quinta-feira, setembro 28, 2006

A última noite ***


Em “A ultima noite”, o mais novo filme de Robert Altman, temos o registro do último show de um programa de variedades de rádio chamado “A Prairie Home Companion” – este programa realmente existiu, e o filme é escrito e protagonizado pelo apresentador do finado show, Garrison Keillor. O programa é sucesso há mais de 30 anos, mesclando apresentações ao vivo de bandas e cantores, comerciais e anedotas. O prédio da emissora foi vendido e o novo dono quer derrubá-lo para fazer um estacionamento.

O show se passa no palco, mas é nos bastidores onde tudo acontece. A câmera de Edward Lachman adentra o backstage, sublinhado os espaços e tornando-nos cúmplices das privacidades que ela nos (gentilmente) oferece. Vários núcleos dramáticos se entrecruzam (bem no estilo de Altman). E o cineasta parece negociar nossa atenção entre três conversas paralelas, passeando elegantemente pelos rostos satisfeitos dos atores/cantores – aliás, os atores, todos em ótimas interpretações, parecem estar se divertindo horrores. Nas performances, geralmente duetos, a música parece atar as relações entre os personagens. Rhonda (Lily Tomlin) e Yolanda (Meryl Streep) cantam em homenagem a mãe, Yolanda e G.K. revisitam a relação amorosa, enquanto Dusty (Woody Harrelson) e Lefty (John C. Reilly), desafiando o produtor do show, levam a casa (e o cinema) à baixo com uma série de improvisações de piadas de baixo calão.

Curiosamente, Altman não filma a platéia. Somos nós, espectadores, os convidados. A atmosfera alegre, porém, docemente triste, que o filme constrói é extremamente contagiosa. “A última noite” demanda nossa cumplicidade. No entanto, este sentimento nostálgico e onírico não descamba para a melancolia ou para a amargura. Em determinada seqüência, a personagem de Lindsay Lohan discute com G.K. o fato dele não querer fazer um discurso de encerramento. “Você não quer ser lembrado?”, pergunta ela. “Não quero que mandem se lembrar de mim”, responde ele. Em outras palavras, o longa não se queixa do passado, tampouco renega o presente. “A última noite” é uma elegia das mais sensíveis, uma espécie de memorial de tempos que inevitavelmente passam.

Nenhum comentário: