“Luzes na escuridão” marca o fim da trilogia urbana de Aki Kaurismäki composta ainda por “Drifting Clouds” (1996) e “O homem sem passado” (2002). Koistinen (Janne Hyytiäinen) é um homem solitário, que trabalha como guarda-noturno em um shopping center de Helsinki. Tem pouquíssimos amigos, e, mesmo com eles, trava uma relação desconfiada. Certo dia, Koistinen conhece Aila (Maria Heiskanen), por quem se apaixona. Mas uma quadrilha de gangsters se aproveita de sua paixão por ela e de sua posição como vigilante para tramar um assalto a uma joalheria do shopping, incriminando o protagonista. A preocupação maior de Kaurismäki é a inadequação de seus personagens a uma sociedade que não os aceita ou suporta, e em “Luzes na escuridão” temos um homem que precisa construir para si um mundo diferente daquele que é dado como padrão na sociedade. Se nos dois primeiros longas da série lidamos com problemas materiais e de ordem econômica (o desemprego e a falta de moradia, respectivamente), em “Luzes na escuridão” estamos no terreno da solidão. Talvez por isso, apesar de não ser o melhor longa da trilogia (prefiro o “O homem sem passado”), o filme seja o mais radical e desesperador dos três.
O longa começa na chave do cinema noir hollywoodiano (na "CinemaScope", Steve Gravestock o definiu como uma versão finlandesa de “Detour”, clássico noir de Edgar C. Ulmer), mas não se detém exclusivamente nos desdobramentos da narrativa, e alimenta as usuais influências de Kaurismäki, em especial o cinema mudo de Charles Chaplin (capaz de fundir ironia, tristeza e divertimento numa mesma cena) e a mise-en-scène de Robert Bresson (autor de uma encenação magra e seca, porém de um virtuosismo quase imperceptível). Kaurismäki reduz/refina cada quadro ao mínimo necessário, fundindo personagem, situação e trama no mesmo take. Trata-se de um exercício em economia de tudo, dos diálogos esparsos às expressões dos personagens. O cineasta tem um estilo todo próprio e intoxicante, feito de longos planos médios que nos deixam a impressão dos personagens estarem presos, vagando por uma espécie de imenso nevoeiro. Na verdade, Koistinem talvez nem seja exatamente um personagem, alguém que possamos chamar de "sujeito". Ele anda para lá e para cá, janta em casa, come no trailer, lava pratos... lhe falta significados. Koistinen é simplesmente uma presença, um dado a mais.
Ter esperança e ou fé não é fácil, nos diz o cineasta. Mas apesar disso, contra todas as probabilidades, é absolutamente fundamental acreditar na redenção e ou na existência do afeto (afeto que o próprio filme designa aos personagens, num olhar extremamente generoso). E é exatamente por se recusar a se submeter à realidade que torna Koistinem um herói – pelo menos no universo de Kaurismäki. Neste sentido, a última seqüência do filme é memorável. Em miúdos, “Luzes na escuridão” traduz de uma só vez uma visão de cinema e uma visão de mundo.
O longa começa na chave do cinema noir hollywoodiano (na "CinemaScope", Steve Gravestock o definiu como uma versão finlandesa de “Detour”, clássico noir de Edgar C. Ulmer), mas não se detém exclusivamente nos desdobramentos da narrativa, e alimenta as usuais influências de Kaurismäki, em especial o cinema mudo de Charles Chaplin (capaz de fundir ironia, tristeza e divertimento numa mesma cena) e a mise-en-scène de Robert Bresson (autor de uma encenação magra e seca, porém de um virtuosismo quase imperceptível). Kaurismäki reduz/refina cada quadro ao mínimo necessário, fundindo personagem, situação e trama no mesmo take. Trata-se de um exercício em economia de tudo, dos diálogos esparsos às expressões dos personagens. O cineasta tem um estilo todo próprio e intoxicante, feito de longos planos médios que nos deixam a impressão dos personagens estarem presos, vagando por uma espécie de imenso nevoeiro. Na verdade, Koistinem talvez nem seja exatamente um personagem, alguém que possamos chamar de "sujeito". Ele anda para lá e para cá, janta em casa, come no trailer, lava pratos... lhe falta significados. Koistinen é simplesmente uma presença, um dado a mais.
Ter esperança e ou fé não é fácil, nos diz o cineasta. Mas apesar disso, contra todas as probabilidades, é absolutamente fundamental acreditar na redenção e ou na existência do afeto (afeto que o próprio filme designa aos personagens, num olhar extremamente generoso). E é exatamente por se recusar a se submeter à realidade que torna Koistinem um herói – pelo menos no universo de Kaurismäki. Neste sentido, a última seqüência do filme é memorável. Em miúdos, “Luzes na escuridão” traduz de uma só vez uma visão de cinema e uma visão de mundo.
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