quarta-feira, abril 02, 2014

mataram meu irmão ***

Grande filme. Lembrei bastante de Rithy Pahn. O cinema como uma oportunidade ética crucial. É o que vejo no esforço de Cristiano Burlan para lembrar do irmão, da família, de Capão Redondo. A periferia é como um personagem onipresente. Ela está em todos os planos de “Mataram meu irmão”. Ela acompanha Burlan por todo o filme, mesmo quando ele não esta mais por lá. Na verdade, Capão Redondo ficou comigo por um bom tempo depois da sessão. Talvez não seja personagem a palavra mais adequada. A periferia é como uma força. Uma força!

Não há aqui um desejo de sublimação freudiana. Burlan é seco, direto, ao ponto. Quando o filme respira, a imagem que nos chega é a de um carro em trânsito sob o céu cinzento ou a negritude da noite de São Paulo. O tom não pode ser moralizante, nem mesmo investigativo. Burlan não se pergunta até que ponto conhecia o irmão. Ele o conhecia. Ponto. Burlan não tem cabeça para trilha, filtros, sensibilidades, sentimentalismos. É bem interessante neste sentido a opção de Burlan de não identificar os entrevistados com legendas. O filme não tem tempo ou cabeça para se preocupar com isso. Não importa quem são eles e as legendas distraem. O que interessa é o que está sendo dito, o que se percebe entre cada fala, como elas juntas formam uma outra coisa. O que se busca é uma espécie de retrato, uma descrição sobre Rafael. Uma descrição (e não um discurso, como bem distinguiu o Filipe Furtado lá na “Cinética”) que diz respeito não somente ao Rafael, mas à sua família, seus amigos, à periferia, a todos nós.

Leio aqui e ali as pessoas falarem em coragem. Pode ser. Mas, enfim, foi-se o tempo em que falar de si, mesmo quando o assunto é trágico, é ter coragem. Não é? Além disso, falar de coragem me parece muitas vezes não falar dos méritos cinematográficos de “Mataram meu irmão”. Muitas coisas (íntimas) são de fato reveladas pelo filme: as mortes violentas do irmão, do pai e da mãe, a prisão de outro irmão, etc. Mas o jogo é outro. Fiquei pensando em “Elena”. Não gosto do filme de Petra Costa. Sinto-me muito incomodado por este filme. Acho estranho sair do cinema sabendo tão pouco de Elena. Acho curioso o foco dado aos aspectos sentimentais (e sedutores) da história, às músicas e belas imagens que os expressem. Acho um crime aquela leitura da carta de despedida, uma invasão imperdoável de privacidade. Não há nada disso em “Mataram meu irmão”.    

sábado, março 29, 2014

juan josé saer botando pra fuder!

"Nesse ponto de sua leitura e de suas reflexões, o Gato levanta a cabeça do livro e fica imóvel, com os olhos pregados na cortina de lona azul que separa a cozinha da varanda: aos poucos, as imagens de sua leitura vão se dissolvendo, e a consciência de estar desperto, sozinho na cozinha iluminada, sentado diante do livro, junto ao copo de vinho branco na noite de verão, ganha-o, gradualmente, até estar consciente de tudo, tão consciente que se diria que é um pouco mais do que pode suportar, porque se num primeiro momento experimenta, por uns segundos, a sensação de estar entre as coisas, de reconhecê-las uma a uma e de poder apalpá-las, sem mediações, em sua consistência real, alcançar a sua verdadeira matéria, essa sensação desaparece quase de imediato e é substituída pela impressão penosa de estar abandonado num fragmento qualquer de um espaço e de um tempo infinitos, sem ter a menor idéia do trajeto que teve de cumprir para chegar ali nem de que maneira deverá se comportar para sair" (Ninguém nada nunca, pág. 174).


quinta-feira, março 27, 2014

um dia na vida

Vi ontem este filme-coisa do Eduardo Coutinho. É um troço complicado e exigente. Não foi fácil assisti-lo. Quer dizer: sentia-me a todo o momento inspirado por ele, movido a pensar diversas e interessantes questões, mas sempre muito propenso a emitir julgamentos sobre o que eu via. Eu ria muito. Isso me incomodou um pouco. O meu riso era ele mesmo uma espécie de julgamento. Não é? Subjaz ao riso alguns abismos (sociais, culturais, econômicos), talvez uma certa arrogância. Não sei. Questões como a lógica da programação da TV aberta brasileira e o que ela teria a dizer sobre o país em que vivemos pipocam por todo o filme. Sem falar no gesto artístico de Coutinho de deslocamento das obras televisivas do espaço e do público para o qual elas foram pensadas, a enorme potência e os efeitos desta re-partilha do sensível a qual o filme se propõe. “Um dia na vida” é uma experiência cinematográfica e antropológica. Em determinado momento, lembrei-me daquele programa (cujo nome, contudo, me foge) do Multishow que exibia os vídeos que as pessoas enviavam para a seleção do Big Brother Brasil. Talvez seja algo como o contraplano de “Um dia na vida”.  

domingo, março 23, 2014

links

- Steven Shaviro em uma discussão sobre o Oscar de Melhor Fotografia dado a "Gravidade"

- Kent Jones inspirado: da política dos autores à teoria dos autores

- Ótima entrevista com Raya Martin

- Inácio Araújo sobre o "Alemão"

- Nova edição da Desistfilm

- Links para trabalhos sobre Wong Kar Wai

- A primeira e a segunda parte de Bordwell sobre Manny Farber

- Adrian Martin sobre Nicholas Ray e "Tabu"

- Jonathan Rosenbaum selecionou alguns links de escritos seus sobre Alain Resnais

- A "Cahiers du Cinema" de fevereiro vem com alguns textos bem legais sobre Andre Bazin hoje. A obra completa do Bazin deverá ser lançada este ano.

E um grande filme:


quarta-feira, março 19, 2014

eles voltam ***

É muito bonito este filme de Marcelo Lordello. Algo como um drama de formação sobre uma menina e sua gradativa consciência de si mesma, de sua autonomia, de seu mundo e dos espaços ao redor dele. Drama, aliás, é uma palavra empregada sem nenhuma inocência. Quer dizer, Lordello é de uma rara precisão dramática: personagens, câmera, texto e sentidos. O início do filme talvez seja seu melhor. Não sei. Uma espécie de prólogo nos introduz de maneira brusca (sentimo-nos jogados ali), porém marcada por sutilezas (como se aquele mundo se constituísse gradativamente por meio de algumas informações e muitos detalhes). “Eles voltam” chega por inteiro, mas de sapatinho. Dois irmãos estão na beira da estrada. Foram deixamos ali pelos pais, é o que parece. Eles brigam por causa de um celular. O menino vai embora atrás de ajuda, e não volta. A menina passa um bom tempo sozinha até resolver cair na estrada, ao som de “Tudo o que você podia ser”, de Milton Nascimento.

O prólogo, suas durações alongadas, seu tom entre o abandono, o medo e a necessidade de movimento, seu convite à potência do mundo, a liberdade que essa chamada abre... tudo isso reverbera por “Eles voltam”. O filme não apela melodramaticamente para a situação de abandono de sua personagem, tampouco explora abusivamente uma identificação entre ela e os espectadores. O que se busca é muito mais um vinculo marcado por esse desafio arriscado que o mundo nos oferece. Cris nos atrai e nos repele, sem nenhum controle sobre seu destino, sempre ao sabor do filme. A menina carrega com ela um certo mistério, uma força que não se deixa agarrar.  

Essa força, essa energia, dá as caras em outros momentos memoráveis: o assentamento, a casa da doméstica e suas filhas, as conversas entre as meninas, a viagem ao centro. Algo nestes momentos escapa ao drama do filme, não parece estar prescrito pelo roteiro ou diretamente ligado à evolução da narrativa. Este algo que escapa tem efeitos não somente realistas ou de verossimilhança, mas também afetivos. O que escapa é algo que surpreende, que nos chama atenção para o tamanho do mundo. E isso, claro, fez um bem danado ao longa.

É visível a falta de recursos – algo que a péssima projeção da sala 2 do Estação só faz sublinhar. Uma certa precariedade percorre o filme e talvez o comprometa em alguns momentos, fazendo nossa imersão tropeçar. Alguns saltos dramáticos, algumas elipses (provocadas ou não pelas dificuldades de produção) também saltam aos olhos, talvez marquem descontinuidades desnecessárias. Acho, contudo, que são coisas pequenas, insignificantes. A perfeição, pra mim, é uma tremenda de uma sacanagem, uma mentira.

quarta-feira, março 12, 2014

hayao miyazaki !

Vi tem poucos dias o último filme do mestre japonês, “Vidas ao vento”. É certamente um belíssimo filme, embora não tenha mexido comigo como fizeram “A viagem de Chihiro” (2001), “A princesa Mononoke” (1997), “Meu amigo Totoro” (1988). Gosto muito também de “Castelo Animado” (2004). Baseado no romance de fantasia homônimo da escritora britânica Diana Wynne Jones, a história se passa numa cidade fictícia em meio uma espécie de guerra civil, onde mágicos, bruxas e seus aprendizes co-existem com cidadãos normais. Sophie é uma menina de 18 anos, que ao ser transformada numa anciã pela Bruxa Má do Lixo terá que enfrentar uma série de obstáculos, refugiando-se no Castelo (o do título) alado do jovem e errante feiticeiro Howl.        

A fonte ocidental (a primeira da filmografia de Miyasaki) e as inúmeras citações do filme à tradição literária infantil sugerem que este talvez seja seu trabalho mais distante da iconografia japonesa que tornou famosos seus trabalhos precedentes. É impressionante como o diretor coloca, à sua maneira, no mesmo caldeirão os irmãos Grimm, “Cinderela”, “Alice no país das maravilhas”, “A bela e a fera”, e até “Fausto”. Mas Miyasaki despe tais contos de quaisquer dicotomias entre o bem e o mal. Tais entidades não existem em separado no mundo do mestre japonês. E todos os movimentos dramáticos são frutos de acasos. A Bruxa Má do Lixo (que vende sua alma para o diabo para não envelhecer e perder seus poderes) entra por acaso na loja em que trabalha Sophie, que também não planejava se abrigar no Castelo de Howl (o equivalente do Haku de “A viagem de Chihiro”), que também não esperava se apaixonar pela menina. O que existem são ações, interesses e escolhas.

