segunda-feira, dezembro 29, 2014

manakamana ****

Gostei bastante deste filme. Um documentário especulativo? Não sei se gosto muito desta expressão, mas ela me ajuda a descrever a sessão de ver este longa de Stephanie Spray e Pacho Velez. "Manakamana" é certamente uma espécie de documento: um paÌs distante, uma viajem de bonde por sobre a montanha, visitantes e um templo. E a palavra documento deve ser compreendida aqui em uma acepção física mesmo. Ao longo das filmagens, Spray e Velez descobriram algo curioso: um rolo completo de 16 mm correspondia ao tempo que levava um bonde para subir e descer da montanha. Quer dizer: sentimos a realidade física, integral deste documento, desta viajem, daquelas pessoas. Estas sabem que estão sendo filmadas. Parece que foram escolhidas a dedo. A câmera negocia o filme com elas. Isto também é algo palpável, da hesitação inicial ao paulatino desprendimento. A câmera, sempre muito presente, interroga, desafia, e os personagens reagem, reagem, reagem. Eles dizem sim.  E dizer sim para uma câmera é dizer sim para a eternização de um momento. Ao olhar sob o prima da eternidade estes pequenos momentos, algo nos parece estar sendo revelado. Algo que se revela e se esconde. Daí o especulativo.

domingo, novembro 30, 2014

garota exemplar **

A violência que pontua "Garota exemplar" não diz respeito apenas aos personagens, mas está mais para um reflexo de um certo sadomasoquismo literal e espiritual inerente ao casamento. Grouxo Marx dizia: "o casamento é uma instituição maravilhosa, mas quem é que deseja morar em uma instituição?" A frase do mestre soa como uma espécie de resumo cômico do filme. Mas não estamos diante de uma comédia. Estamos? "Garota exemplar" é uma espécie de piada de mau gosto de aspirações ambiciosas. Não sei, contudo, se é sobre isso que quero realmente falar agora. Voltemos um pouco:

Ao menos desde "Zodíaco" (2007), os filmes de David Fincher se esforçam para expressar como é estar vivo em um determinado espaço-tempo. Embora sempre tenham um protagonista, muitas pessoas vão e voltam na narrativa dos filmes. Elas trazem detalhes, motivações, pequenas histórias. Elas ajudam a compor um contexto. O requinte na utilização da luz e no esquadrinhamento do espaço, o nível de envolvimento emocional com os atores, a precisão narrativa e uma certa aura melancólica, todas características marcantes de Fincher, também passaram a operar segundo este objetivo. Quer dizer: não é apenas uma questão de direção de arte, de objetos de cena ou vestuário e música, mas os gestos, posturas, símbolos, valores e de como tudo isso é filtrado pela experiência individual de alguns personagens.

"Garota exemplar" é muito bem sucedido neste sentido. Vivemos em uma sociedade da informação, da imagem, do espetáculo. Vivemos em um capitalismo estético e biopolítico. E tudo isto está lá. "Garota exemplar" funciona como um exemplo extremo e grotesco das  relações íntimas entre o cotidiano, a aparência, o artifício e a efemeridade que marcam nosso ambiente contemporâneo. O filme revela justamente o caráter promíscuo e quase pornográfico das encenações que fazemos de nós mesmos. Se antes o cotidiano se via circunscrito ao espaço privado e seus diversos níveis de vida interior, hoje voltamos nossas existências para o espaço aberto dos meios de comunicação e seus diversos níveis de vida exterior (tela, imagem, interfaces, etc.). Se a verdade do sujeito era de natureza recôndita, opaca, invisível, hoje, cada vez mais, a autenticidade de  alguém encontra-se vinculada à dimensão visível e acessível ao olhar do outro. A lógica que associa a aparência e a superficialidade aos domínios do engodo, do falso, da mentira, da manipulação, faz cada vez menos sentido.

Esse primado da aparência, contudo, ficou comigo. Talvez ele não diga respeito somente a este filme. O que ele pode nos dizer sobre o cinema de David Fincher? Essa pergunta ainda me toma um certo tempo. Ainda não sei bem o que quero dizer com isso. Mas a minha impressão é a de que Fincher é uma espécie de colonizador de exploração (e não de povoamento, digamos). Ele explora (em um mau sentido, na base da violência) todos os elementos à sua disposição em nome de alguma coisa. E não há nada além desta exploração. Enfim...

quinta-feira, novembro 27, 2014

debi e lóide 2 ***

Era de se esperar. Mas não teve jeito. Fiquei um pouco chateado com a críticas que saíram a respeito do mais novo filme dos irmãos Farrelly. Vejam duas aí abaixo, uma escrita por Alexandre Agabiti Fernandez para a "Folha" e a outra assinada por Mario Abbade para "O Globo". O primeiro jamais gostaria do filme. O segunda em hipótese alguma deixaria de gostar dele. Nenhum deles faz jus ao que vi.

Alexandre diz que o que mais o incomoda é a fixação por matéria fecal e flatulência, que "as piadas envolvendo cocô e puns não aborrecem pelo mau gosto que, em si, podem resultar em graça, mas pela infantilidade: só divertem quem ainda não superou a fase anal, um dos estágios do desenvolvimento psicossexual da criança". Sério: isso aí é de uma ignorância... Que dizer então que quem ri de um pum... Mario, por sua vez, diz que "o humor pode ser irônico, refinado, inteligente, mas também anárquico e sem limites" e que os irmãos são um exemplo do último grupo. Em primeiro lugar, porque o "mas"? Em segundo, não seriam os Farrelly irônicos, refinados e inteligentes? Mario ainda arrisca uma afirmação que em hipótese alguma ele pode realmente comprovar: "Debi e Lóide 2" seria uma tentativa de repetir os sucessos de bilheteria do início da carreira. Tanto Alexandre quanto Mario dizem que a trama repete a receita do primeiro. Onde? Para Alexandre a trama ainda seria um mero pretexto? Como assim?

"Debi e Lóide 2" é uma comédia radical. A estupidez dos personagens é levada a um patamar nunca antes alcançado. É uma coisa realmente virtuosa. E não uso o termo de maneira inocente. Ao contrário: a estupidez se transforma em uma virtude. Ela é a maior qualidade dos personagens. É o que os tornam imunes a arrependimentos, que os faz se surpreenderem continuadamente. É o que os levam a dizer sim para o chamado do mundo.  Quer dizer: não se trata apenas de uma comédia distante do "politicamente correto", tampouco de baixo nível ou meramente escatológica. "Debi e Lóide 2" é um filme subversivo, desfila uma riqueza impressionante de detalhes, um cinema narrativamente muito bem construído, e uma visão de mundo mais crítica e aberta.


 Crítica: Vinte anos depois, Debi & Lóide voltam mais ridículos e infantis
ALEXANDRE AGABITI FERNANDEZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Duas décadas depois do estrondoso sucesso de público de "Debi & Lóide - Dois Idiotas em Apuros", Jim Carrey e Jeff Daniels voltam como a dupla de palermas mais carismática dos últimos tempos.

Novamente sob a direção dos irmãos Bobby e Peter Farrelly, os dois enchem a tela com uma enxurrada de gags que certamente deliciará o espectador que se diverte com a estupidez.

O novo filme é uma farsa baseada na mesma receita do anterior —a humilhação de alguém feita com candura—, em que a trama é mero pretexto para os esquetes.

A diferença é que os protagonistas estão vinte anos mais velhos, o que os torna um pouco mais ridículos.

Debi (Daniels) e Lóide (Carrey) se reúnem com a missão de encontrar Penny (Rachel Melvin), a suposta filha de Debi cuja existência ele acaba de descobrir. A busca os leva a um longo périplo rodoviário, como no primeiro filme, palco de boa parte da baderna armada pela dupla.

O ponto culminante da viagem acontece durante um simpósio que reúne cientistas e inventores.

FASE ANAL

O humor físico da dupla tem seus altos e baixos —algumas gags, como a da moita, são repetidas além do razoável—, mas o que mais incomoda é a fixação por matéria fecal e flatulência, outra de suas marcas registradas.

As piadas envolvendo cocô e puns não aborrecem pelo mau gosto que, em si, podem resultar em graça, mas pela infantilidade: só divertem quem ainda não superou a fase anal, um dos estágios do desenvolvimento psicossexual da criança.

Moral da história: na categoria do humor ingênuo e histriônico, cheio de pancadaria e caretas, clássicos como "Os Três Patetas" e "O Gordo e o Magro" continuam insuperáveis.


Mario Abbade
o globo | 13:36h | 12.nov.2014

Para rir do início ao fim
 Um dos gêneros mais complicados é a comédia — não à toa, cineastas e atores vivem apregoando que fazer rir é bem mais difícil que fazer chorar. E, nesse universo complexo, há enormes diferenças. O humor pode ser irônico, refinado, inteligente, mas também anárquico e sem limites. Os irmãos Bobby e Peter Farrelly são um exemplo do último grupo, com filmes que encarnam a antítese do hoje tão falado politicamente correto. Eles se firmaram como reis do estilo nos anos 90, com longas como “Kingpin — Estes loucos reis do boliche”, “Quem vai ficar com Mary” e “Eu, eu mesmo e Irene”. O começo veio justamente com “Debi & Lóide: dois idiotas em apuros” (1994), que virou cult com produtos que vão de action figures e smokings coloridos até uma capa para transformar o carro no “mutt cutts”, espécie de batmóvel da dupla, que lembra um cachorromóvel. Mas os irmãos Farrelly não vêm conseguindo o mesmo sucesso: suas produções se pagam, mas não chegam a campeãs de bilheteria. “Debi & Lóide 2” é uma tentativa de recuperar a coroa.

A trama acontece 20 anos após o fim do primeiro filme. E reúne novamente Jeff Daniels (hoje ligado a produções mais artísticas) e Jim Carrey (que não vem dando sorte no box-office), que embarcam em mais uma road trip. “Dumb and Dumber to” (no original) tem o que apreciador do estilo espera: nonsense e ingenuidade que beira a estupidez. Isso embalado em situações hilárias, que parecem agressivas em certos momentos, mas fazem parte da maneira inocente como os personagens veem o mundo. E conseguir manejar isso, extraindo humor sem ser ofensivo, requer a tal habilidade que muitos só enxergam nas comédias sofisticadas.

O filme só não é perfeito em sua proposta por ter optado por uma história muito parecida com a primeira. Mas, em time que está ganhando, não se mexe — com direito a cena pós-créditos que corrobora essa intenção.

sábado, novembro 22, 2014

links

A nova edição da "Film Philosophy", focada na obra de Stanley Cavelle, está bem bacana

A nova edição da "photogénie"

Um David Bordwell inspirado

Um crítica que faz justiça ao filmado "Debi e Loide 2" - aliás, voltarei a este assunto em breve

A Film Comment lançou em seu site uma antologia crítica sobre Godard. Tudo o que saiu na revista sobre o cineasta! Dá uns 12 reais!

