moça Dividida em Dois, de Claude Chabrol
Une vieille maîtresse, de Catherine Breillat
As Testemunhas, de André Techiné
Papel Não Embrulha Brasas, de Rithy Panh **
Jia Zhang vai para casa, de Damien Ounouri
Mister Lonely, de Harmony Korine
For your consideration, de Christopher Guest ***
Luxury car, de Wang Chao
A maldição da flor dourada, de Zhang Yimou
Controle, de Anton Corbjin
Zoofilia, de Robinson Devor
Desejo e reparação, de Joe Wright
Entrevista, de Steve Buscemi
Em Paris, de Chritophe Honoré
Fados, de Carlos Saura
Planeta Terror, de Robert Rodriguez
Sombras de Goya, de Milos Forman
A Cada um seu Cinema, de Theo Angelopoulos, Olivier Assayas, Billie August, Jane Campion, Youssef Chahine, Chen Kaige, Michael Cimino, Joel e Ethan Coen, David Cronenber, Luc e Jean-Pierre Dardenne, Manoel de Oliveira, Raymond Depardon, Atom Egoyan, Amos Gitai, Alejandro González Iñarrítu, Hou Hsiao-hsien, Aki Kaurismaki, Abbas Kiarostami, Takeshi Kitano, Andrei Konchalovski, Claude Lelouch, Ken Loach, Nanni Moretti, Roman Polanski, Raul Ruiz, Elia Suleiman, Walter Salles, Tsai Ming-liang, Gus Van Sant, Lars von Trier, Wim Wenders, Wong Kar-wai e Zhang Yimou
Smiley Face, de Gregg Araki
Antiga Alegria, de Kelly Reichard
De Volta à Normandia, de Nicolas Philibert

documentários

“Person” e “Santiago” são documentários em primeira pessoa, seguem a auto-representação como um caminho para o reconhecimento e fortalecimento individual. Ambos dão ainda mais ênfase às características subjetivas da experiência e da memória, e se afastam do relato objetivo. E aí, a própria característica referenciais do documentário, que atesta sua função de janela aberta para o mundo, dá lugar a uma característica expressiva que afirma “a perspectiva extremamente situada, concreta e nitidamente pessoal de sujeitos específicos, incluindo o cineasta”, como diria Bill Nichols. Tanto “Person quanto “Santiago” parecem exigir nosso engajamento afetivo, nossa cumplicidade para com a visão de mundo apresentada. O documentário em primeira pessoa torna o espectador seu primeiro referente.

Person ***

“Person” é mesmo uma espécie de acerto de contas em família (o próprio nome do filme engloba tanto o objeto do documentário quanto a diretora, sua irmão e sua mãe), não simplesmente homenagem ao pai, mas uma rememoração, uma busca por ele. E assim, Marina Person tenta equilibrar um registro afetivo e histórico. De Luiz Sérgio Person vemos um misto de memória, fotos e filmes em super-8, aparições na TV, relatos de amigos e familiares e, sobretudo, seus filmes. E neste mosaico, é curioso como nos aproximamos do cineasta tanto quanto a ele nos distanciamos.

Person foi diretor de poucos filmes. Todos eles estão presentes no documentário, em especial “São Paulo S/A” e “O Caso dos Irmãos Naves”, seus dois trabalhos mais celebrados. E Marina parece aqui nos convidar para um passeio por algumas cenas destas obras-primas, tentando compartilhar conosco essa procura pelo porquê de tanta admiração. Talvez haja um formalismo um tanto excessivo nas entrevistas, além de algumas redundâncias e um “cuidado” com as conversas familiares e as palavras utilizadas que pode parecer “pose”.

Mas “Person” é extremamente sensorial. Marina não camufla seus sentimentos, é onipresente e corajosa - admite não lembrar da mãe enquanto o pai estava vivo, homenageia a irmã Domingas... O documentário é quase como que sobre um encontro. Um filme aberto, cauteloso no que diz respeito a conclusões. Não abrem mão de conhecer, mas não tem ambições de conhecer tudo. E o longa ainda termina com um belíssimo plano, com as irmãs (Marina e Domingas) saindo de um túnel, caminhando de costas para a câmera, em cima dos trilhos de um trem, indo ao encontro da luz.