Os personagens são brilhantemente construídos. Diferentemente de suas irmãs, Sophie trabalha arduamente na chapelaria de sua madrasta. E nela é fácil perceber o famoso exemplo sartriano do garçom.  A menina segue todo um ritual de conduta, comporta-se como deve se comportar uma boa vendedora de chapéus. Não é preciso observá-la muito tempo para perceber que ela está sempre, tristemente, representando. Quando, logo no início do filme, Sophie encontra Howl, estas alusões existencialistas tornam-se evidentes. A menina nega as escolhas que, de uma maneira ou de outra, sabemos estar presentes, prefere o conformismo e a respeitabilidade da ordem estabelecida e da tradição. Não é à toa que a Bruxa Má do Lixo entra na chapelaria e dispara: “Você é a coisa mais vulgar dessa loja”. Sinistro...

domingo, março 09, 2014

resnais no cinemaison

Sessão dupla Alain Resnais no Cinemaison desta segunda:

Às 18h: O ano passado em Marienbad (1961)

e

Às 20h: Muriel (1963)

domingo, março 02, 2014

resnais

Alain Resnais se foi, e eu, trancando em casa, impedido de sair dela, recorri a algumas das imagens de “Hiroshima, meu amor” (1959) – talvez seja meu preferido ao lado de "Beijo na boca, não" (2003).  Na verdade, refiro-me a uma cena bem específica, aos olhares de um grupo de japoneses, logo no início do filme. Eles nos fitam ou desviam seus olhares, como se estivessem à nossa espera no leito de um hospital. Estão doentes, contaminados pelas radiações da bomba atômica que havia explodido por ali quatorze anos antes.  

Vemos logo em seguida imagens feitas pelo fotógrafo Iwasaki nas horas e nos dias que sucederam à explosão da bomba. Estas imagens foram logo sequestradas pelas autoridades americanas que ocuparam o arquipélago. Introduzidas pelos olhares dos japoneses, elas não haviam sido vistas por ninguém até o momento em que Resnais as colocou em seu filme. “Você não viu nada em Hiroshima”, diz insistentemente o texto de Marguerite Duras. “Sim, eu vi”, retruca a personagem de Emmanuelle Riva. Ela viu, graças aos olhares dos japoneses martirizados que nos interpelam frontalmente. 

Certamente, esta não era a primeira vez que um olhar era dirigido à câmera. O cinema mudo está repleto de momentos como este, quando o olhar cômico nos convida a rir dele ou com ele. Mesmo o cinema clássico hollywoodiano, que via nessa “olhar-câmera” um desvio, uma quebra, um erro, também já havia nos fitado, seja para, como em uma espécie de piscadela, ganhar nossa simpatia, seja para nos seduzir. O olhar dos japoneses de Hiroshima, contudo, é de uma intensidade diferente. Ele nos desafia, nos apequena. Esses “olhares-câmera” atestam que o cinema, os atores, os cineastas, os personagens, deviam mudar. Era preciso um novo cinema.  

Resnais, aliás, não estava sozinho. Ingmar Bergman e Roberto Rossellini haviam feito sequencias similares em “Monika” (1952) e “Europa 51” (1952), respectivamente.  Esses olhares estão na base da irrupção da Nouvelle Vague – aliás, é curioso notar que os primeiros filmes de François Truffaut (“Os incompreendidos”, 1959) e Jean-Luc Godard (“Acossado”, 1960), que dão o pontapé inicial da onda francesa, terminam com seus protagonistas nos fitando frontalmente. 

terça-feira, fevereiro 25, 2014

harold ramis e algo mais

Harold Ramis se foi. A mídia noticia. Noticia, mas desinforma. "Ator de 'Ghostbusters'", dizem. Ramis foi muito mais do que isso. Até mesmo em "Ghostbusters" ele foi muito mais do que um ator. Ramis é uma espécie de catalizador de uma certa comédia americana. Sem ele... Não sei. Por Ramis passaram Dan Aykroyd, Chevy Chase, Bill Murray... Comédia com sentimento. Um cara como Judd Apatow sempre lhe faz as devidas referências. A participação especial de Ramis em "Ligeiramente grávidos" é uma espécie de atestado de filiação. Enfim... Ouçam este incrível podcast.

Alguns links:

- Entrevistas com Kurt Russel, Dennis Lavant e Abel Ferrara!

- Entrevista com Nicole Brenez e texto dela na Cinética!

- Ótimo texto de Steven Shaviro sobre o "Ela" de Spike Jonze.

- David Bordwell e James Agee.

E, pra fechar, um curta de Gus Van Sant:

quarta-feira, fevereiro 19, 2014

a imagem que falta ****

Esta aí um belíssimo, doído filme. Leiam a crítica de Fábio de Andrade na “Cinética”. Ele tem toda razão. Os melhores filmes de Rithy Panh são movidos por perguntas como: Por que encenar? O que significa filmar? E encenar e filmar para Panh é uma necessidade. Estamos falando do Camboja. Estamos falando de um cineasta que viu todos (absolutamente todos) seus parentes e amigos desaparecem ou perecerem em meio ao regime de Pol Pot. Panh não tem imagens deste passado. As imagens que faltam, contudo, insistem. O contrário da existência não é a inexistência, mas a insistência. O que não existe continua a insistir, como se lutasse para passar a existir. O cinema, portanto, é uma oportunidade ética crucial que Panh não pode deixar passar. Seu cinema nos lembra que a verdadeira escolha com relação a um trauma histórico não está entre lembrar-se ou esquecer-se dele. Afinal, os traumas que não queremos ou não somos capazes de relembrar assombram-nos com mais força. Ou seja: para superar um acontecimento traumático, é preciso antes criar forças para lembrá-lo.

sexta-feira, fevereiro 14, 2014

nicolas klotz na caixa cultural

TERÇA-FEIRA – 18 de FEVEREIRO

CINEMA 1

 15h - PARIA (2000) – 125min – 35mm

 18h - A QUESTÃO HUMANA (2007) – 143min – 35mm

CINEMA 2

 16h - DIÁLOGOS CLANDESTINOS 2013 : CEREMONY BRAZZA (52min) + POUR SE FRAYER UN CHEMIN DANS LA JUNGLE, IL EST BON DE FRAPPER AVEC UN BATON POUR ÉCARTER LES DANGERS INVISIBLES(25min)

 19h - BRAD MEHLDAU (56min) + JAMES CARTER (56min)


QUARTA-FEIRA – 19 de FEVEREIRO

CINEMA 1

15h – LES AMANTS CINEMA (65min)  +  JEUNESSE D'HAMLET (9min – 35mm) + LA CONSOLATION (9min – 35mm)

18h - LOW LIFE (2011) – 134min – 35mm

CINEMA 2

16h -MADEMOISELLE JULIE (2011) – 101min

18h30 - LE VENT SOUFFLE DANS LA COUR D'HONNEUR (2013) – 101min


QUINTA-FEIRA – 20 de FEVEREIRO

CINEMA 1

15h – A FERIDA (2004) – 163min – 35mm

18h - DEBATE – NICOLAS KLOTZ e ELISABETH PERCEVAL (roteirista dos filmes) + MEDIAÇÃO LEONARDO LUIZ FERREIRA (curador da mostra)

CINEMA 2

16h - BRAD MEHLDAU (56min) + JAMES CARTER (56min)


SEXTA-FEIRA – 21 de FEVEREIRO

CINEMA 1

15h - LOW LIFE (2011) – 134min – 35mm

18h30 - PARIA (2000) – 125min – 35mm

CINEMA 2

16h  -  LE VENT SOUFFLE DANS LA COUR D'HONNEUR (2013) – 101min

19h - MADEMOISELLE JULIE (101min)


SABADO – 22 de FEVEREIRO

CINEMA 1

13h15 - LES AMANTS CINEMA (65min)  +  JEUNESSE D'HAMLET (9min – 35mm) + LA CONSOLATION (9min – 35mm)

15h - A QUESTÃO HUMANA (2007) – 143min – 35mm

18h – A FERIDA (2004) – 163min – 35mm

CINEMA 2

11h – MASTER CLASS – NICOLAS KLOTZ + MEDIAÇÃO RUY GARDNIER (CRÍTICO DE CINEMA)

16h –DIÁLOGOS CLANDESTINOS 2013 : CEREMONY BRAZZA (52min) + POUR SE FRAYER UN CHEMIN DANS LA JUNGLE, IL EST BON DE FRAPPER AVEC UN BATON POUR ÉCARTER LES DANGERS INVISIBLES (25min)

quinta-feira, fevereiro 06, 2014

eu não faço a menor ideia do que eu tô fazendo com a minha vida

Não cheguei ao fim. Sequer sinto-me apto a dar-lhe estrelinhas. Fiquei realmente nervoso, irritado mesmo, com este filme. “Apenas o fim” (2008) já havia causado uma reação parecida. Eu, contudo, otimista, resolvi ver este “Eu não faço a menor ideia do que eu tô fazendo com a minha vida”. Saí da sessão depois de uns quarenta minutos, e, já na rua, em Copacabana, fiquei pensando sobre o que me incomoda tanto nestes filmes. E devo dizer, logo de cara, que não se trata da encenação limitada, um pouco preguiçosa e bem comportada de Matheus Souza. É mais do que isso.

