“Inquietos”
anda passando na HBO. Acabei revendo algumas partes. A princípio, o filme
estaria mais para “Gênio Indomável” do que para “Elefante” (2003). Mas é
preciso cuidado. O jovem como mito nunca esteve muito longe do cinema de Van
Sant. Em “Inquietos”, ele se aproxima mais uma vez deste universo com muito
carinho e uma certa dose de fetichismo. Como ocorre em muitos de seus filmes, o
figurino patenteia os personagens (Annabel é uma curiosa citação-homenagem a
Jean Seberg e à Nouvelle vague), sempre em relação dissonante com as regras que
a sociedade nos impõe. “Inquietos” é uma espécie de balada cinematográfica. Van
Sant caminha entre o romance teen e o filme de doença terminal, gêneros com os
quais já possui uma certa afinidade, aposta em um ambiente encantador e cria
pequenos momentos de excentricidade mágica.
Se
em “Encontrando Forrester” e “Gênio indomável” havia um enredo de
auto-superação sob a orientação de um adulto, e em “Elefante”, entrava em cena
uma espécie de rito de passagem, mas uma passagem de energias, corpos e nuvens,
“Inquietos” fica no meio do caminho. O que une os trabalhos mais radicais de
Van Sant (de “Gerry” a “Paranoid Park”) é uma mise-en-scène imersiva que se
abre para um fluxo sensório temporal e que se sobrepõem à narrativa. São filmes
que caminham entre o absolutamente abstrato e um fiapo de história.
“Inquietos”, ao contrário, parece muitas vezes se ressentir da necessidade de
contar uma história. Os personagens ganham psicologia e suas motivações nos são
reveladas, camada por camada, em cenas por demais funcionais (como quando descobrimos
o que aconteceu com os pais de Enoch).
Ainda
assim, Van Sant parece por vezes querer expressar seus personagens por meio da
estilização e do desenho de som, nos oferece momentos dilatados e absolutamente
abertos e engajados, procurando passar um sentimento de angústia, descoberta e
desespero, através de uma linguagem que beira o poético, sem muito preciosismo.
Talvez a grande chave deste filme, como bem sublinhou Eduardo Valente lá na
Cinética, seja mesmo Hiroshi, o fantasma camarada de Enoch. Van Sant dá a este
personagem um tempo e uma importância que por vezes beira o ridículo, enquanto
noutras confere uma força, um desejo comovente de se aproximar e compreender o
universo retratado.
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