Dá pra fazer o mesmo com Fassbinder. Por 2,50! Porra!

Uma conversa entre Kent Jones e Jonathan Rosenbaum sobre Robert Bresson e Jean-Luc Godard

Jonathan Rosenbaum sobre a obra-prima de Jean Eustache

O blog de Christoph Huber

Um projeto de ensaios audiovisuais sobre "Out 1", de Jacques Rivette

Belo texto de James Quandt sobre o mestre Jacques Tati

E por fim:

segunda-feira, novembro 17, 2014

interstellar *

Estava aqui pensando na geração incrível de pensadores franceses que varreu o mundo em meados dos anos 60. Eles esboçariam interpretações sobre os acontecimentos de maio de 68. Sugeriam que maio de 68 tinha um alcance filosófico ligado àquilo que eles mesmos tinham como objeto principal de seus respectivos pensamentos. Eu me refiro a gente como Michel Foucault, Louis Althusser, Jacques Derrida, François Lyotard, Pierre Bourdieu e Gilles Deleuze. São autores absolutamente diferentes entre si, claro. Eles, contudo, alimentavam algumas afinidades: um certo culto pelo paradoxo, uma reivindicação insistente da complexidade. A exigência de um discurso regido pela exigência da nãocontradição é nada mais do que uma enorme ingenuidade. Nós, os leitores, compreendemos que estes autores queriam dizer coisas novas e que coisas novas precisavam de novas maneiras para dizê-las.

Estava pensando nisso tudo porque vi "Interstellar". Porque o tempo passa e complexidade virou signo de grandeza e inteligência. Vamos lá: um clichê. Christopher Nolan faz filmes inflados, que falam pelos cotovelos, vomitando termos técnicos pra cá e pra lá, fragmentos e mais fragmentos de supostas e complicadas teorias. Gravidade. Relatividade. Tempo. Somos mesmo muito estúpidos, né não? Vez ou outra, uma imagem de síntese: um quadro abarrotado de equações! Claro! E, no fim, vejam como na verdade é tudo muito simples, era o amor, sempre o amor. Ah, vá pra puta que pariu! É uma coisa absolutamente vazia. Nolan não quer confundir ninguém. Sua "complexidade" é uma imagem, uma marca. Nada mais. 

O meu incômodo só aumenta quando vejo o cineasta falando mal dos filmes da Marvel. Não que eu adore os filmes da Marvel, mas eles são ao menos mais francos e honestos. Não se vedem como algo acima do cinemão. E Nolan acha que faz o que? 

terça-feira, novembro 11, 2014

godard arquiteto

O mestre John Ford disse certa vez que um cineasta não era um autor, que estaria mais para um arquiteto. Eu, contudo, confesso, nunca havia pensado muito sobre o assunto. Quer dizer, achava esse comentário algo curioso, mas essa curiosidade não me levava a nenhum lugar. Pois bem. Outro dia estava revendo algumas cenas de "Filme Socialismo" (2010), de Jean-Luc Godard, e, de repente, peguei-me pensando em ruínas. Devo dizer: esta é uma associação (Godard e suas ruínas) já levantada em diversos momentos. Afinal, Godard é o cineasta da construção-descontrução-explosão. Ok. Eu, no entanto, ainda não tinha pensando em "Filme Socialismo" como uma estrutura, digamos, fantasma. Talvez fantasma não seja o termo mais apropriado. Godard arquiteta uma planta em que diversas portas são deliberadamente apagadas. Algumas sequer existiram. Estas ausências têm vida. Elas crescem, crescem, crescem. É interessante: as pessoas em geral não tentam descrever os filmes mais novos de Godard - isso, claro, quando não os rechaçam veementemente. Costumam explicá-los, interpretá-los, decodificá-los. Descrevê-los talvez seja mais proveitoso. Porque não? E aí, embora este post esteja longe de cumprir este desafio, arquitetura e ruínas serão noções em tanto.

sábado, novembro 08, 2014

non ou a vã glória de mandar *****

Ainda não tinha visto este filme. Sem dúvida: é um dos melhores do Manoel de Oliveira. A primeira longa sequencia é uma coisa antológica. Uma árvore em contra-plongée balança ao som de uma música sincopada e melancólica. A câmera a circunda e pouco depois se instala em um veículo em movimento. Um grupo de soldados portugueses viajam em direção a alguma ex-colônia africana em guerra. A câmera encara alguns deles, entretidos em devaneios e na atenção ao que passa ao redor. Um certo desfile de fisionomias se descortina aos nossos olhos. O contracampo não dá às caras. Talvez seja mesmo absolutamente desnecessário. Talvez sejamos nós o contracampo. Os soldados conversam sobre Portugal. O Alferes (interpretado por Luis Miguel Cintra), líder do grupo e professor, descreve episódios marcantes da história do país. Portugal revela-se como uma espécie de promessa jamais cumprida. Diversos momentos históricos são encenados, desde o momento da formação nacional até o limiar da Revolução dos Cravos, bem como alguns mitos. É bem curioso: o caminhão em movimento, os relatos de Alferes e a imaginação dos soldados conjugam-se e avançam por uma história feita de fatos, memórias e fábulas. Portugal é como um sonho. Um sonho frustrado. Um sonho ainda sonhado. E uma frustração para sempre incontornável.

Vi o filme a noite, depois que minha filha se deixou levar pelo sono. Ao final, "Non ou a vã glória de mandar" me levou às ruas, a caminhar pelas ruas, sem nenhum objetivo específico, apenas o impulso incontrolável de atender ao convite do mundo lá fora. Era umas 2h da manhã. Um novo dia se já se fazia sentir no horizonte.



sábado, novembro 01, 2014

retrospectiva globo repórter no canal brasil!

O Canal Brasil exibe a partir do dia 5 de novembro sete ótimos documentários produzidos para os anos seminais do Globo Repórter:

GLOBO REPÓRTER: “SEMANA DE ARTE MODERNA” (1971) (51’)
Horário: quarta-feira, 5/11, às 19h
Horário alternativo: sábado, 8/11, às 9h30
Sinopse: O diretor Geraldo Sarno faz um paralelo entre o Movimento de 1922 e a vanguarda artística do fim dos anos 1960 e início dos 1970. A antropofagia modernista é trazida à tona neste filme através da figura do tropicalismo e da produção cultural daquela geração. O documentário analisa a famosa Semana de Arte Moderna por meio de entrevistas com remanescentes da exposição, entre eles Tarsila do Amaral, Di Cavalcanti e Menotti del Picchia, além de artistas de vanguarda da década de 70, como José Celso Martinez, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Wally Salomão. Zuenir Ventura assina o argumento e é o autor dos textos narrados por Cid Moreira no registro.

GLOBO REPÓRTER: “ARQUITETURA, A TRANSFORMAÇÃO DO ESPAÇO” (1972) (56’)
Horário: quarta-feira, 12/11, às 19h
Horário alternativo: sábado, 15/11, às 9h30
Sinopse: Primeiro documentário de Walter Lima Jr. e seu primeiro trabalho para a televisão. Rodado em 16mm, o filme tem fotografia de José Ventura. Destaque para as imagens de Brasília que, montadas com uma trilha sonora de suspense e caos, criam uma atmosfera sombria e crítica sobre aquele espaço, em um clima de mistério e dúvida em torno dos palácios, da catedral e dos eixos sobre os quais foi construída a cidade. "Desenvolvimento", "progresso" e "transformação", nas mãos do diretor, fogem ao tom das reportagens institucionais da época.

GLOBO REPÓRTER: “SEIS DIAS DE OURICURI” (1976) (41’)
Horário: quarta, 19/11, às 19h
Horário alternativo: sábado, 22/11, às 9h30
Sinopse: Dirigido por Eduardo Coutinho, o documentário mostra a situação de seca e miséria na qual viviam os moradores de Ouricuri, localizada no sertão do Araripe, em Pernambuco. O diretor ouviu os flagelados que esperavam os mantimentos atrasados. As imagens de Coutinho provam que não importa o nome dado ao fenômeno quando famílias inteiras passam fome e perdem seus empregos. Diante da câmera, o povo mostra-se cada vez mais revoltado com o Governo Federal. O longa-metragem capta imagens e depoimentos reveladores de um Brasil não tão “grande” quanto o propagandeado pelo regime militar, ainda vigente à época da produção.

GLOBO REPÓRTER: “RETRATO DE CLASSE” (1977) (38’)
Horário: quarta-feira, 26/11, às 19h
Horário alternativo: sábado, 29/11, às 9h30
Sinopse: O filme dirigido por Gregório Bacic constrói uma divertida crônica da classe média paulistana nos anos 1970, a partir de uma reunião de turma do primário, 20 anos depois. O documentário apresenta uma clássica foto numa escola primária: a mestra, ao centro, cercada de alunos. Em off, a voz da professora relembra os estudantes e projeta suas expectativas sobre o futuro de cada um. Todos falam de sua visão de mundo e do cotidiano, muito distantes dos projetos imaginados pela professora.

GLOBO REPÓRTER: “TEODORICO, O IMPERADOR DO SERTÃO” (1978) (49’)
Horário: quarta-feira, dia 3/12, às 19h
Horário alternativo: sábado, dia 6/12, às 9h30
Sinopse: Considerado o primeiro clássico da filmografia de Eduardo Coutinho, o documentário constrói o real através da fala do coronel Teodorico Bezerra. O diretor expõe, sem maniqueísmo, a visão do representante da aristocracia rural do Nordeste. As próprias palavras de Teodorico o definem como “autoritário e dono de almas, dominador da política local, manipulador de verbas públicas em causa própria, metódico e centrado”. Acompanhando o percurso do coronel, a câmera de Dib Lutfi registra suas conversas com trabalhadores da fazenda no sertão nordestino, onde ficam evidentes as relações de poder.

GLOBO REPÓRTER: “WILSINHO GALILÉIA” (1978) (63’)
Horário: quarta-feira, dia 10/12, às 19h
Horário alternativo: sábado, dia 13/12, às 9h30
Sinopse: Dirigido pelo cineasta João Batista de Andrade, o filme foi vetado pela censura em vigor na época, já que a tragédia do garoto marginal serviu para revelar as estruturas de exclusão da sociedade brasileira. O registro reconstitui a trajetória de Wilson Paulino da Silva – o Wilsinho Galiléia, criado na favela de mesmo nome, uma das maiores de São Paulo. Wilsinho tinha 15 anos quando entrou para o crime. Em apenas três anos (o jovem morreu aos 18), tinha 20 assassinatos e quase 500 assaltos na ficha criminal.

