terça-feira, junho 29, 2010

guerra dos mundos ****


Vi “Guerra dos mundos” (2005) pela primeira vez em Istambul. Gosto de ir ao cinema quando viajo. Em Istambul, por exemplo, para minha surpresa, todo filme tem seu intervalo. As pessoas conversam sobre o longa, usam o celular, vão ao banheiro, compram pipoca... Na saída, distraído, entre a Europa e a Ásia, acabei sendo roubado. Não teve muito jeito. “Guerra dos mundos” foi pro saco. Só de pensar... Pois no início desse ano, não é que o filme de Steven Spielberg ficou entre os dez da década no ranking da “Cahiers du Cinéma”. Não só isso. Nesta edição da revista, o coreano Bong Joon-ho (“The host”) e o japonês Kiyoshi Kurosawa (“Cure”), dois dos cineastas que mais gosto hoje, conversam brevemente sobre o longa e o segundo assina um pequeno texto sobre o realizador americano. Estava mesmo na hora de voltar a “Guerra dos mundos”.

Spielberg sempre investe em ritos de passagem. E “Guerra dos mundos” esbanja uma incrível força de síntese. Bastam duas seqüências: o protagonista nos é apresentado, um perfil é esboçado, a curva do personagem nos é sugerida. Pronto. Ou talvez não. Pois Ray (Tom Cruise) é muito mais que um protagonista. Ele é a própria condição de possibilidade, uma espécie de pré-requisito. Sem ele, não vemos, não há nada. Não há explicações para a invasão. Onde estão os chefes de estado? O próprio desaparecimento do filho do personagem parece esclarecer essa tomada de posição. Uma posição reforçada a todo o momento, a cada plano. A narrativa estará colocada ao protagonista para todo o filme. E Ray é diferente. Não é um personagem típico de Spielberg. Ele é excessivo, recheado de defeitos. Um sujeito bom, mas que parece sempre fazer errado. Spielberg me surpreende. “Guerra dos mundos” é barra pesada. Um drama bem duro sobre a paternidade. Um suspense assustador. É bem verdade que o final é decepcionante, embora esperado, mas “Guerra dos mundos” desfila tenso, camada por camada, em uma atmosfera de crescente desespero.

segunda-feira, junho 28, 2010

três

- Muito bom o caderno "Prosa e Vero" ("O Globo") deste último sábado: ótima entrevista com Terry Eagleton, boas resenhas sobre livros de Haroldo de Campos e Walter Benjamin e o belíssimo artigo de Felipe Bragança sobre Cannes, fantasmas e cinema comtemporâneo. Tentei encontrar o caderno no site para colar o link aqui, mas não consegui...

- Transmissão do jogo Argentina e México no Sportv. Narração do ótimo Milton Leite e comentários de Maurício Noriega.
ML: E o Messi ainda não fez gol nessa Copa.
MN: Pois é. Será que tá guardado?
ML: Não, acho que não. O Guardado* já saiu faz tempo.

* jogador do méxico

- Parece-me que o episódio Dunga/Escobar andou confundindo a coisa. O problema do Dunga não é somente com a Globo... Mas, enfim, mesmo o Escobar sendo funcionário da Globo, isso aí abaixo é um tanto bizarro:

quarta-feira, junho 23, 2010

trailers

Ontem, vi "Kick Ass". Não tenho o que dizer sobre o filme. Na verdade, o que mais gostei foram mesmo os trailers: "Os mercenários", projeto de Sylvester Stallone, com um elenco estratosférico, filme sujo, burro, despretensioso... do caralho; e o enigmático "O último mestre do ar", o novo M. Night Shyamalan, que, dessa vez, parece-me que resolveu ir para o tudo ou nada. Vejam abaixo:




segunda-feira, junho 21, 2010

tren de sombras

Sexta, vi "Tren de sombras" (1997), de José Luís Guerin. Não faz, definitivamente, o meu gênero, embora seja um belo filme. Errante quase ao arbitrário. Melancólico bem ao estilo espanhol. Um filme corajoso. Guerin toma liberdade para se perguntar: O que revelam imagens em movimento? O que pode o cinema?