Souza investe em um humor descolado, supostamente inteligente, porém totalmente desconectado com os sentimentos dos personagens. Coisas como: “Você tem cada de quem mora em casa” ou “Acredito que existe um lugar para onde vão todas as tampas de canetas”. E então, quando os sentimentos veem para o primeiro plano, fica muito difícil levá-los a sério. Os personagens estão todos em uma espécie de competição de performances (até mesmo os personagens reais que aparecem no projeto documental da protagonista). Estamos diante de um filme muito mais preocupado em exteriorizar um certo número de referências, de gracejos e tiradas verbais, do que na observação e nos sentimentos. Quer dizer: são subjetividades exteriorizadas onde vigoram a projeção e a antecipação. Uma subjetividade que se constitui na própria exterioridade, no processo mesmo de se projetar e de se fazer visível a outrem. É difícil solidarizar com estes personagens. Eles se filiam a qualquer gosto. São muito mais um estilo do que qualquer outra coisa.

O filme se afirma como uma história de autoconhecimento. Ok. Mas estes personagens são tão conscientes de si mesmos, de seus sonhos, de seus fracassos, da natureza das relações que mantém com seus familiares e (ex)amantes. E “Eu não faço a menor ideia do que eu tô fazendo com a minha vida” fala sem parar, mas nunca ouve, ninguém. É tudo tão... falso. Por isso, sinto-me muito incomodado quando ouço dizerem que se trata de um retrato geracional, de uma juventude da era da internet e do consumismo. Acho esta visão absolutamente míope e distorcida. Estes jovens são tão formatados, enquadrados, limitados (por roteiro, referências mil e uma certa visão de mundo), como os de “Malhação”.  

Eu não conhecia até bem pouco tempo atrás ninguém que gostasse realmente ou abertamente dos filmes de Souza. Os meus amigos sequer veem seus filmes. Os meus primos mais jovens tampouco se dizem fãs de “Apenas o fim” ou “Eu não faço a menor ideia do que eu tô fazendo com a minha vida”. Como então Souza conseguiu fazer tanto (coluna em jornal, dois longas, peças de teatro, etc)? Não conseguia entender isso. Outro dia, contudo, ao ver o pôster de um de seus filmes na rua, minha afilhada de onze anos ficou animada. Ela gostou de “Apenas o fim” e queria muito ver “Eu não faço a menor ideia do que eu tô fazendo com a minha vida”. Nada contra ter fãs de onze anos. Mas isso não é no mínimo estranho? Souza tem seus vinte e tantos anos. Faz filmes sobre personagens com a mesma idade que ele. Contudo, quem se identifica com eles, quem gosta dos longas, têm uma década a menos.

terça-feira, fevereiro 04, 2014

caché ***

Acho mesmo que um cineasta deve ser responsabilizado pelo mundo e pelas criaturas que ele põe em movimento. Neste sentido, Michael Haneke é uma espécie de Dr. Mabuse do cinema contemporâneo. É uma espécie de gênio do mal. Reconheço seu enorme talento, mas tenho um profundo desprezo pelo mundo que ele constitui em filme. Revi “Caché” (2005) outro dia. E aqui o projeto cinematográfico de Haneke atinge seu ápice de manipulação. Entre as muitas questões que o filme levanta, eu me vi nessa revisão pensando no processo de identificação com o imaginário representado na tela e mais propriamente na maneira pela qual europeus e argelinos convivem na mise-en-scène de Haneke. Destacaria ainda para uma análise mais sistemática do longa a pergunta pela autoria das imagens de vigilância (uma pergunta, na minha opinião, mais do válida), e o tipo de identificação que o filme alimenta entre o aparato cinematográfico e o espectador.

Acho cada vez mais que “Caché” desfila um multiculturalismo um tanto míope. Se o discurso nacionalista dos anos 60 traçava linhas demarcatórias bastante nítidas entre o Primeiro e o Terceiro Mundos, entre opressor e oprimido, o discurso pós-colonial e multiculturalista substitui esses dualismos binaristas por um espectro mais nuançado de sutis diferenciações. Mas em “Caché” não há  ambiguidades. Há toda uma vitimização do personagem argelino, enquanto Georges é acusado de todos os males do filme. Apesar de não podermos falar numa pureza na representação destas identidades, os paradigmas permanecem rígidos, não se contaminam.

Neste sentido, parece-me haver por vezes uma certa nostalgia pelo retorno a uma política bem definida de oposições binárias, em que, teoricamente, se podia distinguir com maior clareza os bonzinhos dos malvados. Eu fico por fim com a suspeita de um narcisismo europeu às avessas - “Caché”, então, se aproximaria estranhamente de uma cada vez mais vasta produção hollywoodiana empenhada em “compreender” o problema da África (“Diamante de sangue”, “O senhor das armas”, “Jardineiro fiel”, entre outros). Haneke parece situar a Europa como fonte de todos os males sociais do mundo. Uma perspectiva que não deixa de ser eurocêntrica, reduzindo a vida fora da Europa a uma resposta passiva/patológica à “invasão” ocidental.

domingo, fevereiro 02, 2014

maurice pialat

Quem passa de vez em quando por aqui já sabe. Maurice Pialat!

Agora, no CCBB:

Dia 01 de fevereiro | sábado
17h – Nós não envelheceremos juntos | 115min | 35mm | 18 anos
19h – Polícia | 113min | 35mm | 14 anos

Dia 02 de fevereiro | domingo
17h – Loulou | 110min | 35mm | 14 anos
19h - Infância nua | 83min | 35mm | 12 anos

Dia 03 de fevereiro | segunda-feira
14h30 – Van Gogh | 158min | 35mm | 14 anos
17h30 - Nós não envelheceremos juntos | 115min | 35mm | 18 anos
19h30 – Antes passe no vestibular | 86min | DVD | 14 anos

Dia 05 de fevereiro | quarta-feira
15h30 – Sob o sol de satã | 93 min | 35mm | 16 anos
17h30 - Polícia | 113min | 35mm | 14 anos
19h30 – Sessão Curtas-metragens Turcos | O Mestre Galip, Bizâncio, Pehlivan- os lutadores turcos, Istambul, O Chifre de Ouro, O Estreito de Bósforo | 74min | 35mm | 12 anos

Dia 06 de fevereiro | quinta-feira
15h30 – Infância nua | 83min | 35mm | 12 anos
17h30 - O garoto | 102 min | 35mm | 12 anos
19h30 – A ferida aberta | 82min | DVD | 16 anos

Dia 07 de fevereiro | sexta-feira
15h30 - Antes passe no vestibular | 86min | DVD | 14 anos
17h30 - Loulou | 110min | 35mm | 14 anos
19h30 - Nós não envelheceremos juntos | 115min | 35mm | 18 anos

Dia 08 de fevereiro | sábado
17h - Sob o sol de satã | 93 min | 35mm | 16 anos
19h – Aos nossos amores | 95min | 35mm | 14 anos

Dia 09 de fevereiro | domingo
17h - Sessão Curtas-metragens Turcos | O Mestre Galip, Bizâncio, Pehlivan- os lutadores turcos, Istambul, O Chifre de Ouro, O Estreito de Bósforo | 74min | 35mm | 12 anos
18h30 - Van Gogh | 158min | 35mm | 14 anos

Dia 10 de fevereiro | segunda-feira
15h30 - Polícia | 113min | 35mm | 14 anos
17h30 - Aos nossos amores | 95min | 35mm | 14 anos
19h30 - O garoto | 102 min | 35mm | 12 anos

terça-feira, janeiro 28, 2014

dois links

- Um ensaio visual de Cristina Álvarez López e Adrian Martin sobre dança, corpos e Philippe Garrel.

- David Bordwell vai fazer uma série de posts sobre críticos de cinema americanos: James Agee, Manny Farber e Parker Tyler.



domingo, janeiro 26, 2014

silvia prieto ****

Não conheço muito da obra de Martin Rejtman. Este “Silvia Prieto” (1999), contudo, é um grande filme. Gosto muito dele. É um filme povoado por personagens que chegaram aos 30 e percebem que algo está mudando. Nenhum deles parece estar onde realmente queria, ou melhor, onde havia planejado estar quando chegasse a essa idade. O cineasta opera nesse microcosmo de personagens, que interagem a partir de um pequeno número de situações que se repetem a todo o momento. Eles não são frutos de ações. São o que dizem. Mas o que dizem não corresponde ao que fazem. É uma coisa um tanto confusa. Os atores são como marionetes, jamais cedem à tentação de “representar” o texto, como se estivessem escutando suas próprias palavras ditas por um outro. O tom é limpo e monocórdio, as falas parecem desapropriadas de significação, e a narrativa carece de qualquer sentido de profundidade trágica. Uma aventura dialogada sobre o nada? 

Em “Silvia Prieto”, cada personagem pode ser definido por um grau de potência singular e, por conseguinte, por um certo poder de afetar e de ser afetado. Silvia Prieto é como um carrapato. Deleuze gostava dessa metáfora. O carrapato é aquele que busca o lugar mais alto da árvore, depois se deixa cair quando passa algum mamífero, e, por fim, se enfia debaixo da pele do animal, chupando o seu sangue. O que o afeta? A luz, o cheiro e o sangue. Eis um ser que se define por seus afetos. Ele poderia ficar um tempo longuíssimo na espera em meio à floresta imensa e silenciosa, para, de repente, ter o seu breve festim de sangue e possivelmente a morte. Silvia Prieto, por sua vez, troca de nome e identidade. Não liga muito para essas coisas. Não liga muito para nada. É sempre tudo uma questão de experimentação. Seu grau de potência, o seu poder de afetar e de ser afetada, não pode ser medido e jamais se esgota. Ela inventa constantemente a cena na qual se mostrará visível e a língua que a permitirá se expressar. Ela se nomeia e nomeia o mundo do qual quer fazer parte. E nesse jogo - eminentemente político, diga-se de passagem – o cinema recupera uma certa potência e evoca um outro agir na relação com o outro. 

terça-feira, janeiro 21, 2014

sábado, janeiro 18, 2014

leviatã *****

O filme começa com uma citação ao livro de Jó:

31 Ele faz as profundezas se agitarem como caldeirão fervente e revolve o mar como pote de unguento.
32 Deixa atrás de si um rastro cintilante, como se fossem os cabelos brancos do abismo.
33 Nada na terra se equipara a ele: criatura destemida!