GLOBO REPÓRTER: “EXU, UMA TRAGÉDIA SERTANEJA” (1979) (39’)
Horário: quarta-feira, dia 17/12, 19h
Horário alternativo: sábado, dia 20/12, às 9h30
Sinopse: Eduardo Coutinho optou pelo Nordeste para falar dos problemas do país, bastante esquecido pela modernização conservadora dos militares. O diretor enriquece seu método de documentar, deixando os entrevistados contarem suas histórias e diminuindo cada vez mais a distância entre realizador e os “personagens da vida real”. O filme trata da rivalidade entre as famílias Alencar e Sampaio em Exu, cidade do interior de Pernambuco, e dos inúmeros assassinatos dessa divergência. Outra característica do cineasta também é aqui firmada: a voz do entrevistador sempre aparece, evidenciando a existência de uma equipe intermediando a realidade.

quinta-feira, outubro 30, 2014

era uma vez em nova york ****

James Gray é um cineasta que valoriza a cena, que acredita na necessidade do drama. Isto, contudo, não diz respeito exatamente à possibilidade de se contar histórias as mais variadas, mas à oportunidade de se gerar uma experiência mais passional. "Era uma vez em Nova York", como seus antecessores, nos demanda um tipo diverso de adesão. Uma adesão irrestrita e atenta. Gray é de uma objetividade, digamos, generosa. Quer dizer: ele está sempre muito perto, porém sempre reservando uma certa distância. Os sentimentos são grandiloquentes, do tamanho do mundo, embora tão absolutamente concretos e por isso incertos e difusos, incapazes de serem contidos em um verbete de dicionário, em um nome frio, sem vida, impessoal.

Ewa, Bruno e Orlando são maneiras de olhar, de se mover, de sentar, de se vestir, de falar. Eles são um combinado de comportamento, ritmo e atmosfera. São universos. Universos que se chocam, inevitavelmente. Ewa e Bruno dependem um do outro. Uma dependência que destruirá ambos. É como se necessitassem um do outro pelas razões erradas.
Orlando também cairá. Vemos eles caindo. O filme abraça essa dor sem justificá-la ou julgá-la, sem tampouco eximir seus personagens de culpa. O que espanta, vejam só, é afirmação ao fim de que ninguém é melhor do que ninguém, que todos nós merecemos ser amados e respeitados. Todos nós temos direito a uma segunda chance, ao perdão e à redenção. Em uma frase: Ewa, Bruno e Orlando são humanos. Isso é bonito. Isso é trágico. É, sobretudo, um fenômeno solitário.

Há uma pedagogia nesse cinema. O filme se oferece não como apreciação ou contemplação, tampouco como um julgamento do mundo, mas como um processo dinâmico de experimentação de um mundo. Uma experiência irredutível à generalização. Uma experiência que, justamente por situar-se além de nossas possibilidades, nos força a pensar, a alargar nossas faculdades sensíveis, a nos tornarmos mais tolerantes.

domingo, outubro 26, 2014

cavalo dinheiro ****

Fontainhas está no chão. Foi demolida. Ela, contudo, persiste, insiste. Fontainhas habita o imaginário de Ventura. Ela o constitui. Ela o põe em movimento. Não existe mais como bairro ou paisagem. Mas é como uma espécie de mito fundador daquela realidade constituída em filme - aliás, como bem reforçou o Filipe Furtado lá na "Cinética", jamais a herança de John Ford esteve tão presente em Pedro Costa.

"Cavalo Dinheiro" é filme sincopado, musical mesmo, talvez mais rápido e físico e menos refinado do que seu monumental antecessor, "Juventude em Marcha". São ritmos diferentes, maneiras diversas de se olhar para Ventura. É também um filme ainda mais misterioso. Ventura, hospitalizado, à beira da morte, revisita sua vida em uma espécie de delírio, e fantasmagoria elíptica e fugidia. Vemos hospitais, corredores, espaços, espaços, espaços. Eles são diferentes, embora se pareçam, tenham a mesma força opressora. As cenas escapam tanto ao “presente” quanto ao “passado”, e nos convidam a pensar de outra forma a temporalidade do filme e a natureza de Ventura. Seu corpo é um condutor de hipóteses narrativas, condensações provisórias e cambiantes de múltiplos possíveis. É também um filme mais angustiante. Uma angústia permeia tudo, cada plano, os enquadramentos, o jogo de luz e sombra, o corpo de Ventura. A noite reina soberana. A sombra apropriou-se da luz. Talvez seja pior que isso: a luz absorveu a sombra. o que vemos é um brilho enganoso, difuso, enevoado, que recobre a paisagem e os personagem e os força a viver sob ameaça, em um universo claustrofóbico. Uma certa impossibilidade governa este filme.

"Cavalo Dinheiro" é certamente uma espécie de exorcismo. Ventura, o assombrado, externaliza seus demônios. Externaliza? Talvez não seja o termo mais apropriado. Esse assombro não é localizável, seja no interior ou no exterior. Uma analogia com a energia atômica talvez seja mais proveitosa. Quer dizer: o filme libera uma certa energia e esta liberação, mais do que um possível exorcismo, nos ameaça a todos.

sexta-feira, outubro 24, 2014

bem vindo a nova york ****

Vi o filme duas vezes. Queria mais. "Bem vindo a Nova York" é um filme imenso. Escrever sobre ele, sobre minha relação com ele, não é algo fácil. É, porém, necessário. Não tem jeito. Eu adio e a necessidade me persegue. Enfim, vamos a alguns breves comentários:

Gerard Depardieu. Um monstro sedutor. Um corpo pesado, atado ao mundo, ou melhor, ao mundano. Uma força da natureza, incontrolável, injustificável, sem origem, destino ou função. Depardieu não nos entregava uma atuação tão acachapante desde os filmes de Maurice Pialat.

Um desconforto moral, característico dos melhores filmes do cineasta americano, se estabelece desde cedo. Devereaux é o que queríamos ser. Ou não? Rico. Bem-sucedido. Um hotel estrelado. Poder. Belas mulheres. Aventuras sexuais. Sabemos o que ele fez. Veremos o que ele fez - e Ferrara encena a sequencia do abuso à distância, sem conduzir o nosso olhar, sem recorrer à trilha ou à decupagem. Ferrara nos diz: trata-se de um ato sem maiores  justificativas ou explicações e absolutamente interligado ao que vimos antes e julgá-lo é julgar a nós mesmos. Não é toa que seremos interpelados diversas vezes ao longo do filme. Somos o contracampo. Somos cínicos. Hipócritas. Somos culpados.

Gosto muitos das discussões entre Devereaux e Simone. O excesso dos personagens transborda, invade a narrativa, contamina o filme (sempre mais interessado em blocos de ação do que em um certo equilíbrio ou elegância formal) com uma fisicalidade inultrapassável, e alcança o espectador em cheio.

É incrível como vez ou outras alguns breves enxertos (em geral no fim de uma sequência) realçam as cenas anteriores. É o caso do close do rapaz negro no tribunal que será julgado logo após Devereaux. O enxerto se liga diretamente ao que vemos e ouvimos nos planos anteriores, ao teatro do advogados, promotores e juiz, à indiferença do protagonista. Algo contudo escapa a esta associação, nos faz pensar, nos leva a lugares desconhecidos. A imagem como uma abertura.

sábado, outubro 11, 2014

links

Alguns Links:

Atualização no (In) Transition

Uma relação bacana com vários ensaios audiovisuais

Ótima atualização da Senses of Cinema!

Kent Jones sobre Hou Hsaio-Hsien

Peter Labuza sobre "Ninfomaníaca"

Nicole Benez entrevista Eric e Marc Hurtado

Francis Vogner dos Reis sobre "Bem Vindo a Nova York"

Filipe Furtado sobre "Cavalo Dinheiro"

E, abaixo, trailer do novo Michael Man!



E do Paul Thomas Anderson!

segunda-feira, setembro 22, 2014

festival do rio

Uma lista, sem brasileiros e para além dos obrigatórios Michael Cimino e Roberto Rossellini:

Aleluia, de Fabrice Du Welz
Dois Dispáros, de Martin Rejtman
Ciúme, de Philippe Garrel
Manglehorn, de David Gordon Green
Três corações, de Noît Jacquot
Pessoas-pássaro, de Pascale Ferran
Life Itself - A vida de Roger Ebert, de Steve James
Listen Up Philip, de Alex Ross Perry
Burying the Ex, de Joe Dante
Cavalo Dinheiro, de Pedro Costa
O massacre da serra elétrica, de Tobe Hooper
Jornada do oeste, de Tsai Ming-Liang
National Gallery, de Frederick Wiseman
Incompreendida, de Asia Argento
Por cima do seu cadáver, de Takesi Miike
Solness, de Jonathan Demme
E agora? Lembra-me, de Joaquim Pinto
O preço da glória, de Xavier Beauvois
La Sapienza, de Eugene Green
O cheiro da gente, de Larry Clark
Vai trabalhar vagabundo, de Hugo Carvana
A princesa de França, de Matias Pineiro
Timbuktu, de Abderrahmane Sissako
A terceira margem, de Celina Murga
Só Deus sabe, de Ben e Joshua Safdie
Nick Cave – 20.000 dias na Terra, de Iain Forsyth e Jane Pollard
Uma promessa, de Patrice Leconte
Água prateada, um autorretrato da Síria, de Osama Mohammed e Wiam Simav Bedirxan
Whiplash - Em busca da perfeição, de Damien Chazelle
Uma garota à porta, de July Jung
Corrente do mal, de David Robert Mitchell
Party Girl, de Marie Amachoukeli, Claire Burger e Samuel Theis

* os filmes de Richar Linklater e David Cronenberg vão estrear ainda este ano.

sábado, setembro 13, 2014

em trânsito

Esse curta do Marcelo Pedroso é uma coisa fervente e passional. O cinema como uma arma!

Parece-me ter saído do mesmo impulso que o "Projeto Torres Gêmeas". Filmes sobre Recife: uma cidade cada vez mais privatizada, verticalizada, motorizada, despersonalizada, em uma sucessão de absurdos naturalizados. Pensei bastante na noção de "excluído". Isto não faz mais (se é que fez) muito sentido. É uma espécie de sacanagem conceitual. Não é exclusão, está mais para inclusão por violação. Ao fim, eu me senti absolutamente entrelaçado com aquilo, com raiva, com vergonha, instado a reagir. Reagir de alguma maneira.