sexta-feira, junho 18, 2010

quincas berro d'água **


A Cidade Baixa de Salvador é mais uma vez um componente de extrema importância. Um espaço que impregna os seres que o habitam de forma pegajosa. Há uma espécie promíscua de energia pairando pelos cenários. É lá que os personagens compartilham suas experiências.Vez ou outra, um olhar e ou um close de “Quincas” evocam seu antecessor e o talento do cineasta para nos instalar sensorialmente no clima sugerido. Enquanto o seu penúltimo filme operava numa fruição narrativa em que importava menos o que acontecia do que como acontecia, “Quincas” se afirma no desenrolar lúdico das aventuras de seus personagens. Há mais uma vez uma atenção cuidadosa aos movimentos corporais, aos traços descritos pelos gestos. Desta vez, no entanto, esses elementos não marcam a condução de uma narrativa de sentimentos, mas buscam, em especial quando os quatro mosqueteiros de Quincas (Flávio Bauraqui, Irandhir Santos, Luis Miranda e Frank Menezes) estão em cena, uma comédia física. O universo de Jorge Amado está lá, nas texturas, nos cenários, nos cheiros, nos ritmos, nas cores, nos corpos suados. Mas todos estes elementos são trabalhados em um tom fantástico, porém sutil, sem exageros. Ao contrário de “Cidade Baixa”, que operava em uma espécie de realismo expressivo, “Quincas” parece exacerbar a realidade e assumir por vezes o jeitão de uma farsa. Talvez seja mais complicado do que isso. “Quincas” é um filme enamorado pelo fantástico, embora cheio de verdade; um longa que beira por vez o surreal, mas se afirma realista na encenação – uma mescla que faz lembrar o cinema de Kusturica e algumas comédias italianas de Mario e Dino Risi. Vejamos as atuações. Os atores são os grandes propulsores de “Quincas”. E Sérgio demonstra mais uma vez um enorme apreço por seus personagens, abraçando todas as suas falhas de caráter e enganos. Como em “Cidade Baixa”, o cineasta se interessa profundamente pela falibilidade do ser humano. O que nos impressiona, no entanto, é que, no caso deste longa, falar sobre a qualidade da interpretação dos personagem não é defender um realismo-naturalista. Muito pelo contrário. As atuações de “Quincas” parecem irmanadas com as atuações de seus personagens em cena. A carnavalização como uma maneira de ver o mundo pelo avesso, como manifestação de desvios e inversão de costumes. A sensação é curiosa: estamos no terreno dos adereços, das fantasias, da farra e do insólito, embora “Quincas” pareça por vezes reivindicar fidelidade em relação aos comportamentos humanos, um compromisso com o retrato de um espaço ou de uma comunidade. Em alguns momentos, “Quincas” é delirante na sua energia, como se o filme entrasse em transe e sublimasse seus temas. Esta energia que emana dos quatro súditos de Quincas e de Manuela não se mantém por muito tempo. Neste sentido, este é um filme de alguns hiatos. Mas mais do que isso. “Quincas” é um filme extremamente “pensado”. Um longa que, ao se desenrolar, pensa a sua própria caminhada. Uma carnavalização controlada.

artigo

Resumo de um texto meu pulicado na Revista Fronteiras:

segunda-feira, junho 14, 2010

josé luis guerín

Começou hoje uma pequena mostra de filmes do espanhol José Luis Guerín, lá no Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ. Entrada Franca. Sempre às 19 h. Os filmes são apresentados em DVD, com legendas em espanhol.

16 de junho -4ª. Feira

Una fotos en La ciudad de Sylvia (2007)

17 de junho - 5ª. Feira

En La ciudad de Sylvia (2007)

18 de junho - 6ª. Feira

Tren de sombras (1997)

quinta-feira, junho 10, 2010

cineclube cinética

Hoje tem Cineclube Cinética lá no Instituto Moreira Salles. Serão exibidos "Crônica da Inocência" (2000), de Raoul Ruiz, às 17h15, e "Morte em Veneza" (1971), de Luchino Visconti, às 19h. Clicando nos filmes, vocês têm acesso os textos referentes a eles.


maurice pialat

Você disse que em “La Gueule ouverte” teria ficado perto demais de Bresson, acrescentando um "infelizmente". O que você quis dizer com isso?