Os versículos fazem referência ao monstro mitológico que dá nome ao filme. Leviatã (Leviathan ou Leviatha) é descrito na demonologia como um dos quatro príncipes coroados do inferno. É o monstro marinho bíblico, de enormes proporções. É o rei de todas as criaturas do mar. Seu nome vem do hebraico, e significa “Serpente Tortuosa” - uma referência tanto a sua natureza animalesca como ao seu aspecto oculto. Seu arquétipo se refere à brutalidade, à ferocidade e aos impulsos mais selvagens e incontidos da humanidade.

“Leviatã” é um filme sobre homens no mar, entre barcos, peixes e aves. Um longa rodado na costa da mítica cidade de Moby Dick. “Leviatã” parece totalmente desinteressado nos aspectos naturalistas ou antropológicos. Tampouco estamos diante de um documentário de natureza ou paisagem. Muito menos uma visão sobre o trabalho e as relações sociais que mantém a pesca. Não se trata de uma perspectiva puramente observacional ou contemplativa. Não há uma ênfase expositiva ou denúncias. Não há entrevistas, narração, ou enredo. Nem mesmo “cenas”. Sabe-se que os cineastas Lucien Castaing-Taylor e Véréna Paravel têm lá seus problemas com a noção de “direção”, e não é difícil entender o porquê.

“Leviatã” é uma espécie de forma de experimentação coletiva que dá rédea solta às perspectivas de ambos os diretores, os pescadores e as suas capturas, registrando as diversas maneiras em que homens, animais e máquinas, beleza e horror, vida e morte, se relacionam incessantemente neste que é um dos empreendimentos humanos mais antigos.  É de um outro tempo que fala “Leviatã”. Um tempo não exatamente histórico, muito menos cronológico ou acronológico. Um tempo sensual que alinhava as ações e imagens em um fluxo contínuo: peixes são capturados e mortos; suas partes indesejáveis são jogadas ao mar; sangue transborda por todos os lados; gaivotas invadem os céus e mergulham atraídas pelas carcaças; as ondas balançam o barco; homens tomam banho; o trabalho recomeça.

Onze pequenas câmeras digitais estavam a bordo. Ora nas mãos dos cineastas Castaing-Taylor e Paravel. Ora presas aos corpos dos pescadores. São ainda muitas vezes colocadas em lugares absolutamente inusitados, como, por exemplo, coladas a peixes mortos que balançam com o barco. Elas mergulham, balançam, chocam-se com os corpos ao redor. Elas são, elas mesmas, corpos sencientes. E, conjugadas com a engenhosidade da montagem e do som, constroem uma materialidade líquida, contagiosa, bem como algo que somente a expressão absolutamente feliz de Castaing-Taylor poderia expressar: “uma etnografia sensorial”.

Quer dizer: “Leviatã” é como um ensaio sobre o nascimento de um visível que ainda se furta aos nossos olhos. É um filme que deseja falar do espaço, dos corpos, da luz, que estão aí - e dificilmente você terá visto o mar, peixes e a pesca como aqui. Castaing-Taylor e Paravel acreditam na capacidade do cinema de elevar nossa faculdade de sentir a um certo limiar de intensidade que a liberta dos esquemas que a engendram, fazendo-nos vislumbrar novas formas de se relacionar com o mundo. Eles valorizam uma certa impotência no âmago do pensamento que o cinema é capaz de revelar. E apostam na conexão homem-mundo, algo que se estabelece não por meio de uma fé em uma alguma transcendência, mas através de uma fé imanente nesse mundo.

Vejam aí o trailer:


* Uma pena não tê-lo visto no cinema. Ele, com certeza, só teria a crescer – sobretudo no que diz respeito ao engenhoso desenho de som.

quarta-feira, janeiro 15, 2014

links

- Algumas Listas Legais de Fim de Ano: La Furia Umana, Mubi, Senses of Cinema, BFI, Film Comment e Filipe Furtado.

- Steven Shaviro deu uma aula sobre "Spring Breakers" (2012), de Harmony Korine. Dá pra baixar o pod cast neste link.

- Texto de Luiz Soares Júnior sobre Júlio Bressane.

- Sensacional a pauta James Benning na Cinética.

- Muito bom também o novo número da Film Philosophy.

- Jonathan Rosenbaum sobre "O Discreto Charme da Burguesia" (1972), de Luis Buñuel.

- MediaScape é a revista do departamento de cinema e mídia da UCLA.

- Ritwik Ghatak em dois textos de Adrian Martin, aqui e aqui.

- Adrian Martin e os 10 confrontos do ano.

- Outro belo texto de Adrian Martin.

- Os 12 Favoritos de gente como: Jonathan Rosenbaum, Adrian Martin, Nicole Brenez, Fergus Daly, Brad Stevens, Monte Hellman, Raymond Bellour, Peter Tscherkassky, etc.

- J. Hoberman sobre David Cronenberg.

- Bela entrevista com Philippe Garrel

quinta-feira, janeiro 09, 2014

regis dialogue

Neste site, é possível acessar as conversas entre grandes cineastas e críticos de renome. Vejam lá. Vale muito a pena.

terça-feira, janeiro 07, 2014

sombras ****

Eu não conheço bem o trabalho de Philippe Grandrieux. Vi apenas uma ou outra cena de “Un Lac” (2008). É pra mim, portanto, difícil descrever a experiência de ver um filme como “Sombras” (1998). Grandrieux acompanha um mestre de marionettes que é também um bruto assassino de mulheres. O título se refere à escuridão a partir da qual os eventos narrados surgem e para onde parecem sempre retornar. “Sombras” é um filme de extremos. Ele começa já no oito ou oitenta: crianças veem espantadas e aos berros um show de fantoches, o que dá lugar, em seguida, a um longo travelling de pessoas na beira de uma estrada apenas olhando diretamente para câmera. Entre a histeria lúdica e alegre da primeira sequencia e a serenidade elegante e silenciosa da segunda, entre o tom mágico e o terror em suspenso, desenha-se uma certa ficção - e o verbo desenhar não se faz aqui de maneira inocente.

O mais importante em “Sombras” não está exatamente na narrativa reconhecível do serial killer, mas na confrontação entre este material já codificado, formatado, e todo um tratamento formal ou um experimento estético. Ou seja: Grandrieux se utiliza da história do assassino em série como um ponto de partida, como uma porta de acesso, como uma hipótese de trabalho. O cineasta impõe uma tensão contínua, uma espécie de suspensão temporária do mau, que nos acompanha do início do fim do filme. A imagem é dotada de uma inquietação formal e plástica. Os planos são instáveis, erráticos, na mão. A montagem é cáustica, estabelecendo um ritmo particular para em seguida violá-lo violentamente. Somos instados a desconfiar do que vemos. Talvez não seja isso. O que se produz, na verdade, é talvez um abismo entre o que vemos e o que podemos dizer sobre o que vemos.

A imagem cinematográfica como um processo de figuração constante. Um mundo material e virtual. Um cinema que retoma de certa maneira aquela mesma vontade que levaram nossos antepassados a pintar nas cavernas. Ou seja, a imagem não exatamente como uma forma de representação, mas um vir a ser. O som, a luz, o tempo, embora na maioria das vezes considerados como imateriais, apontam também para uma presença mais evidente do material da imagem cinematográfica, para uma dimensão tátil ou háptica. A câmera persiste implacavelmente sobre o cabelo das vítimas, o que não geral nenhum significado, sublinhando apenas a textura daquele material. A natureza é tratada da mesma forma, em diferentes profundidades de campo, angulações e gradações de luz e foco. É preciso admitir essa relação tátil com a imagem, como um tipo de visão que faz do olho um órgão de toque. Daí o háptico: ao olhar, tocamos o objeto com os nossos olhos.

“Sombras” se faz em uma espécie de emanação de luz. É um filme sobre a espessura impenetrável dos corpos, sobre a fricção elétrica entre a luz e as trevas, sobre a tentação pelo crepúsculo, sobre a densidade dos planos e a intensidade incandescente do material fílmico. Grandrieux parece buscar o ponto de encontro entre a pintura, o cinema e a vídeo arte. Não é a toa que Nicole Brenez costuma dizer que o cinema de Grandrieux atente uma exigência contemporânea por um retorno às fontes mais profundas e obscuras do desejo de representação. Por que fazer imagens? Que objetivo elas contém? Que realidade carregam consigo? Em uma conversa com a teórica francesa, o cineasta lança mão de imagens e sugestões inspiradoras: um campo com ramos crescendo por todos os lados (ao invés de uma árvore, com tronco e galhos), um filme espinosiano, uma constante vibração de sensações e afetos que nos irmana, que nos reeinscreve no mundo.

Coisas a se pensar. A imagem sem valor de face aparente, que preserva um tipo de fascinação que o cinema não via há algum tempo e que nos demanda uma postura diferenciada. Antes de compreender, é preciso ver. Não se trata de uma decifração. Um filme deve ganhar uma consistência de ser, que insiste em si mesmo, abre-se, expõe-se e produz uma vida, anterior e adiante, que fissura o tempo presente, justifica-o e dinamiza-o. É uma certa opacidade do pensamento da visão que está em jogo: experiência irredutível à generalização, que, justamente por situar-se além de nossas possibilidades, força a pensar.  

sexta-feira, janeiro 03, 2014

uma questão de pecado ****

Se “Azul é a cor mais quente” fica menor a cada lembrança, este novo filme de Jia Zhang-ke cresce sempre que o revisito. Eu já tinha gostado de “Uma questão de pecado”. Em geral, os filmes de Zhange-Ke são muito marcados por dois elementos: os personagens principais e as locações. É o caso de “Em busca da vida” (2006), seus dois protagonistas e região da represa. “Uma questão de pecado” é menos background e mais imediato e direto. As locações e a modulação dos espaços são de extrema importância, mas o que se privilegia é a relação entre os personagens. A China continua em quadro. É ela que move a história. O dado humano, contudo, é o ponto nevrálgico deste cinema. Varridos pelo desenvolvimento desenfreado, pela abertura econômica sem precedentes, pelo capitalismo em sua versão mais feroz.

“Uma questão de pecado” é de natureza líquida. Quer dizer, o filme tem uma propensão à dissolução, seja no que diz respeito aos acontecimentos, aos personagens, aos espaços. Esta liquidez aponta em um crescente pouco harmônico para violência. A violência gráfica, sangrenta, chocante. Ela, afinal, talvez também seja direcionada a nós espectadores.  Ela também nos concerne. É preciso ainda sublinhar a construção dos espaços, a riqueza “cenográfica” das locações, e, talvez, sobretudo, a precisão dos movimentos de câmera. Os movimentos aprisionam os personagens em um ir e vir que eles não controlam, não entendem.

O tempo fez muito bem a “Uma questão de pecado”, e vez ou outra me pego pensando em alguma cena, em algum dado. São coisas que, espalhadas pelo filme, não chamam muita atenção para si em uma primeira experiência. Refiro-me, por exemplo, ao fato dos personagens jamais estarem onde nasceram, à questão da migração. O que mais me impressiona, contudo, é a condição de maleabilidade moral que permeia os personagens, o estado de corrupção iminente ao qual todos neste filme estão fadados. As memórias, os laços, a tradição, ainda estão por lá. Muitos dos problemas nascem de uma espécie de guerra travada no imaginário dos personagens. É algo muito forte o que Zhange-Ke consegue alcançar neste filme.

domingo, dezembro 29, 2013

azul é a cor mais quente **

Alguns filmes crescem na memória. Outros ficam menores. O novo filme-sensação do franco-argelino Abdellatif Kechiche me parece (cada vez mais) estar no segundo time. É só lembrar de “Azul é a cor mais quente” que eu fico mais e mais incomodado. O filme é eficiente, porém limitado. Nada demais, embora com alguns pontos positivos. Isso já tinha ficado claro. Em um primeiro visionamento, contudo, apeguei-me ao sentido de urgência já característico do cinema Kechiche, e me perguntava durante a sessão se aquilo não era melhor compreendido como uma experiência subjetiva da personagem.

Agora, contudo, o que mais me salta à memória é um desejo de grandeza, uma vontade onipotente de cobrir tudo, absolutamente tudo. “Azul é a cor mais quente” é enorme. Suas cenas quase sempre duram mais do que de fato necessitavam. É curioso como, em um primeiro momento, o filme retira muito de sua força justamente dessa duração. Em um segundo momento, entretanto, o que se sobressai pra mim são alguns esquematismos e simplificações bem complicadas. Vejo um certo determinismo em algumas relações, sobretudo no que diz respeito a Adele e suas amigas de escola. O bar de lésbicas é um crime de tão estereotipado, assim como o mundo artístico da cidade. A própria personagem da Emma, suas motivações e dilemas artísticos e profissionais, parece saída de uma espécie de manual.

Esse desequilíbrio sempre esteve presente no cinema de Kechiche, e isso me faz pensar, com uma convicção cada vez mais forte, que para o franco-argelino, o estilo precede mesmo ao filme: a câmera (multicâmeras, na verdade) na mão hiperativa, quase sempre bem perto dos corpos, muitas vezes em closes, com cortes sucessivos dentro das cenas e muitas elipses. O final aberto me irrita bastante também. É algo recorrente no cinema de Kechiche, embora também esteja presente no cinema de muitos outros. Ela aspira a algo aberto, aberto ao nosso testemunho, como algo que se desenrolou e se desenrolará... A cena ainda dura, mais uma vez, mais do que ela precisava... O que vejo é uma manipulação dramática muito forte e consciente. Quer dizer: Kechiche dá vida aos seus personagens, mas também os asfixia. Às vezes a impressão é a de que os personagens nascem já asfixiados, algo como natimortos. Enfim...

terça-feira, dezembro 17, 2013

doce amianto ****

Que filme bonito. Dói-me vê-lo sair assim do circuito carioca, em apenas duas semanas, como se sequer tivesse entrado em cartaz. Dói-me porque, para além de ser comoventemente belo, é um filme que quer ser visto. Acho mesmo que caso a divulgação fosse mais presente e os exibidores um pouco mais corajosos, “Doce Amianto” encontraria seu público, fiel e apaixonado. Eu mesmo fui vê-lo sozinho pela primeira vez. Depois voltei com minha esposa e minha mãe. Elas indicaram para outras pessoas. O meu primo ouviu, gostou e indicou para os seus. Estes vão ter que esperar pelo DVD...

Amianto é um personagem diferente, afetada como o filme. Amianto é uma certa sensibilidade. Amianto é ela mesma uma espécie de artifício. É vulnerável, porém invencível. É excessiva, mas não precisa de muito. Amianto é um duplo fabular que se propaga, que se dissemina por uma vontade de narratividade, de afirmação e desejo. Amianto busca um lugar para chamar de seu. Este lugar, é preciso construí-lo, a cada fantasia, a cada afeto, a cada encontro, através do cinema. Um lugar que nem por isso deixa de ser real.

É na verdade bem curioso o fato de meu último post ter sido sobre Manoel de Oliveira e seu caso de amor pelo artifício cinematográfico. A riqueza contagiante de “Doce Amianto” é de natureza parecida. O filme exala aquela consciência de seu próprio lugar na história das formas cinematográficas, aquela noção de ter vindo depois. Algo que me lembra o diagnóstico de Alain Bergala, que, nos anos 80, usou o termo “maneirismo” para se referir ao cinema de Lars Von Trier, Win Wenders e Jim Jarmush, entre outros. “Doce Amianto” compartilha essa constatação da idade avançada do cinema e se constitui em uma espécie de inventário de formas cinematográficas. São muitas referências. São muitos artifícios. São muitas “maneiras”. O que é extremamente interessante é que tudo isso é captado na mesma textura, identificáveis, embora indiferenciáveis. Quer dizer: a constatação da idade do cinema e o inventário de formas se fazem sem peso ou dificuldade. É um amor pansexual este que “Doce Amianto” alimenta com o cinema e suas convenções. Através delas, da exploração daquilo que elas podem, busca-se novos vínculos com o mundo.

terça-feira, dezembro 10, 2013

o estranho caso de angélica ****

Vi este filme novamente. Viria mais algumas vezes. “O estranho caso de Angélica” é um grande filme. Manoel de Oliveira faz um cinema que me agrada cada vez mais. Eu tinha uma certa implicância com os seus longas, sobretudo, com o português de Portugal. Uma idiossincrasia minha, difícil de ser superada. O tempo, os anos que ganhei ao longo do tempo, contudo, abriram-me os olhos e os ouvidos. E hoje, me vejo divertindo-me aos montes nos filmes de Oliveira.  

Não foi diferente neste “O estranho caso de Angélica”. É curioso como Oliveira consegue imprimir uma certa indeterminação temporal em seus filmes. As referências temporais confundem um pouco as coordenadas, embora sem jamais chamar atenção pra si ou atrapalhar a compreensão da coias. Quer dizer: ao contrário, a indeterminação faz incrivelmente bem ao jogo cinematográfico um tanto romântico que Oliveira nos propõe neste longa. Ela talvez aumente o alcance do filme. Não sei bem. “O estranho caso de Angélica” é certamente um filme livre e desimpedido.  

É incrível como o varal de fotos do quarto de Isaac (Ricardo Trêpa, um animal oliveiriano) contém o conflito que move o filme. As fotos de Angélica morta, porém, bela e como que sorrindo, são intercaladas com as imagens de um grupo de homens e suas enxadas, arando um campo. A beleza assustadora de Angélica. A brutalidade bela dos trabalhadores. A noite e o dia. O interior e o exterior. A mágica e o documento. O sonho e a realidade. Morte e vida. A sucessão das imagens nos varal faz das fotografias cinema. Oliveira sempre fala de cinema. Espírito, Matéria, Imagem. E cinema, como nenhuma outra arte, é capaz de capturar tudo na mesma textura, em uma dialética ativa entre o atual e o virtual, o interno e o externo, o concreto e abstrato, o sonho e a realidade.

A imagem de Angélica, morta, vem à vida, toma seu “criador” de assalto, torna-se mais real do que o mundo do qual ela foi extraída. Isaac se apega aos trabalhadores, vive em uma espécie de inter-mundo, entre eles e Angélica. Eis que, de repente, em um sonho, Angélica aparece, o abraça, e, juntos, eles voam pela cidade. O voo de Angélica e Isaac é movido a inesperados efeitos especiais, em preto-e-branco. Fala-se em homenagem a George Meliés. Fala-se em um elogio a um tempo, digamos, mais artesanal. Talvez seja tudo isso mesmo. E um pouco mais. Isaac acorda, dá-se conta que estava sonhando, e se pergunta: “seria isto o absoluto pelo qual eu ansiava”?

Caramba! Isaac tem razão. Ele passará o resto do filme esperando por momento absoluto. Eu, enquanto esperava com ele, me perguntava o que isso dizia sobre o cinema de Oliveira. Afinal, ao busca uma imagem do absoluto, o cineasta centenário esculpiu (e o termo não é empregado à toa) uma sequência artificiosa, brincalhona, um tanto irreal, porém também absolutamente realista. Ou não? Não é uma maravilha? O artifício oliveiriano é algo que supera dicotomias que marca o cinema e o pensamento sobre ele. “O estranho caso de Angélica” pode ser sintetizado como uma certa postura do cinema diante do mundo. Oliveira é um cara fascinado pelo poder do cinema, ou melhor, pelas convenções mais disseminadas do cinema.

quarta-feira, dezembro 04, 2013

miklos jancso

Começou na Caixa Cultural uma mostra com alguns filmes do húngaro Milos Jancso! Vejam a programação abaixo. Se tiver que escolher um, vá ver "Os sem esperança" (1966). Dá-lhe plano sequencia.

QUARTA-FEIRA, 4 DE DEZEMBRO
14h30 - Rapsódia Húngara (Magyar rapszódia) – 1978, DVD, 103min | Classificação: 16 anos
17h - Allegro Bárbaro (Magyar rapszódia II) – 1979, DVD, 73min | Classificação: 16 anos
19h - Coração Tirano, aliás, Boccaccio na Hungria (A zsarnok szíve, avagy Boccaccio Magyarországon) – 1981, 35mm, 96min | Classificação: 14 anos

QUINTA-FEIRA, 5 DE DEZEMBRO
15h40 - Inverno de Sirocco (Sirokkó) – 1969, DVD, 80min | Classificação: 14 anos
17h40 - Silêncio e Grito (Csend és kiáltás) – 1967, 35mm, 73min | Classificação: 12 anos
19h10 - DEBATE: A ESTÉTICA DE JANCSÓ – com Hernani Heffner, pesquisador e chefe de preservação no MAM-Rio e Ruy Gardnier, fundador da revista de crítica cinematográfica Contracampo e crítico no jornal O Globo.

SEXTA-FEIRA, 6 DE DEZEMBRO
17h - Temporada dos monstros (Szörnyek évadja) – 1987, DVD, 100min | Classificação: 14 anos
19h - Ventos Cintilantes (Fényes Szelek) – 1968, 35mm, 80min | Classificação: 10 anos

SÁBADO, 7 DE DEZEMBRO
15h - Em Budapeste, o Senhor deu uma lanterna em minhas mãos (Nekem lámpást adott kezembe az Úr Pesten) – 1998, 35mm, 103min | Classificação: 12 anos
17h - Coração Tirano, aliás, Boccaccio na Hungria (A zsarnok szíve, avagy Boccaccio Magyarországon) – 1981, 35mm, 96min | Classificação: 14 anos
19h - Os sem-esperança (Szegénylegények) – 1966, 35mm, 90min | Classificação: 12 anos

DOMINGO, 8 DE DEZEMBRO
14h - Temporada dos monstros (Szörnyek évadja) – 1987, DVD, 100min | Classificação: 14 anos
16h - O horóscopo de Jesus Cristo (Jézus Krisztus horoszkópja) - 1988, 35mm, 90min | Classificação: 14 anos
18h - Silêncio e Grito (Csend és kiáltás) – 1967, 35mm, 73min | Classificação: 12 anos

//SEMANA 2

TERÇA-FEIRA, 10 DE DEZEMBRO
15h - Rapsódia Húngara (Magyar rapszódia) – 1978, DVD, 103min | Classificação: 16 anos
17h - Ventos Cintilantes (Fényes Szelek) – 1968, 35mm, 80min | Classificação: 10 anos
19h - DEBATE: HUNGRIA, HISTÓRIA E CINEMA – a confirmar

QUARTA-FEIRA, 11 DE DEZEMBRO
14h - Inverno de Sirocco (Sirokkó) – 1969, DVD, 80min | Classificação: 14 anos
16h - Meu caminho pra casa  (Így jöttem) – 1964, DVD, 109min | Classificação: 12 anos
19h - Vermelhos e Brancos (Csillagosok, katonák) – 1967, 35mm, 90min | Classificação: 12 anos

QUINTA-FEIRA, 12 DE DEZEMBRO
15h - Electra, meu amor (Szerelmem, Elektra) – 1974, 35mm, 70min | Classificação: 14 anos
17h - Salmo Vermelho: O Povo ainda quer mais! (Még kér a nép) – 1971, 35mm, 87min | Classificação: 14 anos
19h - Cantata: dissolução e ligação (Oldás és kötés) – 1963, 35mm, 94min | Classificação: 12 anos

SEXTA-FEIRA, 13 DE DEZEMBRO
17h - Allegro Bárbaro (Magyar rapszódia II) – 1979, DVD, 73min | Classificação: 16 anos
19h - Em Budapeste, o Senhor deu uma lanterna em minhas mãos (Nekem lámpást adott kezembe az Úr Pesten) – 1998, 35mm, 103min | Classificação: 12 anos

SÁBADO, 14 DE DEZEMBRO
15h - O horóscopo de Jesus Cristo (Jézus Krisztus horoszkópja) - 1988, 35mm, 90min | Classificação: 14 anos
17h - Electra, meu amor (Szerelmem, Elektra) – 1974, 35mm, 70min | Classificação: 14 anos
19h - Salmo Vermelho: O Povo ainda quer mais! (Még kér a nép) – 1971, 35mm, 87min | Classificação: 14 anos

DOMINGO, 15 DE DEZEMBRO
15h - Cantata: dissolução e ligação (Oldás és kötés) – 1963, 35mm, 94min | Classificação: 12 anos
17h - Vermelhos e Brancos (Csillagosok, katonák) – 1967, 35mm, 90min | Classificação: 12 anos

quarta-feira, novembro 27, 2013

filmes-carta e naruse

Outras duas mostras bem bacanas. "Filmes-carta: por uma estética do encontro" segue na Caixa Cultural até o dia 1° de dezembro. Vejam a programação no site da mostra.

E, no CCBB, uma retrospectiva com alguns filmes do mestre japonês Mikio Naruse. A programação abaixo. Leiam também o texto de Chris Fujiwara.

>> Dia 27, QUARTA
17h30min – Vida de casado (97’)
19h30min – Chuva repentina (92’)

>> Dia 28, QUINTA
17h30min – Toda a família trabalha (65’)
19h30min – Nuvens de verão (135’)

>> Dia 29, SEXTA
15h30min – Tormento (98’)
17h30min – Atores itinerantes (71’)
19h – Nuvens flutuantes (124’)

>> Dia 30, SÁBADO
18h – A chegada do outono (80’)
19h30min – Quando a mulher sobe a escada (111’)

>> Dia 1º, DOMINGO
17h – Mamãe (98’)
19h – Nuvens dispersas (108’)

>> Dia 02, SEGUNDA
17h30min – Tsuruhachi e Tsurujiro (89’)
19h30min – Correnteza (117’)

>> Dia 4, QUARTA
17h30min – Tormento (98’)
19h30min – Mamãe (98’)

>> Dia 5, QUINTA
17h30min – A chegada do outono (80’)
19h30min – Tsuruhachi e Tsurujiro (89’)

>> Dia 6, SEXTA
15h – Nuvens flutuantes (124’)
17h15min – Nuvens de verão (135’)
20h – Nuvens dispersas (108)

>> Dia 7, SÁBADO
17h30min – Chuva repentina (92’)
19h30min – Vida de casado (97’)

>> Dia 8, DOMINGO
16h30min – Correnteza (117’)
19h – Quando a mulher sobe a escada (111’)

>> Dia 9, SEGUNDA
17h30min – Atores itinerantes (71’)

19h30min – Toda a familia trabalha (65’)

segunda-feira, novembro 25, 2013

recine

Enquanto a Semana dos Realizadores roubas as atenções no Espaço Itaú de Cinema, o Recine tem pelo menos três sessões imperdíveis.

No Arquivo Nacional, a versão restaurada de "Copacabana mon amour" (1970), de Rogério Sganzerla, na terça, 26 de novembro, às 20h.

E "Ladrões de cinema" (1977), de Fernando Coni Campos, na quarta, 27 de novembro, às 20h.

Além disso, no MAM, "Ganga Bruta" (1933), na quinta, 28 de novembro, às 20h.

quinta-feira, novembro 21, 2013

links

Voltando as poucos. Alguns links:

- Alguns ótimos textos na nova edição da "Cinética". Recomendo muitíssimo os de Paulo Santos Lima, Francis Vogner dos Reis e Fábio Andrade.

- Ainda na "Cinética", tem Jean-Claude Brisseau por Luiz Soares Júnior, e uma entrevista incrível de Juliano Gomes com Claire Denis

- Saymon Nascimento em dois posts inspirados. Um sobre "Breaking Bad" e outro sobre "Bling Ring".

- Nova e incrível edição do La Furia Umana

- Uma entrevista com Philippe Garrel na "Lumière".

- Brad Stevens sobre Jess Franco

- Uma conversa entre João Pedro Rodrigues e Alain Guiraudie no CinemaScope

- Vocês já viram a nova edição da "Lola", né?

- Screening the Past em nova edição sob a batuta de Adrian Martin

- Adrian Martin sobre Leos Carax e Marlon Brando

- Nesta página, é possível ver links para alguns dos trabalhos de Tom Gunning.

- Uma entrevista com Chantal Akerman:



- USA GO HOME no Youtube com legendas em inglês:



- E pra quem ainda não viu:



sexta-feira, novembro 08, 2013

saraceni na caixa

Outra mostra imperdível, Paulo Cezar Saraceni, na Caixa. Vejam a programação abaixo:

8 de novembro de 2013 (sexta-feira)

15h – “Capitu”, de Paulo Cezar Saraceni (1968, 105’, 35 mm, 10 anos, ficção)

17h – “A casa Assassinada”, de Paulo Cezar Saraceni (1971, 103’, 35mm, 16 anos, ficção)

19h – “O Viajante”, de Paulo Cezar Saraceni (1998, 117’, 35mm, 18 anos, ficção)

9 de novembro de 2013 (sábado)

15h – Sessão de Curtas: 1. “Casimiro de Abreu”, de Paulo Cezar Saraceni (1972-1976, 10’, DVD, Livre, documentário) + 2. “Laço de Fita”, de Paulo Cezar Saraceni (1976, 30’, 35mm, Livre, documentário) + 3. “Cinema: como é e como se faz”, de Paulo Cezar Saraceni (1974, 15’, 35mm, Livre, documentário) + 4. “Quadro a Quadro Newton Cavalcanti”, de Paulo Cezar Saraceni (1984, 10’, 35mm, Livre, documentário)

17h – “O Gerente”, de Paulo Cezar Saraceni (2011, 81’, DVD, 10 anos, ficção,)

19h – Debate com o elenco do filme “O Gerente”

10 de novembro de 2013 (domingo)

15h – “Banda de Ipanema”, de Paulo Cezar Saraceni (2002, 86’, 35mm, 12 anos, documentário)

17h – “Natal da Portela”, de Paulo Cezar Saraceni (1988, 85’, 35mm, 14 anos, ficção)