Um adendo: é bem verdade que "Em trânsito" não trata somente de uma cidade, não se restringe a algo demarcável geograficamente. Há algo mais geral... modelos totalitários de conceber as coisas estão sempre sendo impostos e aceitos... Tendo, contudo, a discordar que o filme é mais forte quando deixa de ser apenas panfleto, quando não permanece essencialmente vinculado ao presente. Acho que não é por aí.

terça-feira, setembro 09, 2014

josé luis guerín no IMS

Sábado, 13

16h: Os motivos de Berta (Los motivos de Berta),de José Luis Guerín, com Sílvia Gracia,Arielle Dombasle, Iñaki Aierra, Rafael Díaz,Juan Diego Botto (Espanha, 1983. 115‘)

18h: Mesa de debate com José Luis Guerín e Hernani Heffner

20h00: Innisfree (Innisfree), de José Luis Guerín, com Bartley O’Feeney, Padraig O’Feeney, Anna Livia Ryan, Anne Slattery (Espanha, 1990. 110’)

Domingo, 14

16h: Recordações de certa manhã (Recuerdos de una mañana), de José Luis Guerín Som: Amanda Villavieja. Montagem: José Luis Guerín e Pablo Gil.Edição de som: Martín Ortega e Marisol Nievas. Produção: Núria Esquerra (Coreia do Sul/Espanha, 2011. 47’)

Duas cartas para Ana(Dos cartas a Ana),de José Luís Guerín. Fotografía: Álvaro Fernández Puig. Coreografía: MorenoBernardi. Com Moreno Bernardi, GaraziLópez de Armentia (Espanha, 2011. 28’)

18h: Trem de sombras (Tren de sombras - El espectro de Le Thuit), de José Luis Guerín, com Juliette Gaultier,Ivan Orvain, Anne Céline Auche(Espanha, 1997. 88’)

20h: Correspondência Jonas Mekas / J. L. Guerín (CorrespondênciaJonas Mekas - J. L. Guerín),de José Luis Guerín e Jonas Mekas(Espanha/EUA , 2011. 90’)

Terça-feira, 16

14h: Laboratório (1), com José Luis Guerín.

18h: Trem de sombras (Tren de sombras - El espectro de Le Thuit), de José Luis Guerín, com Juliette Gaultier, Ivan Orvain, Anne Céline Auche (Espanha, 1997. 88’)

20h: Em construção (En construcción), de José Luis Guerín, com Juana Rodríguez, Juan López, Santiago Segade, Abdel Aziz El Mountassir, Antonio Atar (Espanha, 2000. 125’)

Quarta-feira, 17

14h: Laboratório (2), com José Luis Guerín.

18h: Os motivos de Berta (Los motivos de Berta), de José Luis Guerín, com Sílvia Gracia,Arielle Dombasle, Iñaki Aierra, Rafael Díaz,Juan Diego Botto (Espanha,1983. 115‘)

20h: Guest (Guest), de José Luis Guerín, com Chantal Akerman, Tanja Czichy, Charlotte Dupont (Espanha, 2010. 124’)

Quinta-feira, 18

14h: Laboratório (3), com José Luis Guerín.

17h30: Depois do vendaval (The Quiet Man), de John Ford,com John Wayne, Maureen O’Hara, BarryFitzgerald, Ward Bond e Victor McLagen(EUA , 1952. 129’)

20h: Innisfree (Innisfree), de José Luis Guerín, com Bartley O’Feeney, Padraig O’Feeney, Anna Livia Ryan, Anne Slattery (Espanha, 1990. 110’)

Sexta-feira, 19

14h: Laboratório (4), com José Luis Guerín.

18h: O homem das multidões, de Cao Guimarães e Marcelo Gomes,com Paulo André, Silvia Lourenço e Jean-Claude Bernardet (Brasil, 2013. 95’)

20h: Na cidade de Sylvia (En la ciudad de Sylvia),de José Luis Guerín, com Pilar López deAyala, Xavier Lafitte, Laurence Cordier,Tanja Czichy, Charlotte Dupont, EricDietrich (Espanha/França, 2007. 84’)

Sábado, 20

16h: Correspondência Jonas Mekas / J. L. Guerín (CorrespondênciaJonas Mekas - J. L. Guerín),de José Luis Guerín e Jonas Mekas(Espanha/EUA, 2011. 90’)

18h: Mesa de debate com José Luis Guerín e Geraldo Sarno

20h: Em construção (En construcción), de José Luis Guerín, com Juana Rodríguez, Juan López, Santiago Segade, Abdel Aziz El Mountassir. (Espanha, 2000. 125’)

Domingo, 21

16h: Algumas fotos na cidade de Sylvia (Unas fotos en la ciudad de Sylvia),de José Luis Guerín (Espanha, 2007. 67’)

Duas cartas para Ana (Dos cartas a Ana), de José Luis Guerín (Espanha, 2011. 28’)

18h: Na cidade de Sylvia (En la ciudad de Sylvia), de José Luis Guerín, com Pilar López deAyala, Xavier Lafitte, Laurence Cordier,Tanja Czichy (Espanha/França, 2007. 84’)

20h: Guest (Guest), de José Luis Guerín, com Chantal Akerman, Tanja Czichy,Charlotte Dupont (Espanha, 2010. 124’)

sábado, setembro 06, 2014

Ou seja: a arte não nasce como uma apreciação ou um julgamento do mundo, mas como um processo dinâmico e perpétuo de criação, recriação e experimentação de um mundo. Um processo que implica uma simultaneidade de presença e ausência, visibilidade e invisibilidade, perfeição e inacabamento, totalidade e abertura, tecido conjuntivo e diferenciado do mundo. Uma experiência irredutível à generalização, experiência que, justamente por situar-se além de nossas possibilidades, força a pensar, em uma unidade aparentemente paradoxal entre o passageiro e efêmero por natureza e o fora do tempo, sempre idêntico a si mesmo. Algo que Alberto Caeiro, um dos heterônimos mais famosos e constantes do poeta Fernando Pessoa, soube como poucos descrever:

O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás…
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem…
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras…
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo.
(Caeiro, 1997: 89)

A eterna novidade do mundo. Esta talvez seja a promessa que todas as artes carregam no horizonte.

sábado, agosto 30, 2014

Anos 70. Austrália. Um antropólogo e um guia aborígene viajam em pesquisas sobre a pintura rupestre, ainda prática corrente entre os nativos australianos. Eles adentram uma caverna. Avistam um desenho gasto de um animal. O guia se entristece, chora, e, pouco depois, começa a retocar o desenho. O antropólogo, intrigado, faz a pergunta que qualquer ocidental faria: “Porque você pinta?”. “Mas não é minha mão que pinta”, responde o aborígene, estupefato: “É a mão do espírito”.

A princípio, pode parecer estranho começar esta conclusão com a pequena história que o arqueólogo francês Julien Monney conta ao cineasta Werner Herzog em “Caverna dos sonhos esquecidos” (2010), filme sobre os mistérios da caverna Chauvet, no sul da França, onde estão, em perfeito estado, os desenhos rupestres mais antigos de que se tem noticia. Se relevarmos, contudo, a carga místico-religiosa da resposta do aborígene, um olhar diverso sobre a arte em sua origem se abre no horizonte: a arte como uma doação, a dar vida material a algo imaterial, a tornar presente algo ausente; a arte como um sair de si sem jamais estar fora de si, como um fluxo e refluxo entre a obra, o artista, e, posteriormente, o espectador.

quarta-feira, agosto 27, 2014

grandrieux

Para que servem? Que real é capaz de animá-las? Philippe Grandrieux, em entrevista a Nicole Brenez, fala de uma certa exigência, de uma dinâmica que busca voltar às fontes mais profundas e obscuras do desejo de representação. Ele diz:

"O que buscamos, desde os primeiros traços de mãos impressas em rochas, na longa e alucinada perambulação dos homens através do tempo, o que tentamos alcançar tão febrilmente, com obstinação e sofrimento, por meio da representação, através de imagens, senão abrir a noite do corpo, sua massa opaca, a carne com a qual pensamos - e apresentá-lo à luz, à nossa cara, o enigma de nossas vidas".

A imagem sem valor de face aparente, que preserva um tipo de fascinação que o cinema não via há algum tempo e que nos demanda uma postura diferenciada. Antes de compreender, é preciso ver. Não se trata de uma decifração. Um filme deve ganhar uma consistência de ser, que insiste em si mesmo, abre-se, expõe-se e produz uma vida, anterior e adiante, que fissura o tempo presente, justifica-o e dinamiza-o. É uma certa opacidade do pensamento da visão que está em jogo: experiência irredutível à generalização, que, justamente por situar-se além de nossas possibilidades, força a pensar.

domingo, agosto 24, 2014

amantes eternos **

O cinema de Jim Jarmusch sempre foi algo pós-punk. Quer dizer: um cinema não mais exatamente revoltoso ou militante, mas melancólico, algo mais para um tédio (neo)existencialista. Seus personagens se veem sem rumo, cansados, desinteressados, embora não exatamente derrotados ou deprimidos. Eles vão buscar alguma coisa, alternativas, certo reencontro com uma mundanidade.  Os filmes fazem então retratos, contextualizações, se promiscuem com o pop, o artifício, diversas formas de entretenimento; incorporam o enfado de um olhar atento e até certo ponto desejoso, porém incapaz ao menos inicialmente de se fascinar com o mundo.  De "Flores partidas" (2005) pra o novo "Eternos amantes", passando pelo pouco conhecido "Os limites do controle" (2009), este olhar jarmuschiano talvez esteja ao mesmo tempo mais entediado e melancólico, de um lado, e atento ao mundano, do outro.

Jarmusch agora nos apresenta o reencontro de dois amantes: Eva (Tilda) e Adão (Tom Hiddleston, o Loki de “Os Vingadores”). Eles são vampiros. Amam-se a séculos. Eva estava em Tânger, no Marrocos, um local marcado pelos expatriados do Novo Mundo que ali se estabeleceram em busca de uma existência mais livre. Adão fez carreira na indústria fonográfica, entre Paris e Detroit, berço da industrialização automobilística americana em vias de sucateamento - aliás, ambas cidades, românticas, embora decadentes ajudam Jarmusch a intuir o tom da trama. Adão é um fastio secular e ambulante. Eva retruca: “não adianta ficar assim, no final das contas o que vale é dançar”. O reencontro entre eles tem gosto de recomeço.

O filme tem um jeitão de thriller, mas requer um tipo diferente de envolvimento do espectador. "Eternos amantes" é um filme de ação sem ação. Não interessa o enredo. Tampouco sua resolução.  É neste sentido bem curiosa a relação que Jarmusch alimenta com o cinema de gênero. Se, por um lado, os códigos já amplamente assimilados dos filmes de vampiro estão todos por lá, do outro, não só não se mergulha no gênero por inteiro, como parece por vezes rechaçá-lo. Talvez seja ainda mais complicado. Quer dizer: não se trata de um movimento que nos traz para mais perto e depois, sorrateiramente, nos tira o chão. Não é bem isso. Nunca nos sentimentos realmente em casa em "Eternos amantes". Tampouco nos sentimentos verdadeiramente desconcertados.