Santiago *****

“Santiago” é um marco na história do documentário brasileiro. Antes de tudo, o filme não é uma coisa só, mas muitas. O documentário não é apenas uma conseqüência do tema, mas uma forma de se relacionar com o tema. João Moreira Salles busca uma maneira de narrar que revele a natureza dessa relação entre ele e seu “objeto”, deixa a fórmula “eu falo sobre ele para nós” de lado e investe na “eu e ele falamos de nós para vocês”. E daqui se estabelece uma relação virtuosa entre episteme e ética.

“Santiago” é um filme sobre o argentino Santiago Badariotti Merlo e as associações que essa figura do mordomo é capaz de articular nas memórias de JMS. Li por aí que Santiago seria um personagem quase fictício. Mas muito pelo contrário, ele é humano, demasiado humano. A verdade da experiência humana para o cineasta é infinitamente aberta. Santiago apenas adotou possibilidades talvez incomuns de se significar o mundo, adornando sua vida com um sentido transcendente. E assim, a “casa da Gávea” vira o Palazzo Pitti de Florença e todas as dinastias do mundo lhe são contemporâneas. JMS se mostra fascinado pelas recriações de Santiago e generoso em sua receptividade às recriações do mordomo e em seu respeito pelo mistério que a figura dele traz em si.

“Santiago” também fala de um filme que não deu certo. O documentário se transforma numa espécie de mea-culpa. No retorno às velhas cenas, JMS é impiedoso consigo mesmo, explicita suas interferências arrogantes, as repetições, a brutalidade das claquetes, as encenações constrangedoras. Ele nota, por exemplo, que não havia feito nenhum close de Santiago. Alguns partem para uma leitura de classes (que, aliás, certamente existe), mas, na verdade, trata-se de uma situação em que diretor e patrão se confundem irremediavelmente.
Essas “descobertas” acabam também por esclarecer as transformações pelas quais seu olhar de cineasta passou desde 1992. JMS não acredita mais nas imagens estetizantes, nas manipulações, no processo de aproximação com o entrevistado. Alguns argumentam que há vaidade na constatação do documentarista sobre sua evolução como cineasta, mas, se existir, ela é plenamente justificada pelo próprio filme.

“Santiago” é ainda um filme sobre seu próprio processo de criação, um filme sobre si mesmo. JMS assume os próprios erros e insiste que num documentário existe tanto de mentira quanto de verdade, desconstruindo o tempo todo a validade de sua narrativa. O subtítulo de “Santiago” chama-se “uma reflexão sobre o material bruto”. E neste sentido, o cineasta nos sugere que é preciso desconfiar da autenticidade das imagens. Ele reexamina o conteúdo de certos planos realizados em 1992 e enxerga no material bruto (reduto de objetividade para alguns documentaristas) os rastros de uma vontade sem limites de enquadrar a “realidade” na imagem que ele então queria para o filme.

terça-feira, setembro 18, 2007

Os melhores dos anos 50 (segundo o Kinos)

A Liga dos Blogues Cinematográficos postou hoje um ranking dos 20 melhores filmes da década de 50 segundo seus integrantes. Abaixo, segue a lista que enviei à liga (os filmes não estão em ordem de preferência). Devo dizer que não sei bem se ainda concordo com ela... Mas enfim... Para fazer a seleção, acabei montando uma lista enorme de possíveis filmes... Filmes fundamentais.

Viagem à Itália - Roberto Rossellini (1955)
A Marca da Maldade - Orson Welles (1958)
Rastros do ódio - John Ford (1956)
A Palavra - Carl Dreyer (1955)
Lola Montès - Max Ophüls (1955)
Delírio de Loucura - Nicholas Ray (1956)
Um Corpo Que Cai - Alfred Hitchcock (1958)
Era uma vez em Tóquio - Yasujiro Ozu (1953)
As Ferias do Sr. Hulot - Jacques Tati (1954)
Umberto D - De Sica (1952)
A Morte num Beijo - Robert Aldrich (1955)
Eu, um Negro - Jean Rouch (1959)
Imitação da vida - Douglas Sirk (1959)
Pickpocket - Robert Bresson (1959)
Onde Começa o Inferno - Howard Hawks (1959)
Rashomon - Akira Kurosawa (1951)
Contos da Lua Vaga - Kenji Mizoguchi (1953)
Crepúsculo dos Deuses - Billy Wilder (1950)
Noite e Névoa - Alain Resnais (1955)
O sétimo selo – Ingmar Bergman (1958)

