Anos 70. Austrália. Um antropólogo e um guia aborígene viajam em pesquisas sobre a pintura rupestre, ainda prática corrente entre os nativos australianos. Eles adentram uma caverna. Avistam um desenho gasto de um animal. O guia se entristece, chora, e, pouco depois, começa a retocar o desenho. O antropólogo, intrigado, faz a pergunta que qualquer ocidental faria: “Porque você pinta?”. “Mas não é minha mão que pinta”, responde o aborígene, estupefato: “É a mão do espírito”.
A princípio, pode parecer estranho começar esta conclusão com a pequena história que o arqueólogo francês Julien Monney conta ao cineasta Werner Herzog em “Caverna dos sonhos esquecidos” (2010), filme sobre os mistérios da caverna Chauvet, no sul da França, onde estão, em perfeito estado, os desenhos rupestres mais antigos de que se tem noticia. Se relevarmos, contudo, a carga místico-religiosa da resposta do aborígene, um olhar diverso sobre a arte em sua origem se abre no horizonte: a arte como uma doação, a dar vida material a algo imaterial, a tornar presente algo ausente; a arte como um sair de si sem jamais estar fora de si, como um fluxo e refluxo entre a obra, o artista, e, posteriormente, o espectador.
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