Aos poucos, uma estranha dicotomia de mortos prevalece. Os zumbis são mortos reanimados, sem rumo, sem vida. Para Adam, somos todos zumbis, e, como tal, merecemos sua aversão. Os vampiros são eternos sobreviventes, seres humanos transformados, imortais porém atados ao mundo, ao vício do sangue. Adão e Eva são personagens que enxergam a história em uma linha temporal justamente porque passaram por tudo, embora a partir das margens, das sombras, em segredo. A imortalidade, contudo, nada mais é do que o amargo privilégio de já ter visto tudo. O amargo fica, claro, por conta de Adão. Sua imortalidade é como a constante reafirmação de uma impotência diante das grandes questões, e da crescente  corrosão (moral, artística, social etc) do mundo contemporâneo. Eva tenta confortá-lo. Ela é mais serena e ainda consegue ater-se ao instante, à fruição de prazeres efêmeros. A arte, sobretudo, a música emerge quase sempre como única escapatória.

É tudo bem, realmente, jarmuschiano. Mais do que isso. É tudo bem metafórico, a começar pelo nome dos personagens - que o cineasta insiste não ter como inspiração a "Bíblia", mas um livro de Mark Twain. Tudo neste filme simboliza outra coisa, maior, mais profunda. Um certo esquematismo se faz transparente. "Eternos amantes", apesar da vibração poderosa de algumas de suas locações, das comoventes interpretações de seus protagonistas, da beleza plástica de suas acinzentadas imagens, de seus momentos de poesia sobre o nada, mostra-se excessivamente cauteloso na administração de seus temas e proposições formais.

domingo, agosto 17, 2014

cães errantes ****

O universo truffautiano de Tsai Ming-Liang parece estar se esvaindo. Vejam bem: eu não falo em um cansaço ou desgaste do universo de Tsai, mas algo mais para um esvanecimento, uma dissolução. Em "Cães Errantes" talvez tenhamos chegado a uma espécie de capítulo final. O digital tem culpa. Este é o primeiro longa de Tsai a ser rodado inteiramente em digital. É um dado importante. Pois em "Cães Errantes" vemos uma relação diversa entre câmera, atores e espaços, a começar pela longa duração dos planos e pela sensação (talvez inédita mesmo para um cineasta como Tsai) de paralisia e isolamento. Tsai jamais havia isolado tanto seus planos. São raros os momentos em que conexões entre planos são expressas, implicadas, sugeridas. Os planos duram, duram, duram, e, dificilmente, se compõem em sequências, como se o cinema narrativo estivesse ameaçado. Ainda assim, como todos os longas de Tsai, este é um filme centrado em um corpo-personagem e na exploração de suas possíveis narrativas. É bem interessante como Tsai consegue enxertar micronarrativas no interior de uma estrutura mais ampla sem ter necessariamente em conta uma conectividade mais literal às cenas em torno delas.

Vale uma menção aos dois últimos planos de "Cães Errantes". Em um drama silencioso e melancólico, estes planos são como um clímax íntimo. A imagem nos mostra marido e mulher. Ela tem o rosto em primeiro plano. Ele está por trás dela. Nenhum dos dois falam por quase 14 minutos. A única ação que vemos na maior parte do plano é o marido tomando goles de cerveja enquanto a mulher chora. Não temos ideia de quando esta cena vai terminar. Até porque nenhuma trajetória mais claro se configurou. Depois de 13 minutos, ele agarra o ombro dela e inclina sua cabeça cansada. Em um filme como este, um movimento mínimo e aparentemente aleatório se transforma em um verdadeiro acontecimento. E o filme, subitamente, se abre novamente a uma série de possibilidades narrativas. Estaria ele querendo reatar o relacionamento? Pedindo desculpas? Desculpas pelo quê exatamente? O corte interrompe o fluxo e nos põe distantes do casal, agora de costas, com o mural em relevo e as ruínas da casa. Mais dez minutos se passam. Marido e mulher saem de quadro. Para onde? Ela sai primeiro. Estaria nervosa? Será que vão ficar juntos?

É triste, contudo, que a maioria das pessoas só enxergue o desespero, vazio e as lágrimas. Lembrei das últimas cenas de “Viver l’amour” (1994). Vejam bem. Não refiro-me somente da famosa cena final. Pois pouco antes da cena de choro de Mey, Tsai nos oferece um outro longo plano que fecha as participações dos demais protagonistas do longa, Hsiao-kang e Ah-jung. O primeiro sai debaixo da cama, onde estava escondido. Ele deita ao lado de Ah-jung, que permanece dormindo. Hsiao-kang encena uma cena romântica, com os olhos esbugalhados, apreensivo, porém entusiasmado com a própria brincadeira. Ele beija o rosto de Ah-jung, cobre-se com o braço do rapaz e fecha os olhos. Em um certo sentido, a plenitude estranha dessa cena, funciona como contraponto da que virá logo em seguida. Poderíamos falar em um filme com dois finais - talvez seja um exagero dizer o mesmo de "Cães Errantes".

terça-feira, agosto 12, 2014

FRITZ LANG!

Começa amanhã a retrospectiva do Frtiz Lang no CCBB do Rio. Dá pra ver a programação desta primeira semana clicando aqui.

quarta-feira, agosto 06, 2014

jia zhang-ke na caixa!

Vejam abaixo a retrospectiva do Jia Zhang-ke na Caixa Cultural. Começou ontem:

06 | quarta

16h30 | sala 1: Memórias de Xangai

19h | sala 2: 24 city

07 | quinta

16h30 | sala 2: Inútil + Our ten years

19h | sala 2: Volta pra casa + In public

8 | sexta

14h | sala 2: Yulu + Remembrance

16h30 | sala 2: Dong + Cry me a river + Black Breakfast

19h | sala 1: Em busca da vida

9 | sábado

14h | sala 1: Plataforma

16h | MASTERCLASS com Jia Zhangke

10 | domingo

14h | sala 2: Prazeres Desconhecidos

16h30 | sala 2: O Mundo

19h | sala 1: Um artista batedor de carteiras + Dog’s condition

12 | terça

16h30 | sala 2: Volta pra casa + In public

19h | sala 1: Um artista batedor de carteiras + Dog’s condition

13 | quarta

16h30 | sala 1: Plataforma

19h | sala 2: Prazeres Desconhecidos

14 | quinta

16h30 | sala 2: O Mundo

19h | sala 1: Em busca da vida

15 | sexta

14h | sala 2: Dong + Cry me a river + Black Beakfast

16h30 | sala 2: Inútil + Our ten years

19h | sala 2: 24 city

16 | sábado

16h30 | sala 1: Memórias de Xangai

19h | sala 2: Yulu + Remembrance

17 | domingo

14h | sala 2: Jia de volta pra casa

16h30 | sala 2: Um toque de pecado

19h | sala 1: mesa de debate 1

segunda-feira, agosto 04, 2014

os residentes ***

Este filme de Tiago Mata Machado é diferente. Ele quer ser diferente. E o é, sem dúvida. Por aí já dá pra ver que tive uma experiência um tanto conturbada com "Os Residentes". Quer dizer: a primeira impressão era de um filme muito preocupado em ser diverso, inteligente, difícil, onde a imagem vem agarrada à um conceito, é ela mesma uma conceito, querendo sempre dizer algo para além dela. As ações não costuram e ou mediam o mundo constituído em filme. O que existem são representações. Refletir sobre a linguagem para poder pensar sobre o mundo. Hoje isso soa como mais um código na gaveta, na grande maioria das vezes. É estranho. Esse incômodo inicial não me abandonou ao longo do filme. "Os Residentes", contudo, ganhava-me devagarzinho, com momentos muito fortes, reencontrando uma energia criativa/destruidora talvez adormecida nos anais da história do cinema. A própria complexidade da fruição do filme mostrava-se pouco a pouco apenas aparente.

Machado interpela a imagem. O que ela pode? Nada sabemos sobre o que pode a imagem cinematográfica. Esta declaração de ignorância é, no entanto, uma provocação e um ponto de partida para uma aventura estético-ideológica. Existe neste filme a consciência de ter vindo depois, de ter chegado depois. Para Machado, este depois diz respeito às diversas vanguardas que tomaram o cinema de assalto ao longo dos anos 60 e 70 com uma vontade de intervenção na vida, para destruí-la e lhe dar quem sabe um outro nome. "Os Residentes", neste sentido, vive em uma espécie de ruína, dos escombros do grande projeto do cinema moderno e suas vanguardas. Ele é como uma resposta corajosa ao trauma deste "fracasso", encarando-o de frente e ao mesmo tempo jogando-o para o retrovisor e seguindo em frente. Vivemos em um momento em que a vida e o mundo são forjados por códigos estéticos? Somos representações sem referencia? O que resta então ao cinema? "Os Residentes" faz este diagnóstico, sendo ele mesmo um sintoma deste diagnóstico, e prega, por fim, a exploração dos poderes representacionais da imagem.

Lendo sobre o filme na Internet, esbarrei nesta preciosidade, uma conversa sobre "Os Residentes", entre Francis Vogner dos Reis e Tiago Mata Machado. Vejam aqui.


terça-feira, julho 29, 2014

sábado, julho 26, 2014

imovision no arteplex

A Imovision completa 25 anos e faz uma pequena mostra no Arteplex, com destaque para o novo filme de Abel Ferrara, "Bem vindo a Nova York". O filme passa hoje e terça, às 21h30.

Além dele, outros grandes filmes do catálogo da distribuidora serão exibidos:

24/07 – A FITA BRANCA

25/07 – DANÇANDO NO ESCURO

26/07 – A SEPARAÇÃO

27/07 – AMOR À FLOR DA PELE

28/07 – CINEMA, ASPIRINAS E URUBUS

29/07 – VINCERE

30/07 – AMOR

Sessões sempre às 19hs

terça-feira, julho 22, 2014

surrealismo e vanguardas, no CCBB

Dia 23/07 (Quarta-feira)

17h – Sessão Man Ray (Classificação Indicativa: Livre)

Emak-Bakia – Direção: Man Ray. 1927, 35mm, 18 min
L’Etoile de Mer (Estrela do Mar) – Direção: Man Ray. 1928, 35mm, 21 min
Les Mystères du Chateau du Dé – Direção: Man Ray. 1929, 35mm, 27 min

19h – Sessão Luís Buñuel (Classificação Indicativa: Livre)

A Idade de Ouro (L’âge D’or) – Direção: Luís Buñuel. 1930, 35mm, 63 min
Um Cão Andaluz – Direção: Luís Buñuel. 1928, 35mm, 16 min.