19h – “Amor, Carnaval e Sonhos”, de Paulo Cezar Saraceni (1972, 80’, DVD, 14 anos, ficção)

12 de novembro de 2013 (terça-feira)

14h – “Bahia de Todos os Sambas”, de Paulo Cezar Saraceni (1996, 102’, 35mm, Livre, documentário)

16h – “Memórias de Garrincha”, de Paulo Cezar Saraceni (2001, 100’, DVD, Livre, documentário)

18h – “Anchieta, José do Brasil”, de Paulo Cezar Saraceni (1977, 150’, DVD, 16 anos, ficção)

13 de novembro de 2013 (quarta-feira)

15h – “O Desafio”, de Paulo Cezar Saraceni (1964, 100’, 35mm, 18 anos, ficção)

17h – “Ao Sul do Meu Corpo”, de Paulo Cezar Saraceni (1981, 102’, 16mm, 18 anos, ficção)

19h – “Integração Racial”, de Paulo Cezar Saraceni (1964, 40’, 16mm, Livre, documentário)

14 de Novembro de 2013 (quinta-feira)

15h – “O Gerente”, de Paulo Cezar Saraceni (2011, 81’, DVD, 10 anos, ficção)

17h – “Capitu”, de Paulo Cezar Saraceni (1968, 105’, 35 mm, 10 anos, ficção)

19h – Palestra sobre “O Cinema Novo”. Palestrante: Hernani Heffner. Mediador: João Paulo Saraceni

15 de novembro de 2013 (sexta-feira)

15h– “Porto das Caixas”, de Paulo Cezar Saraceni (1962, 75’, 35mm, 14 anos, ficção).

17h – “A casa Assassinada”, de Paulo Cezar Saraceni (1971, 103’, 35mm, 16 anos, ficção)

19h – “O Viajante”, de Paulo Cezar Saraceni (1998, 117’, 35mm, 18 Anos, ficção)

16 de novembro de 2013 (sábado)

15h – “Natal da Portela”, de Paulo Cezar Saraceni (1988, 85’, 35mm, 14 anos, ficção)

17h – “O Gerente”, de Paulo Cezar Saraceni (2011, 81’, DVD, 10 anos, ficção)

19h – “Bahia de Todos os Sambas”, de Paulo Cezar Saraceni (1996, 102’, 35mm, Livre, documentário)

17 de novembro de 2013 (domingo)

14h – Sessão de Curtas: 1. “Casimiro de Abreu”, de Paulo Cezar Saraceni (1972-1976, 10’, DVD, Livre, documentário) + 2. “Laço de Fita”, de Paulo Cezar Saraceni (1976, 30’, 35mm, Livre, documentário) + 3. “Cinema: como é e como se faz”, de Paulo Cezar Saraceni (1974, 15’, 35mm, Livre, documentário) + 4. “Quadro a Quadro Newton Cavalcanti”, de Paulo Cezar Saraceni (1984, 10’, 35mm, Livre, documentário)

16h – “Anchieta, José do Brasil”, de Paulo Cezar Saraceni (1977, 150’, DVD, 16 anos, ficção)

19h – “O Gerente”, de Paulo Cezar Saraceni (2011, 81’, DVD, 10 anos, ficção)

terça-feira, novembro 05, 2013

rithy panh

Última semana do Rithy Panh no CCBB:

06/11 – quarta           
15h30 – Bophana, uma tragédia cambojana (1996) – 59’
17h – Duch, o mestre das forjas do inferno (2011) – 110’
19h15 – Debate: Anita Leandro e Carla Maia e Luís Felipe Flores

07/11 – quinta             
15h30 – Tio Rithy (2009) – 94’
17h30 – A terra das almas errantes (2000) – 106’
20h – Papel não embrulha brasas (2007) – 90’

08/11 – sexta
15h30 – Cinco vidas (2010) – 93’
17h30 – Uma barragem contra o Pacífico (2008) – 115’
20h – Os artistas do teatro queimado (2005) – 82’

09/11 – sábado
16h – Por onde eu vou (2012) – 55’
17h30 – O khmer vermelho e o pacifista (2011) – 88’
19h30 – Uma noite após a guerra (1998) – 108’

10/11 – domingo
16h – A terra das almas errantes (2000) – 106’
18h – Casamento vermelho (2013) – 58’
19h15 – A imagem que falta (2013) – 95’

11/11 – segunda
16h – O último refúgio (2013) – 55’
17h30 – O sono de ouro (2011) – 96’
19h30 – Condenados à esperança (1994) – 125’

sexta-feira, outubro 25, 2013

garrel no mam

Sessão dupla de Philippe Garrel no MAM no sábado:

16h – Não ouço mais a guitarra (Je entends plus la guitarre, 1991) 

18h – O nascimento do amor (Le naissance de l’amour, 1993) 

quinta-feira, outubro 17, 2013

segunda-feira, setembro 30, 2013

cinemaison

Em pleno festival, uma sessão dupla imperdível no Cinemaison desta segunda:

Às 18h, Os Excluídos do Bom Deus, de Jean-Claude Brisseau
Às 20h, Coisas Secretas, de Jean-Claude Brisseau

segunda-feira, setembro 23, 2013

festival do rio

O Festival do Rio se aproxima. Embora sinta falta de algumas coisas (os últimos de
João Pedro Rodrigues, Miguel Gomes, Jia Zhangke, Tsai Ming-Liang, etc.), a seleção é uma das melhores dos últimos anos. Fiz uma lista enorme abaixo.  Em itálico os que já têm data de estréia por aqui. Estes três abaixo eu já vi e recomendo muitíssimo:

Todos os outros, de Maren Ade
A garota de lugar nenhum, de Jean-Claude Brisseau
Vic + Flo viram um urso, de Dnis Côtés

Os que mais quero ver:

Um estranho no lago, de Alain Guiraudie
Gravidade, de Alfonso Cuaron
Heli, de Amat Escalante
La paz, de Santiago Loza
Os três filmes (Downhill, O ringue, O inquilino) de Alfred Hitchcock
Dr. Mabuse 1 e 2, de Fritz Lang
Os donos, de Augustin Toscano e Ezequiel Radusky
A princesa das ostras, de Ernst Lubitsch
Viver na RFA, de Harun Farocki
Salvo, de Fabio Grassadonia e Antonio Piazza
Milius, de Joey Figueroa e Zak Knutson
Seduzido e abandonado – Os bastidores de Cannes, de James Toback
Shampoo, de Hal Ashby
Wrong Cops, de Quentin Dupieux
A dança da realidade, de Alejandro Jodorowsky
A filha de ninguém, de Hong Sang-Soo
Abuso de Vulnerável, de Catherine Breillat
Apenas Deus perdoa, de Nicolas Winding Refn
Até que a loucura nos separe, de Wang Bing
Backwater, de Shinji Aoyama
Bastardos, de Claire Denis
Blind Detective, de Johnnie To
Computer Chess, de Andrew Bujalski
Clear History, de Gregg Mottola
Joe, de David Gordon Green
Quando a noite cai em Bucareste ou Metabolismo, de Corneliu Porumboiu
Manuscritos não queimam, de Mohammad Rasoulof
Outrage Beyond, de Takeshi Kitano
Real, de Kyoshi Kurosawa
Sacro Gra, de Gianfrancesco Rosi
Sozinha, de Wang Bing
Spring Breakers, de Harmony Korine
Night moves, de Kelly Reichardt
Nós somos melhores, de Lukas Moodysson
O imigrante, de James Gray
Our Sunhi, de Hong Sang-Soo
Only lovers left alive, de Jim Jarmusch
Terra prometida, de Gus Van Sant
The canyons, de Paul Schrader
Ilusões satânicas, de Paul Schrader
Mishima, de Paul Schrader
Vivendo na corda bamba, de Paul Schrader
Tip top, de Serge Bozon
O rei da fuga, de de Alain Guiraudie
A imagem que falta, de Rithy Panh
A estação de rádio, de Nicolas Philibert
Em Berkeley, de Frederick Wiseman
O conhecido desconhecido: a era Donald Rumsfeld, de Errol Morris
O último dos injustos, de Claude Lanzmann
Metallica: Through the Never 3-D, de Nimród Antal
Crystal Fairy e o cactus mágico, de Sebastián Silva

Os que quero ver:

A grande beleza, de Paolo Sorrentino
Behind the candelabra, de Steven Soderbergh
Fading Gigolo, de John Turturro
Jovem e bela, de François Ozon
Michael Kohlhaas, de Arnauld des Pallieres
Nebraska, de Alexander Payne
Um time show de bola, de Juan José Campanella
Yella, de Christian Petzold
O verão da minha vida, de Nat Faxon e Jim Rash
Fruitvale Station, de Ryan Coogler
Invadindo Bergman, de Jane Magnusson e Hynek Pallas
A morte lhe cai bem, de Robert Zemeckis
The National: Mistaken for Strangers, de Tom Berninger
Feio, de Anurag Kashyap
Eu e você, de Bernardo Bertolucci
Suspensão da realidade, de Mike Figgs
The zero theorem, de Terry Gillian
Um castelo na Itália, de Valeria Bruni Tedeschi
Os corredores da morte, de Werner Herzog
Marcel Ophuls, um viajante, de Marcel Ophuls
Os fortes não descansam, de Alain Guiraudie

Os que tenho curiosidade:

Blue Jasmine, de Woody Allen
Como não perder essa mulher, de Joseph Gordon-Levitt
O mordomo da casa branca, de Lee Daniels
Obsessão, de Lee Daniels
A cidade abaixo, de Christoph Hochhauser
Dreileben: Algo melhor do que a morte, de Christian Petzold
A segurança interna, de Christian Petzold
As delicias da tarde, de Jill Soloway
O gigante egoísta, de Clio Barnard
Minha doce Pepper Land, de Hiner Saleem
Sophie Calle, sem título, de Victoria Clay Mendoza
Sarah prefere correr, de Chloé Robichaud
Contadores de Imagens, de Noelle Deschamps
Michael Haneke – Profissão: Diretor, de Yves Montmayeur
Os impostores do Hip Hop, de Jeanie Finlay
Sapi, de Brilhante Mendoza
Vosso ventre, de Brilhante Mendoza
Walesa, de Andrzej Wajda
O espírito de 45, de Ken Loach
Moebius, de Kim Ki-Duk




sexta-feira, setembro 20, 2013

cinemaison

Próxima segunda, uma noite imperdível no Cinemaison:

Às 18h, "O desprezo" (1963), de Jean-Luc Godard
Às 20, "A bela da tarde" (1967), de Luis Buñuel

terça-feira, setembro 17, 2013

the bling ring ***

É curiosa, porém compreensível, a decepção algo generalizada que marcou a recepção deste filme, tanto nos EUA quanto no Brasil. Esperava-se uma espécie de raio-x da sociedade contemporânea, seu consumismo, suas celebridades, seu cinismo, etc. Tudo isto está lá. Sofia Coppola, contudo, seria uma cineasta imparcial, sem um ponto de vista mais específico sobre a história. É bem verdade que Coppola se atém aos fatos cinematográficos, às cenas. Ela não simpatiza inteiramente com os personagens, mas tampouco se dispõe a julgá-los de maneira mais incisiva. O filme pode até mesmo parecer um pouco blasé, sobretudo, em seu final.

