quinta-feira, junho 27, 2013

andre de toth

Descobrir um cineasta é sempre algo instigante. Aconteceu comigo semana passada, quando vi pela primeira vez três filmes do húngaro radicado nos EUA Andre De Toth: “Ramrod” (1947), “Pitfall” (1948) e “Man in the Saddle” (1951). De Toth é um cineasta de estilo e visão de mundo escorregadios - especialmente no que concerne ao cinema hollywoodiano clássico. Dirigiu muitos noirs e westerns, absolutamente diferentes. Na verdade, me parece que De Toth não faz muita diferença entre os gêneros. O que se privilegia é uma certa noção de precisão dramática, uma atenção incomum (a estes gêneros) a detalhes e gestos dos personagens, e uma preocupação primordial com a constituição de uma atmosfera.


O cinema de De Toth me parece obsecado por complexos efeitos causados pela violência, por uma certa noção de traição, não apenas doméstica, embora ela também esteja presente, mas de valores - apesar de terem muito em comum, De Toth alimenta um tom predominantemente humanista que contrasta com a frieza de um Fritz Lang. Esse algo tortuoso, tenso, quase palpável, que marca o mundo cinematográfico de De Toth, se conjuga com uma certa lentidão ou leveza, com uma espécie de mudez que define na maioria das vezes os protagonistas de seus filmes. Essa equação me espanta.

Os filmes desfilam uma continuidade inquebrantável, recheada de detalhes inventivos, de transições curiosas entre os planos. Em “Ramrod”, por exemplo, quando Connie convence Bill a espantar seu próprio gado, seu braço erguido conecta-se em fade com o gado correndo a esmo pelo campo. Um momento passional e traiçoeiro se dissolve em violência crua. Este filme em particular é marcado por outras transições mais sutis, recheadas por movimentos de câmera a unir o dentro e o fora, o externo e o interno, como se tudo fizesse parte de uma mesma unidade, decaída.

Martin Scorsese gosta de chamar De Toth de "contrabandista", um diretor que importou ideias incomuns ao âmbito do cinema clássico de Hollywood. Ele tem toda razão. “Pitfall”, por exemplo, é um noir extremamente original sobre, pasmem, os efeitos provocados pela vida em família, na família americana dos anos 50. O filme faz uso de tipos convencionais (a femme fatale, o vilão grande e bruto, a mulher inocente e ofendida e o anti-herói), embora com o passar dos minutos eles se transformem em formas mais complexas, menos identificáveis. De Toth dá espaço a cada um de seus personagens, que, ao longo do filme, tentam explicar e justificar seus medos, desejos e ações. E será de uma equação entre estas justificativas, medos, desejos e ações que “Pitfall” alcançará seu desfecho. Desfechos ambíguos, sempre. Não exatamente felizes. Não exatamente tristes. Seja em “Pitfall”, “Ramrod” ou “Man in the Saddle”.    

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