Pialat: Eu estava pensando em sua forma, que no final é bastante elaborada. É um filme um pouco frio, cujas qualidades dependem por um certo tempo de sua estética. Para mim, como regra geral, o texto e as atuações têm de assumir a primeira posição. Estou feliz que a qualidade da fotografia seja satisfatória, mas não é isso que eu estou procurando acima de tudo. Há sempre muito esteticismo. O que eu gostaria de fazer algum dia é um filme onde nós filmaríamos da forma mais natural possível, colado o mais perto possível da realidade. O meu ideal é um plano-sequência em que um ponto de vista é expresso em cima de uma coisa que está sendo produzida naquele exato instante. Assim que você começa a cortar, a fragmentar aquele instante, ou voltar a ele por um outro ângulo, a verdade acaba escapando, já que você está tentando re-produzir aquilo que, por definição, só se produz apenas uma vez. O que não quer dizer que eu queria deixar os cabos entrarem em quadro, mas não havia nenhum pensamento particular impregnando aqueles enquadramentos. Se eu gosto de trabalhar com Almendros (diretor de fotografia) é porque ele foi mais longe do que qualquer outro câmera na preparação da iluminação natural. Há ainda um número considerável de problemas no que concerne as cores, vamos ter de esperar muitos anos antes de chegar a algo satisfatório, antes de acabar completamente com a iluminação, um artifício que me incomoda.

Vestir uma locação é, naturalmente, uma necessidade. Você sempre tem que fazê-lo no último minuto. Se eu fosse filmar nesta sala, eu começaria movendo esta mesa. Eu ia arranjar estas cadeiras de uma maneira diferente, e, pouco a pouco, chegaria a um tableau, a um artifício ...

quinta-feira, junho 03, 2010

bresson

Bresson, em uma entrevista a Michel Ciment para a revista “Positif”, em 1983:

Você tem que seguir a sua sensibilidade. Não há mais nada. Eu fui chamado de intelectual, mas é claro que não o sou. Escrever é incrivelmente difícil, mas tenho de fazê-lo, porque tudo deve ser vir de mim. Eu fui chamado de jansenista, o que é uma loucura. Eu sou o oposto. Estou interessado em minhas impressões. Vou dar um exemplo, tirado de ‘L'Argent’. Quando eu estou nos Grand Boulevards, a primeira coisa que eu penso é ‘Como eu os percebo? E a resposta é que percebo os Boulevards como uma massa de pernas e som dos pés no pavimento. Eu tentei comunicar essa impressão através da imagem e do som ... Deve sempre haver um choque ao se fazer isso, um sentimento de que os seres humanos e as coisas que estão sendo filmados são novos, você tem que jogar surpresas no filme. Foi o que aconteceu na cena dos Grands Boulevards ... Eu posso sentir as etapas, concentrei-me nas pernas do protagonista, e assim pude encaminhá-lo através da multidão até aonde ele precisava ir. Esses são os Grand Boulevards, pelo menos no que me concerne, todo o movimento. Caso contrário, eu poderia muito bem ter usado um cartão-postal. O que me surpreendia quando eu costumava ir ao cinema era que tudo tinha sido programado antecipadamente, até o último detalhe ... Pintores não sabem de antemão como terminaram uma pintura, um escultor não pode dizer como sua escultura será, um poeta não planeja um poema com antecedência ...

Você deve ter notado que, em "L'Argent", há uma série de close-ups cuja única função é a de adicionar sensação. Quando o pai, um pianista, deixa um vidro cair no chão, sua filha está na cozinha. A pá de lixo as esponjas dela estão prontas para serem usadas. Eu não entro no quarto, mas corto imediatamente para um close de que eu gosto muito, o piso molhado ao som da esponja. Isso é música, ritmo, sensação ... Cada vez mais, o que procuro - e em "L'Argent" isso se tornou um método de trabalho - é comunicar a maneira que eu sinto as coisas.