"Desejo e obsessão" é sensacional. É um filme que apela discretamente para as convenções do cinema de gênero, mas sem nunca se permitir ser reivindicado por ele. "Desejo e obsessão" poderia ser descrito como um filme de terror ou como uma ficção científica que não age como tal ou jamais sai do armário. O cinema de gênero é como que contrabandeado, infiltra-se na história como uma doença ao mesmo tempo familiar e estranha. Denis demonstra uma capacidade incrível de revisitar narrativas aparentemente esgotadas para reinvesti-las em toda a sua estranheza. A narrativa (ou melhor, os códigos e signos associados a determinados gêneros cinematográficos) funciona como uma forma de negociar a entrada do espectador no filme, é uma espécie de terreno comum (compartilhado pelo filme e pelos espectadores) e que facilita o diálogo.
Denis desfila mais uma vez suas fixações pelo corpo masculino, pelo sêmen, pela pele, pela doença... É um cinema sobre os corpos, seus limites e desejos, sempre em um equilíbrio incrível entre a sua materialidade, sua espessura impenetrável, e o seu sentido ou significado. O que existe são sensações e a consciência destas sensações. Denis faz da sensação a condição de força primordial da realidade. Isso sem falar em momentos de plasticidade incrível. Agnes Godard, a fotógrafa, faz do corpo uma paisagem inexplorada. E a câmera parece filmar pelo toque.
"Desejo e obsessão" é um filme sobre a carne. A "carne" tal como Merleau-Ponty a definia: um conceito (de caráter propriamente ontológico) que expressa a unidade primordial entre corpo e mundo. A carne é "a indivisão entre este ser sensível que eu sou e todo o resto que é sentido em mim". A carne é a espessura entre o que é visto e quem vê. Essa é a substância do cinema de Denis.
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