1950
O Rio Sagrado (Jean Renoir)
Diário de um Pároco de Aldeia (Robert Bresson)
Milagre em Milão (Vittorio De Sica)
Os Esquecidos (Luis Buñuel)
A Malvada (Joseph L. Mankiewicz)
Crepúsculo dos Deuses (Billy Wilder)
Vivamos Hoje (Jacques Becker)
Les Miracles n'ont lieu qu'une fois (Yves Allégret)
O Preço de uma Vida (Edward Dmytryk)
O Pai da Noiva (Vincent Minnelli)
O Matador (Henry King)
No Silêncio da Noite (Nicholas Ray)
Orfeu (Jean Cocteau)
A Caravana Perdida (John Ford)
Aviso aos Navegantes (Watson Macedo)

1951
A Montanha dos Sete Abutres (Billy Wilder)
Bellissima (Luchino Visconti)
O Dia em que a Terra Parou (Robert Wise)
Hotel des Invalides (Franju)
Cantando na Chuva (Stanley Donen / Gene Kelly)
The Steel Helmet (Samuel Fuller)
Uma Rua Chamada Pecado (Kazan)
Rashomon (Akira Kurosawa)
1952
Assim Estava Escrito (Vincent Minnelli)
O rio da Aventura (Howard Hawks)
Desengano (Lang)
Europa 51 (Rossellini)
Viver (Akira Kurosawa)
Oharu (Kenji Mizoguchi)
Luzes da Ribalta (Chaplin)
Madame de... (Max Ophuls)
Umberto D (De Sica)
Carnaval Atlântida (José Carlos Burle)
Simão, o Caolho (Alberto Cavalcanti)

1953
A Roda da Fortuna (Vincent Minnelli)
Os Homens Preferem as Loiras (Howard Hawks)
A Carruagem de Ouro (Jean Renoir)
O preço de um homem (Anthony Mann)
O Anjo do Mal (Samuel Fuller)
Era uma vez em Tóquio(Yasujiro Ozu)
Contos da Lua Vaga (Kenji Mizoguchi)

1954
Os sete samurais (Akira Kurosawa)
A Condessa Descalça (Joseph L. Mankiewicz)
Johnny Guitar (Nicholas Ray)
As Ferias do Sr. Hulot (Tati)
Janela Indiscreta (Hitchcock)
O Rio das Almas Perdidas (Preminger)
O Intendente Sansho (Kenji Mizoguchi)
Sedução da Carne (Visconti)
Homens indomáveis (Alan Dwan)
Nasce uma Estrela (Cukor)
O Salario do Medo (Clouzot)
1955
Viagem à Itália (Roberto Rossellini)
A Palavra (Carl Dreyer)
A Grande Chantagem (Robert Aldrich)
Lola Montès (Max Ophüls)
Les Mauvaises rencontres (Alexandre Astruc)
A Estrada da Vida (Federico Fellini)
A Condessa Descalça (Joseph L. Mankiewicz)
A Morte num Beijo (Robert Aldrich)
Rififi (Jules Dassin)
Abismo de um Sonho (Federico Fellini)
Artistas e Modelos (Frank Tashlin)
Noite e Névoa (Alain Resnais)
Vidas Amargas (Elia Kazan)
O Homem do Braço de Ouro (Preminger)
Mr. Arkadin (Welles)
O Mensageiro do Diabo (Charles Laughton)
Juventude Transviada (Nicholas Ray)
Rio, 40 Graus (Nelson Pereira dos Santos)

1956
Um Condenado à Morte Escapou (Robert Bresson)
Grilhões do Passado (Orson Welles)
Sedução da Carne (Luchino Visconti)
Sorrisos de uma Noite de Amor (Ingmar Bergman)
No Silêncio de uma Cidade (Fritz Lang)
Dançando nas Nuvens (Stanley Donen & Gene Kelly)
Nunca Fui Santa (Joshua Logan)
O Homem Que Sabia Demais (Alfred Hitchcock)
A Travessia de Paris (Claude Autant-Lara)
Sete homens sem destino (Budd Boetticher)
Aparajito (Satyajit Ray)
Delírio de loucura (Nicholas Ray)
Vampiro de Almas (Don Siegel)
O Grande Golpe (Stanley Kubrick)
Um Condenado a Morte Escapou (Bresson)
Rastros do ódio (John Ford)
No Silêncio da Cidade (Fritz Lang)