Dia 24/07 (Quinta-feira)

17h - A Nós a Liberdade – Direção: René Clair. 1931, DVD, 80 min. Classificação Indicativa : Livre

19h - Traité de bave et d’eternité – Direção: Isidore Isou. 1951, 35mm, 123 min. Classificação Indicativa : 14 anos

Dia 25/07 (Sexta-feira)

17h – Sessão Joseph Cornell (Classificação indicativa: Livre)

Rose Robart – Direção: Joseph Cornell. 1936, DVD, 20 min.
By Night with Torch and Spear – Direção: Joseph Cornell. 1942, DVD, 8 min.
Aviary – Direção: Joseph Cornell. 1955, DVD, 14 min.
Centuries of June – Direção: Joseph Cornell. 1955, DVD, 11 min.
Gnir Rednow – Direção: Joseph Cornell. 1955-1970, DVD, 6 min
Angel – Direção: Joseph Cornell. 1957, DVD, 3 min
Nymphlight – Direção: Joseph Cornell, 1957, DVD, 8 min.
A Legend for Fountains – Direção: Joseph Cornell. 1857-1965, DVD, 17 min.

19h - Limite – Direção: Mário Peixoto. 1931, bluray, 120 min.
Classificação Indicativa : Livre

Dia 26/07 (Sábado)

15h30 - Traité de bave et d’eternité – Direção: Isidore Isou. 1951, 35mm, 123 min. Classificação Indicativa : 14 anos

18h – Sessão Luís Buñuel (Classificação indicativa: Livre)

A Idade de Ouro (L’âge D’or) – Direção: Luís Buñuel. 1930, 35mm, 63 min
Um Cão Andaluz – Direção: Luís Buñuel. 1928, 35mm, 16 min.

Dia 27/07 (Domingo)

15h30 - Limite – Direção: Mário Peixoto. 1931, bluray, 120 min. Classificação Indicativa : Livre

18h – Sessão Man Ray (Classificação indicativa: Livre)

Emak Bakia – Direção: Man Ray. 1927, 35mm, 18 min
L’Etoile de Mer (Estrela do Mar) – Direção: Man Ray. 1928, 35mm, 21 min
Les Mystères du Chateau du Dé – Direção: Man Ray. 1929, 35mm, 27 min

Dia 28/07 (Segunda-feira)

17h – Sessão Joseph Cornell (Classificação indicativa: Livre)

Rose Robart – Direção: Joseph Cornell. 1936, DVD, 20 min.
By Night with Torch and Spear – Direção: Joseph Cornell. 1942, DVD, 8 min.
Aviary – Direção: Joseph Cornell. 1955, DVD, 14 min.
Centuries of June – Direção: Joseph Cornell. 1955, DVD, 11 min.
Gnir Rednow – Direção: Joseph Cornell. 1955-1970, DVD, 6 min
Angel – Direção: Joseph Cornell. 1957, DVD, 3 min
Nymphlight – Direção: Joseph Cornell, 1957, DVD, 8 min.
A Legend for Fountains – Direção: Joseph Cornell. 1857-1965, DVD, 17 min.

19h - A Nós a Liberdade – Direção: René Clair. 1931, DVD, 80 min. Classificação Indicativa : Livre

Dia 30/07 (Quarta-feira)

17h – Sessão James Broughton 1 (Classificação indicativa: 16 anos)

The Pleasure Garden – Direção: James Broughton. 1953, 16mm, 38 min.
The Bed – Direção: James Broughton. 1968, 16mm, 20 min.
Testament – Direção: James Broughton. 1974, 16mm, 20 min.

19h – Sessão Maya Deren 1 (Classificação indicativa: Livre)

Study in Choreography for Camera – Direção: Maya Deren. 1945, 16mm, 3 min.
At Land – Direção: Maya Deren. 1944, DVD, 14 min.
Tramas do Entardecer (Meshes of Afternoon) – Direção: Maya Deren. 1943, 16mm, 13 min.
Ritual in Transfigured Time – Direção: Maya Deren. 1946, 16mm, 14 min.
The Very Eye Of Night – Direção: Maya Deren. 1958.16mm, 15 min.

Dia 31/07 (Quinta-feira)

17h – Sessão James Broughton 2 (Classificação indicativa: 16 anos)

Dreamwood – Direção: James Broughton. 1972, 16mm, 45 min.
Devotions – Direção: James Broughton, Joel Singer. 1983, 16mm, 22 min.

19h – Sessão Maya Deren 2 (Classificação indicativa: Livre)

Meditation on Violence – Direção: Maya Deren. 1948, 16mm, 10 min.
Divine Horsemen: The Living Gods of Haiti – Direção: Maya Deren, Cherel Ito e Teiji Ito. 1951 – 1985, 16mm, 55 min.

Dia 01/08 (Sexta-feira)

17h – Sessão Germaine Dulac + Jean Genet (Classificação indicativa: 18 anos)

Um Chant D’Amour – Direção: Jean Genet. 1950, 35mm, 26 min
A Concha e o Clérigo (La Coquille et le Clergymen) – Direção: Germaine Dulac. 1928, 35mm, 40 min.

19h – Sessão de Curtas René Clair + Fernand Léger + Marcel Duchamp (Classificação indicativa: Livre)

Anemic Cinema – Direção: Marcel Duchamp. 1926, blu-ray.
Ballet Mécanique – Direção: Fernand Léger, Dudley Murphy. 1923, 35mm, 19 min.
Entr’act – Direção: René Clair. 1924, 35mm, 20 min.

Dia 02/08 (Sábado)

16h – Sessão Maya Deren 1 (Classificação indicativa: Livre)

Study in Choreography for Camera – Direção: Maya Deren. 1945, 16mm, 3 min.
At Land – Direção: Maya Deren. 1944, DVD, 14 min.
Tramas do Entardecer (Meshes of Afternoon) – Direção: Maya Deren. 1943, 16mm, 13 min.
Ritual in Transfigured Time – Direção: Maya Deren. 1946, 16mm, 14 min.
The Very Eye Of Night – Direção: Maya Deren. 1958.16mm, 15 min.

18h – Sessão Germaine Dulac + Jean Genet (Classificação indicativa: 18 anos)

Um Chant D’Amour – Direção: Jean Genet. 1950, 35mm, 26 min
A Concha e o Clérigo (La Coquille et le Clergymen) – Direção: Germaine Dulac. 1928, 35mm, 40 min.

Dia 03/08 (Domingo)

16h – Sessão James Broughton 1 (Classificação indicativa: Livre)

The Pleasure Garden – Direção: James Broughton. 1953, 16mm, 38 min.
The Bed – Direção: James Broughton. 1968, 16mm, 20 min.
Testament – Direção: James Broughton. 1974, 16mm, 20 min.

18h – Sessão de Curtas René Clair + Fernand Léger + Marcel Duchamp (Classificação indicativa: Livre)

Anemic Cinema – Direção: Marcel Duchamp. 1926, blu-ray.
Ballet Mécanique – Direção: Fernand Léger, Dudley Murphy. 1923, 35mm, 19 min.
Entr’act – Direção: René Clair. 1924, 35mm, 20 min.

Dia 04/08 (Segunda-feira)

17h – Sessão Maya Deren 2 (Classificação indicativa: Livre)

Meditation on Violence – Direção: Maya Deren. 1948, 16mm, 10 min.
Divine Horsemen: The Living Gods of Haiti – Direção: Maya Deren, Cherel Ito e Teiji Ito. 1951 – 1985, 16mm, 55 min.

19h – Sessão James Broughton 2

Dreamwood – Direção: James Broughton. 1972, 16mm, 45 min.
Devotions – Direção: James Broughton, Joel Singer. 1983, 16mm, 22 min.

Dia 06/08 (Quarta-feira)

15h - Sessão Joseph Cornell (Classificação indicativa: Livre)

Rose Robart – Direção: Joseph Cornell. 1936, DVD, 20 min.
By Night with Torch and Spear – Direção: Joseph Cornell. 1942, DVD, 8 min.
Aviary – Direção: Joseph Cornell. 1955, DVD, 14 min.
Centuries of June – Direção: Joseph Cornell. 1955, DVD, 11 min.
Gnir Rednow – Direção: Joseph Cornell. 1955-1970, DVD, 6 min
Angel – Direção: Joseph Cornell. 1957, DVD, 3 min
Nymphlight – Direção: Joseph Cornell, 1957, DVD, 8 min.
A Legend for Fountains – Direção: Joseph Cornell. 1857-1965, DVD, 17 min.

17h - Salomé – Direção: Téo Hernandez. 1976, 16mm, 65 min. Classificação Indicativa : 18 anos

19h – Sessão Sidney Peterson (Classificação indicativa: Livre)

The Potted Psalm – Direção: Sidney Peterson, James Broughton. 1946, 16mm, 17 min.
The Cage – Direção: Sidney Peterson. 1947, 16mm, 28 min.
The Lead Shoes – Direção: Sidney Peterson, 1949, 16mm, 18 min.

Dia 07/08, quinta-feira

15h - A Nós a Liberdade – Direção: René Clair. 1931, DVD, 80 min. Classificação Indicativa : Livre

17h – Sessão Jean Painlevé (Classificação indicativa: Livre)

Mathusalem – Direção: Jean Painlevé, 1926, 16mm, 7 min.
Hyas et Stenoriques – Direção: Jean Painlevé, 1927, 16mm, 13 min.
Le Bernard – L’Hermite – Direção: Jean Painlevé, 1927, 16mm, 13 min.
Caprelles – Direção: Jean Painlevé, 1929, 16mm, 8 min.
Le Quatrieme Dimension – Direção: Jean Painlevé, 1936, 16mm, 10 min
Le Vampire – Direção: Jean Painlevé, 1939, 16mm, 9 min.

19h - L’ange – Direção: Patrick Bokanowski. 1982, 35mm, 70 min. Classificação Indicativa : 14 anos

Dia 08/08, sexta-feira

15h – Sessão Oskar Fischinger + Len Lye (Classificação indicativa: Livre)

Wachs Experimente – Direção: Oskar Fischinger. 1923, 16mm, 9 min.
München Berlin Wanderung – Direção: Oskar Fischinger. 1927, 16mm, 5 min.
Seelische Konstruktionen – Direção: Oskar Fischinger. 1927, 16mm, 7 min.
Komposition in Blau – Direção: Oskar Fischinger. 1935, 16mm, 4 min.
Motion Painting 1 – Direção: Oskar Fischinger. 1947, 16mm, 11 min.
Tusalava – Direção: Len Lye. 1929, 16mm, 11 min.
Kaleidoscope – Direção: Len Lye, 1935, 16mm, 4 min.
Colour Flight – Direção: Len Lye, 1938, 16mm, 4 min.