Quer dizer: muitas destas críticas não são absurdas, embora elas muitas vezes passem por cima da sensibilidade e do ritmo que Coppola imprime a este material. Coppola, como sempre, mostra-se muito mais interessada em delinear um certo estado. O estilo de “The Bling Ring” procura incorporá-lo. Um estilo que ágil, recheado de informações, marcado por colagens, que se contrapõe diretamente ao seu longa anterior. Acho que Kent Jones chegou ao nervo central não somente de “The Bling Ring”, mas do cinema mesmo de Sofia Coppola: seus filmes têm mais uma ambiência, em um sentido musical, do que uma trama. O filme me ganhou aos poucos. De repente, sinto-me seduzido e ao mesmo tempo absolutamente horrorizado. As luzes se ascendem e os sentimentos, ainda a serem conjugados, permanecem. Coppola sabe o que faz.  

sábado, setembro 14, 2013

daney

O filme "Serge Daney - Itinéraire d'un ciné-fils" (1992) com legendas em inglês:







quarta-feira, setembro 11, 2013

sem dor, sem ganho **

Eu não tenho lá muita paciência com o Michael Bay. Tratava-se, contudo, de uma comédia com Mark Wahlberg, e, sobretudo, Dwayne “The Rock Johnson”. Animei-me e fui ver “Sem dor, sem ganho”. Disse não ter muita paciência, mas tenho achado por demais preguiçoso insistir que os constantes deslocamentos temporais e espaciais que marcam os blockbusters americanos seja fruto de uma espécie de amnésia histórica ou de uma indefensável incompetência. Essa é a forma mais tradicional de criticar Bay: ele não saberia decupar, não teria noções de escala ou ritmo, e seus filmes se moveriam sem direção, graça ou sentido.

Eu gosto cada vez mais do termo cunhado por Steven Shaviro, “post-continuidade”, para designar um cinema em que a preocupação com certos efeitos imediatos triunfa sobre qualquer questão a respeito de uma continuidade mais ampla, seja no nível do plano-a-plano, seja no âmbito narrativo. Bay, por exemplo, não é nenhum pouco ingênuo. Para ele, a continuidade não parece mais ser preponderante para delinear a geografia de uma ação, ancorando-a claramente no tempo e no espaço. A sequência torna-se uma colagem de fragmentos irregulares de ângulos, explosões, lutas, perseguições, e movimentos violentamente acelerados. Não há nenhum sentido de continuidade espaço-temporal. O que importa é entregar uma série contínua de choques para o público.

Talvez a abordagem maximalista e impiedosa de Bay tenha menos a ver com a destruição ou a ignorância em relação a uma certa noção de cinema e mais com a ambição de esboçar um outro cinema. Bay está muito claramente interessado no calor do momento, imprime um tom “impressionista” que alimenta uma relação diversa com as noções de personagem, espaço e trama, e não está lá muito interessado nos valores clássicos da continuidade – embora, é preciso dizer, a continuidade ainda persiste em alguns momentos, sendo respeitada ocasionalmente e de forma oportunista.

“Sem dor, sem ganho” não curou minha impaciência, devo dizer. Mas é um filme de questões extremamente importantes. Lugo é um personagem que acredita ser antipatriótico “not go for it”. Que dizer: com esforço e perseverança suficientes devemos nos tornar “super-homens” e viver no luxo. O filme, por sua vez, bate várias vezes na tecla de que o que estamos vendo de fato aconteceu. Bay não julga exatamente seus personagens. “Sem dor, sem ganho” conspira a favor de seus protagonistas. O que não quer dizer que suas ações sejam legitimadas. Algo diferente se passa. O desconforto que algumas situações geram no espectador é logo em seguida diluído em nome de uma certa noção de prazer. Talvez haja cinismo nisso tudo, embora eu tenha minhas dúvidas. Certeza mesmo é a de que Bay é um dos cineastas mais representativos do tempo em que vivemos e do cinema de nossa época.

domingo, setembro 08, 2013

denis e assayas

Eu ainda não conhecia esses vídeos. Pelo que entendi, o Walker Art Cente, em Minneapolis, organiza algumas retrospectivas e convida críticos/teóricos para gravar entrevistas com cineastas. Ainda não pude ver todos, mas gostei bastante destes dois:

Olivier Assayas e Kent Jones:



Claire Denis e Eric Hynes:



sexta-feira, setembro 06, 2013

prova de amor ****

Gosto bastante deste filme. Já o vi algumas vezes. Gosto dos atores, sobretudo, Paul Schneider. Gosto dos diálogos: “Você já viu a natureza cometendo um erro”? Esta me parece uma das linhas mais sensacionais do cinema. Gosto da simbologia heraclitiana que o longa evoca. Gosto da fluência que o filme busca o tempo todo. O longa é também esta tentativa por uma representação sensualista, que muito apontou-se como sendo influência de Terrence Malick. Gosto da maneira como a relação entre eu, espectador, e o filme parece intermediada por afetos e sensações. Gosto como a separação do casal se dá sem culpas. Neste sentido, é uma aposta que o filme nos convida a fazer. Uma coisa bonita, parece-me.

Da última vez que vi “Prova de amor” (2002), esta semana, dei uma olhada nos extras do DVD. David Gordon Green, em entrevista, diz que tinha que fazer aquele filme o mais rápido possível, que era preciso fazê-lo como uma equipe jovem, que era imprescindível colocar-se à altura daquele mundo constituído em filme. É interessante ver ele falando desta urgência, algo que “Prova amor” dissemina desde o primeiro plano. Aliás, um plano em especial, o do cachorro aleijado, me fez lembrar do final de “Stroszek” (1976), de Herzog, quando uma galinha dança por alguns minutos. Tentamos agregar algum sentido ao que vemos. Mas é inútil esforçar-se para ser convincente. O mundo não é tão racional, nem irracional. É irracionável, nada mais do que isso. A razão constata os seus limites e nega a si mesma. Isso diz muito sobre os dois longas. Curioso. De repente, peguei-me pensando a letra de uma música de Jeff Buckley, “Lover, You Should've Come Over”:

I feel too young to hold on
I'm much too old to break free and run

Maybe I'm too young
To keep good love from going wrong

Tudo ver a ver. Escutem a música:

terça-feira, setembro 03, 2013

frances ha ***

Eu gostei deste filme. Talvez tenha gostado mais da crítica do Calil (abaixo) do que do filme propriamente dito... Não sei... “Frances Ha” é fofo como sua protagonista, e isto é ótimo. Eu, contudo, assistindo o filme como um brasileiro, carioca, às voltas com aluguéis altíssimos, com uma enorme desigualdade social, altos índices de criminalidade, com parcas oportunidades de trabalho, péssimos serviços e salários, não consigo deixar de ver um pouco de falsidade nas aventuras e desventuras de Frances. Talvez falsidade não seja a palavra certa. O que sinto é uma distância tão grande daquela realidade que, por vezes, me impede de empatizar com a personagem.


RICARDO CALIL
CRÍTICO DA FOLHA

É preciso estar de mal com a vida, ter o coração de pedra, ser ruim da cabeça ou doente do pé para resistir à cena de "Frances Ha" em que a protagonista sai correndo e dançando pelas ruas de Nova York ao som de "Modern Love", de David Bowie.

Não deixa de ser um golpe baixo (garota encantadora e desengonçada + clássico absoluto de Bowie).

Mas é um golpe baixo ansiosamente aguardado: aquele que vai libertar o cinema independente americano de anos de pretensão e cinismo para oferecer um momento de prazer fugaz, frugal.

"Frances Ha" é filho bastardo da primeira nouvelle vague (do Godard que disse que tudo de que se precisa para fazer um filme é uma arma e uma garota) com o mumblecore (o subgênero de baixo custo, diálogos naturalistas e personagens balbuciantes).

Não por acaso, "Frances Ha" tem na trilha músicas de Georges Delerue (o compositor "oficial" da nouvelle vague) e é escrito e protagonizado por Greta Gerwig, musa do mumblecore. Frances, sua personagem, se aproxima dos 30 anos assolada pela falta de perspectivas.

Ela é assistente em uma companhia de dança, mas não é boa o suficiente para virar bailarina.

Como uma moderna Cabíria (a esperançosa personagem de Giulietta Masina em "Noites de Cabíria", de Fellini), Frances enfrenta cada revés com otimismo incorrigível "" o mesmo que, diante de uma pequena vitória, a leva a dançar pelas ruas.

Com "Frances Ha", o diretor Noah Baumbach confirma o talento demonstrado em "A Lula e a Baleia" (2005) e se livra de certos maneirismos do passado.

De quebra, oferece um retrato preciso sobre aquela fase da vida em que não sabemos exatamente que rumo tomar, o que fazer da vida "" uma fase que, em alguns casos, teima em durar para sempre.