1957
Um Rei em Nova York (Charles Chaplin)
Em Busca de um Homem (Frank Tashlin)
Noites de Cabíria (Federico Fellini)
O Homem Errado (Alfred Hitchcock)
Ensaio de um Crime (Luis Buñuel)
Noites de Circo (Ingmar Bergman)
Suplício de uma Alma (Fritz Lang)
Doze Homens e uma Sentença (Sidney Lumet)
Amargo Triunfo (Nicholas Ray)
La Casa del ángel (Leopoldo Torre Nilsson)
A Ponte do Rio Kwai (David Lean)
Aconteceu em Veneza (Roger Vadim)
Palavras ao Vento (Douglas Sirk)
Ou Vai ou Racha (Frank Tashlin)
Rio, Zona Norte (Nelson Pereira dos Santos)
Trono manchado de sangue (Akira Kurosawa)
Tarde Demais para Esquecer (McCarey)
Forty Guns (Samuel Fuller)
Um Rei em Nova York (Chaplin)
Kiss (Yasuzo Masumura)
Gloria Feita de Sangue (Kubrick)
A Embriaguez do Sucesso (Alexander Mackendrick)
1958
A Marca da Maldade (Orson Welles)
O Sétimo Selo (Ingmar Bergman)
Um Rosto na Noite (Luchino Visconti)
O Grito (Michelangelo Antonioni)
Bom Dia, Tristeza (Otto Preminger)
Une vie (Alexandre Astruc)
Meu Tio (Jacques Tati)
Um Americano Tranqüilo (Joseph L. Mankiewicz)
Os Amantes (Louis Malle)
Kanal (Andrzej Wajda)
Os Amantes de Montparnasse (Jacques Becker)
Cinzas e Diamantes (Andrej Wajda)
Gigi (Vincent Minnelli)
O Homem do Oeste (Anthony Mann)
Almas Maculadas (Sirk)
Tempo para Amar, Tempo para Morrer (Sirk)
Um Corpo que Cai (Hitchcock)

1959
Hiroshima mon amour (Alain Resnais)
Ivan, o Terrível - Parte II (Sergei Eisenstein)
Pickpocket (Robert Bresson)
Os Incompreendidos (François Truffaut)
Onde Começa o Inferno (Howard Hawks)
Morangos Silvestres (Ingmar Bergman)
A Princesa Yang Kwei Fei (Kenji Mizoguchi)
O Tigre de Bengala (Fritz Lang)
Eu, um Negro (Jean Rouch)
Anatomia de um Crime (Otto Preminger)
De Crápula a Herói (Roberto Rossellini)
Os Eternos Desconhecidos (Mario Monicelli)
A Delícia de um Dilema (Leo McCarey)
O Homem Que Luta Só (Budd Boetticher)
Intriga Internacional (Hitchcock)
O Sol por Testemunha (Rene Clement)
Rio Bravo (Hawks)
O Tigre de Bengala e O Tumulo Indiano (Fritz Lang)
Imitação da vida (Douglas Sirk)
O Homem do Sputnik (Carlos Manga)

sábado, setembro 15, 2007

Plínio Marcos e Adam Sandler


Querô ***

Baseado no romance “Querô – Uma reportagem maldita”, escrito pelo dramaturgo Plínio Marcos na década de 70, o filme marca a estréia de Carlos Cortez na direção de longas-metragens ficcionais. Diretor e roteirista de trabalhos como “Seu Nenê da Vila Matilde” (2001) e “Geraldo Filme” (1998), Cortez construiu uma filmografia documental preocupada com personagens e curvas dramáticas, e estréia na ficção, como ele mesmo diz, “correndo atrás dos fatos”.

Em seu prólogo, “Querô” parece buscar sempre o close. É nessa proximidade que Cortez estabelece os códigos que regem a relação do filme com o seu protagonista. Filmado com duas câmeras 16mm sempre no mesmo eixo (uma mais ágil e próxima da cena em si, e a outra mais preocupada com a narração), a fotografia de Hélcio Alemão Nagamine e a montagem de Paulo Sacramento são feitas de planos-sequências e cortes que prezam pela agilidade e alternam narração e emoção (há também um belo jogo de telas pretas pontuando o filme). “Querô” está em plena sintonia com o cinema brasileiro recente. O filme tem aquela mesma movimentação de câmera, as variações de luz, a montagem ágil... e parece por vezes um tanto over em sua dramaticidade e estilo, como nos flashes de imagens mentais de seu protagonista que surgem como uma espécie de clipes alucinatórios.

“Querô” talvez se aproxime de Plínio Marcos pela sua capacidade de transitar do cru ao delicado com muita sensibilidade. Cortez reserva espaço para delicadezas na trajetória de Querô: ele se apaixona pela sobrinha do pastor (numa das melhores seqüências do longa) e alimenta uma relação fraternal com a dona da pensão em que vive. Essa dualidade que marcava o dramaturgo está ali no olhar ofendido e doce de Maxwell Nacimento – nesta que talvez seja a interpretação masculina mais marcante do cinema brasileiro desde o “Madame Satã” de Lázaro Ramos. E “Quero” ainda fecha sua história com um sorriso enigmático. Bonito mesmo.

Eu os declaro marido e... Larry ***


Oriundo da TV, quando ressuscitou o Saturday Night Live com um humor carinhosamente ofensivo em papeis como o Opera Man e o Canteen Boy, Adam Sandler é também grande sucesso no cinema. E foi Dennis Dugan, o cineasta por trás de “Um maluco no golfe” (1996) e “O paizão” (1999), que parece ter descoberto a fórmula do sucesso: Sandler é uma criança crescida, desrespeitoso em relação aos códigos de comportamento que regem a sociedade. A dupla está de volta e aprimorada em um novo sucesso, “Eu os declaro marido e... Larry”.


O roteiro nasceu de uma combinação curiosa entre Barry Fanaro, escritor e produtor da série “The Golden Girls”, e Alexander Payne e Jim Taylor (“Eleição”, “About Schmidt” e “Sideways. O filme cresce quando os personagens de Sandler e Kevin James (do seriado “King of Queens”) começam a ser investigados e têm de parecer gays. As pessoas têm de reconhecê-los como tal. Ao contrário de desserviços a humanidade como “O cruzeiro das loucas” (2003), “Eu os declaro marido e... Larry” parece reforçar clichês e estereótipos para fotogramas depois rir de quão ridículos e simplistas eles são. Questionado sobre sua homossexualidade, Chuck explica que adorava brincar de luta livre na escola, o cúmulo da homossexualidade para o personagem. E as pessoas que o cercam parecem aceitar isso como uma espécie de evidência.

É claro, “Eu os declaro marido e ... Larry” por vezes exagera, é vulgar e juvenil tanto quanto qualquer outro filme de Sandler, e parece um tanto perdido em seu último quarto. Mas definitivamente o filme não funcionaria sem os estereótipos. Para Sandler, que vem realmente aprimorando seu trabalho, o filme é mais uma chance para se reinventar na comédia e no drama - ele, assim como James, está ótimo no longa. E “Eu os declaro marido e... Larry” ainda conta com seqüências hilárias, além de um time impressionante de coadjuvantes (Dan Aykroyd, Ving Rhames, Steve Buscemi, Rachel Dratch, Nick Swardson, Rob Schneider, e David Spade). Como disse Nathan Lee no “Village Voice”, “Eu os declaro marido e... Larry” grosso e vulgar onde “Brokeback Mountain” é elegante e respeitoso.

sábado, setembro 08, 2007

Retrospectiva do Cachaça

Começou ontem e vai até o dia 12 (quarta) a retrospectiva em comemoração aos cinco anos do Cachaça Cinema Clube - no Odeon, sempre às 20h30. São ao todo seis sessões com alguns dos melhores curtas que passaram pelo Cachaça. Olhem aí a programação:

dia 08/09

Vinicius de Moraes, um Rapaz de Família, de Suzana de Moraes. 30 min. 1982.
Alma no Olho, de Zózimo Bulbul. 12 min. 1976.
Bethânia Bem de Perto, de Julio Bressane. 33 min. 1966.
Documentário, de Rogério Sganzerla. 11 min. 1966.
Tim Maia, de Flávio Tambellini. 15 min. 1987.

dia 09/09

Olho por Olho, de Andrea Tonacci. 20 min. 1966.
Nelson Cavaquinho, de Leon Hirszman. 14 min. 1969.
Mutantes, de Antonio Carlos Fontoura ou Ver Ouvir, de Antônio. 7 min. 1970
Um dia na cidade de São Paulo com Os Mutantes.
Vinil Verde, de Kleber Mendonça Filho. 13 min. 2004.
Senhor Pauer, de Ozualdo Candeias. 15 min. 1889.
Da Janela do Meu Quarto, de Cao Guimarães. 5 min. 2004.