17h - Salomé – Direção: Téo Hernandez. 1976, 16mm, 65 min. Classificação Indicativa : 14 anos

19h – Debate com Luiz Fernando Gallego e Cristiana Miranda

Dia 09/08, sábado

16h – Sessão Oskar Fischinger + Len Lye (Classificação indicativa: Livre)

Wachs Experimente – Direção: Oskar Fischinger. 1923, 16mm, 9 min.
München Berlin Wanderung – Direção: Oskar Fischinger. 1927, 16mm, 5 min.
Seelische Konstruktionen – Direção: Oskar Fischinger. 1927, 16mm, 7 min.
Komposition in Blau – Direção: Oskar Fischinger. 1935, 16mm, 4 min.
Motion Painting 1 – Direção: Oskar Fischinger. 1947, 16mm, 11 min.
Tusalava – Direção: Len Lye. 1929, 16mm, 11 min.
Kaleidoscope – Direção: Len Lye, 1935, 16mm, 4 min.
Colour Flight – Direção: Len Lye, 1938, 16mm, 4 min.

18h – Sessão Sidney Peterson (Classificação indicativa: Livre)

The Potted Psalm – Direção: Sidney Peterson, James Broughton. 1946, 16mm, 17 min.
The Cage – Direção: Sidney Peterson. 1947, 16mm, 28 min.
The Lead Shoes – Direção: Sidney Peterson, 1949, 16mm, 18 min.

Dia 10/08, domingo

16h – Sessão Jean Painlevé (Classificação indicativa: Livre)

Mathusalem – Direção: Jean Painlevé, 1926, 16mm, 7 min.
Hyas et Stenoriques – Direção: Jean Painlevé, 1927, 16mm, 13 min.
Le Bernard – L’Hermite – Direção: Jean Painlevé, 1927, 16mm, 13 min.
Caprelles – Direção: Jean Painlevé, 1929, 16mm, 8 min.
Le Quatrieme Dimension – Direção: Jean Painlevé, 1936, 16mm, 10 min
Le Vampire – Direção: Jean Painlevé, 1939, 16mm, 9 min.

18h – Sessão Henri Storck (Classificação indicativa: Livre)

Images D’Ostende – Direção: Henri Storck. 1929, 16mm, 15 min.
Trains de Plaisir – Direção: Henri Storck. 1930, 16mm, 7 min.
Une Idylle a la Plage – Direção: Henri Storck. 1931, 16mm, 35 min.
Le Histoire du Soldat Inconnu – Direção: Henri Storck, 1931, 16mm, 10 min.
Sur les Bords de la Caméra – Direção: Henri Storck. 1932, 16mm, 10 min.

Dia 11/08, segunda-feira

17h – Sessão Henri Storck (Classificação indicativa: Livre)

Images D’Ostende – Direção: Henri Storck. 1929, 16mm, 15 min.
Trains de Plaisir – Direção: Henri Storck. 1930, 16mm, 7 min.
Une Idylle a la Plage – Direção: Henri Storck. 1931, 16mm, 35 min.
Le Histoire du Soldat Inconnu – Direção: Henri Storck, 1931, 16mm, 10 min.
Sur les Bords de la Caméra – Direção: Henri Storck. 1932, 16mm, 10 min.

19h - L’ange – Direção: Patrick Bokanowski. 1982, 35mm, 70 min. Classificação Indicativa : 14 anos

domingo, julho 20, 2014

primeiros encontros no ims

"Primeiros encontros": uma mostra bem legal lá no IMS. Começa dia 25. Vejam aí a programação:

SEXTA | 25 de julho

14h00

Alan Vega: um milhão de sonhos (Alan Vega: Just a Million Dreams) de Marie Losier (França, 2013. 15’)

O último filme (La última película) de Mark Peranson e Raya Martin (México, Dinamarca, Canadá, Filipinas, 2013. 88’)

16h00

Perseverança (Let Us Persevere in What We Have Resolved Before We Forget) de Ben Russell (França, 2013. 20’)

A unidade de todas as coisas (The Unity of All Things) de Alexander Carver e Daniel Schmidt(EUA, Suíça, China, 2013. 98‘)

18h00

Manakamana(Manakamana) de Pacho Velez e Stephanie Spray (Nepal, EUA, 2013. 118’)

20h00

América (America) de Valérie Massadian (França, 2013. 7’)

Orbitalna (Orbitalna) de Marcin Malaszczak (Alemanha, 2014. 25‘)

Costa da Morte (Costa da Morte) de Lois Patiño ( Espanha, 2013. 81’)

SÁBADO | 26 de julho

14h00

Metáfora ou a tristeza virada ao avesso (Metáfora ou a tristeza virada ao avesso) de Catarina Vasconcelos (Portugal, Reino Unido, 2014. 32’)

A selva interior(La jungla interior) de Juan Barrero (Espanha, 2013. 75‘)

16h00

O incitador (Le souffleur de l’affaire) de Isabelle Prim (França, 2014. 55’)

Mil sóis(Mille soleils) de Mati Diop (França, Senegal, 2013. 45‘)

18h00

Alan Vega: um milhão de sonhos (Alan Vega: Just a Million Dreams) de Marie Losier (França, 2013. 15’)

O último filme (La última película) de Mark Peranson e Raya Martin (México, Dinamarca, Canadá, Filipinas, 2013. 88’)

20h00

Perseverança (Let Us Persevere in What We Have Resolved Before We Forget) de Ben Russell (França, 2013. 20’)

A unidade de todas as coisas (The Unity of All Things) de Alexander Carver e Daniel Schmidt(EUA, Suíça, China, 2013. 98‘)

DOMINGO | 27 de julho

14h00

Manakamana (Manakamana) de Pacho Velez e Stephanie Spray (Nepal, EUA, 2013. 118’)

16h00

América (America) de Valérie Massadian (França, 2013. 7’)

Orbitalna (Orbitalna) de Marcin Malaszczak (Alemanha, 2014. 25‘)

Costa da Morte (Costa da Morte) de Lois Patiño (Espanha, 2013. 81’)

18h00

Metáfora ou a tristeza virada ao avesso (Metáfora ou a tristeza virada ao avesso) de Catarina Vasconcelos (Portugal, Reino Unido, 2014. 32’)

A selva interior(La jungla interior) de Juan Barrero (Espanha, 2013. 75‘)

20h00

O incitador (Le souffleur de l’affaire) de Isabelle Prim (França, 2014. 55’)

Mil sóis(Mille Soleils) de Mati Diop (França, Senegal, 2013. 45‘)

segunda-feira, julho 14, 2014

links

- Alguns belos trechos de grandes cineastas que passaram pelo austríaco Film Museum

The Cinephiliacs é um site especializado em podcasts com cineatas, críticos e pesquisadores. Bacana

Storyboard do "Enigma do outro mundo" (1982) em comparação com filme

- Uma conversa entre Kenneth Anger e Harmony Korine

- O novo número da "La Furia Umana"

Adrian Martin fala sobre crítica audiovisual com Catherine Grant

- E David Cronenberg:

sexta-feira, julho 11, 2014

realidade

Andei revendo alguns filmes de Jia Zhang-ke, e volta e meia "Riocorrente" me vem à cabeça. Aos poucos, uma inesperada associação entre um e outro foi ganhando corpo. Quer dizer: a realidade não como um dado, objetivo, evidente. A realidade como uma sensação, um sentimento, uma atmosfera, um gesto. Enfim. Como Paulo Sacramento, o chinês, em filmes como "O Mundo" (2004) e "Em Busca da Vida" (2006), também recorre à intervenções por meio de efeitos animados. Vivemos em uma sociedade de imagens. Elas são mais reais do que a realidade. Não mais testamos a imagem pela realidade. Fazemos o contrário. Já faz algum tempo. Testamos a realidade pela imagem. Quer dizer: a imagem da realidade, precisa, muitas vezes, dependendo de que realidade estamos falando, ser mais do que um registro, mais, mais, mais.

quinta-feira, julho 03, 2014

riocorrente ****

Que filme! "Riocorrente" é como um palavrão bem dado, um longa à flor da pele, em estado de ebulição. É um filme de muitas ideias, com certeza. Contudo, raramente vejo as imagens sendo asfixiadas por elas. Ao contrário: as imagens se afirmam em seus possíveis, no seu excesso e imperfeição. Eu me peguei pensando na física nuclear, que decifra a origem do universo pela explosão da massa em energia, onde as novas partículas produzidas são da mesma espécie das que as produziram. Pois o filme começa e uma certa virulência é liberada. Ela compõe o filme e o ameaça. Uma coisa bem poderosa. Falou-se muito que "Riocorrente" seria um longa sobre a vida em São Paulo, suas tensões, contradições. Pode ser. Eu já acho que o filme de Paulo Sacramento consegue dar conta de certo espírito de época, de nossa época de copa do mundo e olimpíadas, onde todo mundo parece ter ligado o foda-se. E nisso me agrada muito os efeitos de "Riocorrente". Sacramento parece nos dizer que a realidade em que vivemos parece ultrapassar a capacidade dos sentidos realistas de apreensão da vida e de representação cinematográfica. Quer dizer: a realidade é menos algo dado do que um sentimento; e para dar conta dele é preciso de mais imaginação.

terça-feira, junho 17, 2014

olhu nu **

Fiquei um pouco decepcionado com este filme. "Olho nu" é veloz. As músicas se sucedem vertiginosamente, bem como a presença impactante, misteriosa, indecifrável de Ney Matogrosso, que nos chega sempre em breves fragmentos, em uma espécie de estética do coito-interrompido. Joel Pizzini não nos dá tempo nem para nos instalarmos em determinada imagem nem para saborearmos certa informação biográfica.  "Olho nu" parece-me um filme em crise de identidade, entre um documentário mais biográfico-informativo e um ensaio de imagens mais expressivas e "experimentais". As aspas não são a toa. "Olho nu" funciona como versão mais "comportada" ou "conformada" (aspas, mais uma vez) de certo jogo de auto-elogio da figura transgressora e desviante do artista e de uma suposta liberdade de linguagem que soa na grande maioria das vezes como um dejá vú. Isso porque se boa parte do cinema ensaístico e experimental procurava criar efeitos estéticos de transgressão e de negação, com a finalidade de ameaçar a recepção alienada da realidade e propor novas formas de fruição, hoje, essa negação e essa proposição se tornaram por si só algo estéril, sendo apenas mais uma maneira de atrair atenção e intensificar a mesma alienação a qual desejavam inicialmente se opor.

segunda-feira, junho 16, 2014

que horas são aí? ***

Ansioso por seu novo filme ("Cães Errantes"; será mesmo que estréia no Rio?), revi não tem muito tempo "Que horas são aí?" (2001). É mesmo um belíssimo filme. Algumas cenas ficaram comigo. Hsiao-Kang batendo o relógio na passarela é uma delas. Porque ele faz aquilo? Porque rimos daquilo? Que sentido ou significado pode ser intuído a partir dali? Difícil. Aquilo é tão despropositado, sem história ou justificativas - como o choro de May em "Vive L'amour" (1994). Tsai busca sempre a erupção e a vidência do presente, da duração, da consciência deste presente e desta duração. O presente como ruptura. O presente como um impasse. O acontecimento rompe a serialidade linear, traga a história pela urgência de viver aquela situação tão aparentemente banal. Este banal, contudo, acontece e está acontecendo com uma força tal...

