terça-feira, fevereiro 16, 2010
deixe ela entrar
Eli mal consegue administrar suas necessidades vitais. Ela não quer expandir sua raça e sempre mata suas vítimas. Obrigada a viver para sempre, a personagem se afirma em um desejo/dilema aparentemente insolúvel: encontrar alguém para amar e, ao mesmo tempo, condená-lo a uma vida subserviente e criminosa. Oskar vive em uma sociedade que não o respeita. E ele parece assumir total responsabilidade por isso. Um movimento interessante. Oskar não quer saner de seus professores, de seus pais, e não cultiva nenhuma amizade.
O encontro desperta nos personagens sentimentos sem nome. Algo sempre nos escapa. Oskar e Eli recusam qualquer forma de subordinação ou de funcionalidade. O que os une é um desejo sem nome. Não é amor, paixão, compaixão, ou amizade. A relação aqui é de outra ordem, ainda a ser classificada. A direção de Tomas Alfredson é delicada, porém radical em sua entrega sem cautelas à compreensão dos corpos e desejos de seus personagens. Eli decepa os garotos que maltratavam Oskar. O cineasta filma tudo com uma certa alegria, e nos convida a partilha-la com ele. Alfredson recupera um certo apelo à coragem de pensar de uma forma ainda não-pensada ou de sentir de maneira diferente. Essa é a política de “Deixa ela entrar”. Uma política da imaginação que aponta para a criação de novas imagens e metáforas para o pensamento, a política e os sentimentos e que renuncie a prescrever uma imagem dominante.
“Deixe ela Entrar” é uma estranha espécie de afirmação das diferenças e dos diferentes. Oskar será o novo provedor de sangue para a menina? Ele será um vampiro e com ela viverão felizes? É um final cheio de esperança, estranhamente otimista. Ta aí um filme disposto a devolver ao mundo uma certa complexidade.
zona livre
- Nowhere, de Gregg Araki
- Sangre, de Amat Escalante
- Trash Humpers, de Harmony Korine (video)
- Gozu, de Takeshi Miike
- Hunger, de Steve McQueen (em 35mm)
- Moonlighting, de Jerzy Skolimowski
quarta-feira, fevereiro 10, 2010
young
“Neil Young - Heart of Gold” não é apenas um show filmado. É como um testamento. As músicas se conjugam sempre na primeira pessoa do singular. Odes panteístas à família, à amizade. "I want to live/I want to give", confessa Young em seus primeiros versos. Gravado em um momento de luto - Young estava com um aneurisma e seu pai havia morrido poucos meses antes do diagnóstico - o show alterna canções mais recentes e o material mais antigo em uma espécie de panorâmica da vida do cantor e campositor. "Quando comecei a tocar”, diz ele, “eu criava galinhas. Eu devia ter uns sete, oito anos. Talvez um pouco mais. E ganhei um ukelele de plástico de meu pai. E eu não sabia o que fazer com ele. Meu pai disse: ‘Talvez você precise disso’. E cantou uma canção para mim que eu nunca tinha ouvido antes. Ele ficou me olhando, com um sorriso engraçado no rosto. Fiquei olhando para ele. E então tive que ir cuidar das galinhas". Uma celebração. Uma celebração doída, é verdade. Jonathan Demme intui um tom. Poucos movimentos. Poucas angulações. A câmera acompanha com delicadeza. O filme se faz em um íntimo imbricamento com a música e nos convida a um outro tipo de fruição. Young no palco é como uma força da natureza. Solta no espaço. Tudo que ele toca se torna seu, seu e de mais ninguém. Isso tem nome. Verdade!
segunda-feira, fevereiro 08, 2010
os celulares de ferrara
Outro dia revi “Mary”, de Abel Ferrara. Quantos celulares! Eu não os tinha visto antes. Voltei ao filme novamente. É curioso. Os personagens não trocam e-mails. Não postam cartas. Só celulares. É através deles que os personagens se cruzam, que os continentes se aproximam, que os dramas se desencadeiam. A opção me parece deliberada (embora isso pouco importe). E dessa vez, eu vi o celular. O celular e a experiência contemporânea. A minha experiência. Ferrara! Cinema!
sexta-feira, fevereiro 05, 2010
guerra ao terror e ao francis
- Por falar em “Guerra ao terror”, suas nove indicações ao Oscar são mais uma evidência do faro deslocado dos nossos distribuidores. Segundo eles, o filme não valia um centavo. Foi direto para o DVD. Agora, por causa do Oscar, “Guerra ao terror” faz o caminho inverso e chega enfim aos cinemas. Os cadernos de cultura falam da cineasta Kathryn Bigelow como uma grande surpresa, não esquecem do fato dela ser ex-mulher de James Cameron (“Avatar”, que concorre também em nove categorias), mas, com a exceção de uma breve cutucada do Inácio Araújo na “Folha”, nada foi dito sobre o que fizeram com o filme dela por aqui.
- Vi “Caro Francis”, de Nelson Hoineff. Não gostei. Não esperava muito, é verdade. Acho “Alô, Alô Terezinha” uma ofensa. Aliás, ambos os filmes são forjados em estratégias similares. Hoineff se esforça para que suas opções produzam efeitos à imagem e à semelhança de seus personagens. “Alô, Alô Terezinha” cobrava um preço por todo esse empenho. Era preciso, no mínimo, uma auto-sabotagem. Sem ela, o filme se torna um espaço de humilhação pública. “Caro Francis” é ainda mais frágil. A idéia de contradição, associada ao personagem, “justifica” algumas estratégias vazias, como a montagem de Caio Túlio e Diogo Mainardi. Preguiça. Esse o termo que vem à mente. Preguiça editorial, preguiça cinematográfica. No mais, como bem disse o Sérgio Alpendre, o filme leva uma surra do You Tube.
terça-feira, fevereiro 02, 2010
recomeçar...
Estou de volta. Aos poucos.
Primeiro: os links. Dei um jeito neles. Alguns já estavam inativos há algum tempo. Outros mudaram de endereço.
Entre eles, o Los Olvidados, o Fabito’s Way, o Ricardo Calil, Francis Vogner e o Víscera.
Acrescentei outros links. O Olhos Livre Bônus, o Cine Monstro, de Carlos Primati, o Paragrafilme, do Eduardo Valente, e o blog de Steven Shapiro. Falarei mais desse teórico americano mais pra frente.
Por enquanto, é só. Mas já já vem mais por aí.