dia 10/09

Filme Pornográfico, de autor desconhecido. 16 min. 1920.
Gostosa, de Alexandre Posk, Márcia Nascimento e Pablo Lacal. 7 min. 1991.
O Latido do Cachorro Altera o Percurso das Nuvens, de Raul Fernando, Camila Márquez, Rebeca Ramos, Estevão Garcia e Pedro Urano. 10 min. 2005.
O Papa do Pulp, de Carlos Adriano. 15 min. 2002.
Maluco e Mágico, de Willam Shoucair. 12 min. 1927.
Diversões solitárias, de Wilson Barros. 12 min. 1983.
Ressurreição, de Arthur Omar. 6 min. 1987.
Nossos Parabéns ao Freitas, de Felipe Marcondes Sant'Angelo. 11 min. 2003.

dia 11/09

Uma Folha que Cai, de Ivo Lopes Araújo. 16 min. 2003.
Por Dentro de uma Gota D'água, de Felipe Bragança e Marina Meliande. 10 min. 2003.
Imprescindíveis, de Carlo Magno. 5 min. 2003.
Felicidade, de Emerson Schmidlin. 7 min. 2004.
Luzia Passou por Aqui, de Letícia Paiva e Paulo Mendel. 13 min. 2005.
Nascente, de Helvécio Marins Jr. 17 min. 2005.
Eletrodoméstica, de Kleber Mendonça. 22 min. 2005.

dia 12/09

A Curva, de Salomão Santana. 5 min. 2007.
Como Enfrentar os Desafios da Vida Moderna, de Leonardo Maestrelli. 9 min. 2006.
Copan: Até Onde seus Olhos Alcançam, de Diogo Faggiano, Eduardo Chatagnier e Lia Kulakauskas. 13 min. 2006.

+ premiados em SP
sessão clássica com degustação de cachaça e música

quinta-feira, setembro 06, 2007

dois brasileiros e um americano


O ultimato Bourne ****

Em “O ultimato Bourne”, terceiro capítulo da série sobre o angustiado ex-agente da CIA Jason Bourne (vivido magistralmente por Matt Damon), Paul Greengrass amplifica o estilo que o fez famoso: a câmera na mão, montagem rápida, e um tom falsamente documental. É como um 007 em cinema direto americano. Se bem que, Greengrass foge do heroísmo e parece unicamente interessado em filmar o movimento e o deslocamento de corpos, reforçando a cada fotograma a ilusão de que tudo está se passando neste exato momento.

Embora este talvez seja o mais político da série, “O ultimato” não parece ter as preocupações de denúncia política de filmes anteriores do cineasta inglês. Aparentemente livre de qualquer ideal de objetividade – o crítico Nathan Lee costuma dizer com uma certa razão que “Vôo 93” e “Paixão de Cristo” são o mesmo tipo de filme para platéias diferentes -, Greengrass fez de seu mais novo filme um exercício acachapante de ação.

O cineasta sabe como poucos agarrar o espectador. A seqüência da estação londrina de Waterloo é impressionante. Greengrass trabalha embalado por um fluxo interminável de imagens/informações, numa fotografia que parece dividir os quadros/espaços como se em cortes e movimentos bruscos e trepidantes. Por vezes, isso nos custa a visão da cena, mas Christopher Rouse redefine a idéia de "montagem rápida" em cinema de entretenimento, e garante que entendamos exatamente o que se passa.


Saneamento básico ***

Dos curtas a "Meu tio matou um cara" (2005), o cinema de Jorge Furtado dorme com a literatura e com o cinema clássico e se alimenta de uma enorme preocupação em relação ao contato com o público. Num universo regido por imprevistos, seus personagens mais parecem prisioneiros das circunstâncias, sempre à espera do grande acontecimento de suas vidas. Extremamente habilidoso na articulação entre forma e conteúdo, o cineasta vem de um leve escorregão, mas se levanta em “Saneamento básico”, seu quarto longa. Diferente de seus três longas anteriores, os personagens de “Saneamento” não se mexem por paixão. Cada um deles se move por um objetivo particular e tem por trás de si um arquétipo específico. Na verdade, dessa vez, pela primeira vez, a comédia não tem conotações românticas. “Saneamento” tampouco se ancora numa narração em off. E até aquela displicência no uso de câmera parece melhor diluída.

Em linhas diversas, o cineasta mais uma vez cria um conjunto com unidade multifacetada. Mais uma vez, a verdade dos fatos não está nos fatos, mas nos pontos de vistas de quem os enxerga. E a história é o que se vê acontecer na tela - de certa maneira, “Saneamento” talvez se aproxime de “Houve uma vez dois verões” (2002) em seu referencial no cinema clássico, trabalhando com um enorme frescor os personagens que cria. E é nesse jogo narrativo que Furtado está interessado. Para o filme, pouco importa que pareça estranho a personagem de Fernanda Torres não saber o que significa ficção. Aliás, neste sentido, talvez o que mais me incomode seja a versão distorcida que Furtado nos mostra da região gaúcha de colonização italiana – recomendo a leitura do texto de Fernando Mascarello na Cinequanon.

Em “Saneamento”, comédia rima com política. O dinheiro é mais uma vez um elemento preponderante. Os personagens discutem o preço das coisas a todo momento, traduzindo os custos para uma “moeda” mais próxima a eles. Assim, ficamos sabendo que a quantia gasta na montagem daria para comprar muitos, muitos tijolos. E assim, as contradições relativas à produção cinematográfica em um país como o Brasil tornam-se subtexto para lá de explícito. Na hora H, os personagem tem de decidir entre comprar os direitos de uma música de Billie Holiday ou manter a possibilidade da construção da fosse. Eles acabam optando pela música. E Furtado está claramente com eles.


Cidade dos homens **

“Cidade dos homens” começa com muitas promessas. A bela trilha de Antônio Pinto (“Cidade de Deus”) casa com pequenos flashes de antigas passagens da série. Num tom quase épico, Paulo Morelli tenta aqui uma ligação emocional com o espectador. Vemos Acerola/Douglas e Laranjinha/Darlan mais jovens, personagens e atores marcados pelo tempo do filme e pelo tempo real. Cria-se um bonito elo entre a “vida real” e a realidade dentro do cinema. Outro ponto positivo é o exercício de economia narrativa realizado no roteiro de Morelli e Elena Soarez. Acerola e Laranjinha estão cercados de muitos personagens, mas conseguimos chegar perto de cada um deles. A fotografia de Adriano Goldman (“O ano em que meus pais saíram de férias”) segue o padrão estético delimitado por César Charlone em “Cidade de Deus”, com uma câmera fortemente influenciada pela publicidade, indo sempre ao encontro dos corpos, banhados numa luz dourada.

No entanto, os flashes que tão bem abrem “Cidade dos homens, o filme” são usados à exaustão por toda a duração do longa e o efeito comovente conseguido inicialmente se perde por completo. O curioso é que o filme tem alguns dos problemas (de decupagem, de mise-en-scène) que marcaram as outras duas investidas de Morelli pelo longa-metragem, o filme de época "O preço da paz" (2003) e a comédia "Viva voz" (2003). Em seqüências como aquela em que Acerola e Laranjinha se separam pela primeira vez, cada um indo para um lado do quadro, a mise-en-scène de Morelli se mostra um tanto óbvia. O cineasta também peca vez por outra com uma linguagem cinematográfica que se pretende moderna e inteligente, escorregando na busca sem freios da emoção, em algumas gags bem rasteiras, e em alguns tiques hiper-explorados, como a câmera na mão, os focos e desfocos, e os arredores super-fotogênicos.

Talvez o que mais preocupe seja o fato de se assistir ao filme como um grande dejá-vu. Quatro anos separam a estréia de "Cidade dos homens" na TV do lançamento do filme nos cinemas. De lá para cá, pode-se notar que a presença da imagem popular na televisão brasileira ressurgiu como uma enorme novidade. Em outras palavras, a cultura da pobreza e das favelas no Brasil ganha hoje visibilidade como uma fonte de significado e identidade. A série “Cidade dos homens”, tanto em seu conteúdo quanto em sua forma, foi delicadamente deglutida: aquele apetite pelo real, os traços de jovialidade da dupla de protagonistas, a fricção entre elementos cômicos e dramáticos, e a estilização da imagem a partir das atuais convenções da câmera na mão, da instabilidade na captação, dos cortes abruptos...