Penso muito também na associação com Antonioni. Em "Que horas são aí?" acompanhamos personagens solitários caminhando por quadros urbanos e arquitetônicos despersonalizados. Eles vagam vagarosamente, sem finalidades mais objetivas. Eu, contudo, não consigo ver ali somente um mundo de disjunção e incomunicabilidade, o mundo do apocalipse vindouro. Pra mim, o que fica destas sequências não é a pulverização do individuo no concreto impessoal, mas a possibilidade ao mesmo tempo latente e impossível de um encontro. O que mais impressiona neste filme é como Tsai consegue construir uma espécie delicada de suspense em que cada plano vive justamente essa possibilidade. 

sexta-feira, junho 13, 2014

heli °

É uma coisa um tanto amoral esse "Heli". "Bastardos" (2008) já era um filme bem complicado, mas este novo Amat Escalante é realmente algo deplorável, de um sadismo injustificável, de uma visão de mundo torpe, em que o homem pode apenas gerar ao outro dor, mal, horror - um horror, um mal, uma dor, claro, embaladas em uma estética rigorosa e afinada ao circuito de festivais. Para Escalante, não há nada mais a registrar do que o sofrimento. É, na verdade, algo bem previsível. Pois, aos poucos, sabemos que o que vai acontecer em cada plano é sempre o pior possível e imaginável - o pior possível e imaginável no que diz respeito aos personagens porque a imagem é sempre bonita, bem enquadrada, elegante e toma seu tempo, longo, sem cortes. Fica a dúvida: sabemos que os personagens são um pretexto, mas quem é a protagonista deste filme, a violência ou a imagem? Se pegamos a cena da tortura do cadete, como é possível entender as opções de Escalante? Expressar uma visão pessoal sobre o México atual? Colar-se a experiência do personagem? Longe disso, parece-me. O filme quer condenar a violência, ok. Mas, para fazê-lo, o cineasta decide explorá-la?! Ao longo da sessão, pensei muito em "Jaula de oro" (2013), o belíssimo e doído longa de Diego Quemada-Díez sobre três jovens da Guatemala que passam o diabo na tentativa de imigrar para os EUA. Quer dizer: não é uma questão de temáticas, mas de visão de mundo e cinema.

sábado, maio 31, 2014

links

Cannes por:

Pablo Gonçalo

José Carlos Avellar

Kleber Mendonça Filho

David Hudson

E no MUBI

- Uma conversa sobre a era digital com Dudley Andrew

- Uma aula de Laura Mulvey

- Vale muito acompanhar o Diagonal Thoughts

- Ótima entrevista com Véréna Paravel e Lucien Castaing-Taylor

- Muito legal o catálogo da mostra do Brian de Palma na Caixa Cultural de Curitiba

- Dossiê sobre Tsai Ming-Liang na "Interlúdio"

- Uma entrevista com Robert Bresson

- Uma entrevista com James Gray

- Steven Shaviro e suas primeiras impressões sobre o novo filme do Abel Ferrara

- Paul Schrader e Clint Eastwood conversam sobre "No tempo das diligências"!

- E vejam o filme de Paula Gaitan sobre Maria Gladys. É só clicar aqui


terça-feira, maio 27, 2014

o grande mestre *

Gosto imensamente de "Amores expressos" (1994), "Felizes juntos" (1997) e "Amor à flor da pele" (2000), mas não tive paciência nenhuma com os últimos filmes do Wong Kar-Wai, embora talvez por razões diferentes. "Um beijo roubado" (2007), como bem descreveu o Eduardo Valente lá na "Cinética", era já uma espécie de "Wong Kar Wai for dummies". E neste "O grande mestre" senti-me como em uma show do Steve Vai. Entendem? Quer dizer: vejo um trabalho sofisticado, virtuosíssimo, muito bonito e tal... mas, e aí? Nenhuma substância, parece-me. "O grande mestre" é uma masturbação sem gozo. Sei lá. 

sábado, maio 24, 2014

godzilla *

É muito estranho a maneira com bombas atômicas são representadas neste filme. Quer dizer: se em alguns momentos fala-se de Hiroshima e Nagasaki, em outros parece se passar uma espécie de apologia (talvez não consciente) de um suposto "uso correto" das armas nucleares. O filme muda de opinião constantemente. É bem difícil entender como ele se posiciona sobre o assunto. O fato, contudo, é que, se o "Godizilla" original era uma narrativa sobre o trauma, os perigos e o medo das bombas e radiações atômicas, esta versão mais recente se utiliza de Hiroshima e Nagasaki como mero contraplano melodramático. Enfim, este "Godzilla" é um filme bem chinfrim, embora tenha lá uma ou outra surpresa: Juliete Binoche e Bryan Cranston. O que mais me agrada, no entanto, e que o Wellington Sari tão bem descreveu lá na "Interlúdio", é o visual mais sombrio, o CGI de tons escuros.

sexta-feira, maio 02, 2014

o leopardo

Hoje e domingo, às 18h30, o IMS exibe cópia restaurada de um dos meus filmes prediletos: "O leopardo" (Il gattopardo, 1963), de Luchino Visconti!

sexta-feira, abril 25, 2014

cortinas fechadas ***

É mais um longa que tenta dar conta do estado de desconexão, do descompasso entre Jafar Panahi e o que poderíamos chamar de um filme. “Cortinas Fechadas”, seu segundo longa concluído em meio a prisão domiciliar, tem muito em comum com seu antecessor. “Isto não é um filme”, contudo, carregava uma insatisfação muito forte: a impossibilidade de fazer um filme sem recorrer aos gestos, ao rosto de uma atriz, a um sotaque específico, ao colorido de um dado espaço, em uma palavra, ao imponderável. “Cortinas Fechadas” trata de sentimentos similares, embora de maneira diferente. Este novo longa é algo como uma refração prismática de “Isto não é um filme”. É como se Panahi tivesse dividido o sentimento de confinamento e ansiedade em fragmentos narrativos, em camadas de sentido que por vezes se sobrepõem, se contradizem, se recusam a formarem uma alegoria coerente e legível.

Ao contrário de “Isto não é um filme”, “Cortinas Fechadas” tem atores e personagens, cenários e pequenas ficções. Contudo, este novo longa se faz em uma estranha espécie de pique esconde entre estes elementos. Os personagens, por exemplo: do que estão fugindo se não do próprio filme, das amarras da representação? Estamos diante de um longa que não ousa jamais se afirmar com tal. Quer dizer: Panahi parece insistir em uma distinção que servia de premissa para seu longa anterior: a diferença entre filme e cinema. “Cortinas Fechadas”, como “Isto não é um filme”, embora seja cinema da maior qualidade, é também uma espécie criativa de não-filme. De certa maneira, a grandeza destas perguntas e a riqueza das alternativas que Panahi e seus parceiros nos propõem traduzem os desequilíbrios, as impossibilidades e os furos da realidade contemporânea no Irã.

sábado, abril 19, 2014

hitler 3° mundo !!!

Em meio a eclosão do experimentalismo por todas as cinematografias, José Agrippino, como já havia feito na literatura, jogou tudo para alto, devorando, numa colagem agressiva, uma enorme variedade de estímulos culturais em toda a sua heterogeneidade. “Hitler 3° Mundo” é fruto de um descompromisso fundamentalista com a linguagem oficial, com a gramática estática de campo e contracampo, com a retórica das fusões, fades in-out, e com a lógica linear (mesmo aquela que absorvia o flashback). O próprio enredo é apenas mais um absurdo entre muitos absurdos.

E ao jogar fora a gramática, Agrippino foi abrindo caminhos pouco explorados até chegar a própria investigação da natureza da linguagem cinematográfica. Em seu filme o cinema dito moderno parece recuperar um certo caráter artesal, de uma relação de corpo a corpo do autor e a obra. Há um estranho misto do primitivismo e da indigência técnica dos primórdios da sétima arte com a explosão das formas do cinema moderno e o impacto encantatório das imagens  vinculadas a profundidades filosóficas e políticas. Em “Hitler 3º Mundo” o cinema esbarra num enorme ponto de interrogação.

Vejam o filme:


terça-feira, abril 15, 2014

l'intrus2

Vemo-nos diante de um filme lacunar, porém nada aleatório. Não é à toa que o crítico inglês Jonathan Romney (2000) lançou mão de uma surpreendente comparação entre “Bom trabalho” e o Free Jazz de Ornette Coleman para falar do cinema da realizadora francesa. A alusão não poderia ser mais acertada. Em primeiro lugar, porque Denis faz cinema como quem encontra um tom, uma melodia. Em segundo, porque, para Coleman, que jamais gostou do rótulo de Free Jazz imputado ao seu trabalho, suas músicas eram muito pautadas por composições e as improvisações não bastavam. O acaso era, segundo ele, fruto de muito, mas muito trabalho.

É importante insistir nestas alusões musicais. A música é um elemento fundamental para Denis. Seu uso não se faz para intensificar um sentimento ou uma atmosfera. Ela é parte integrante deste sentimento e desta atmosfera, é constituída por elas e as constituí, ao mesmo tempo. A impressão é a de que Denis não utiliza a melhor música, mas a única possível. É o caso da peça musical de Stuart Staples, membro do grupo britânico Tindersticks, composta essencialmente por uma base de sintetizador que vibra em uma melodia minimalista de guitarra, e funciona como um leitimotiv ou uma assinatura, carimbando as imagens. Em uma entrevista ao site Senses of Cinema, Denis revela que a maior parte das indicações que faz aos atores sé musical. Michel Subor, por exemplo, ouviu Johnny Cash: “queria que ele ouvisse aquela voz carregada de amor e emoção e sentisse que a morte estava por perto” (Smith, 2005).

Há dois elementos a serem analisados nesta declaração. Em primeiro lugar, o fato da vibração de uma voz dar origem a um filme. Um gesto que vislumbra uma nova hierarquia dos elementos narrativos em que os corpos e os objetos ganham terreno, e cuja exploração abre um leque de possibilidades de excitação dos sentidos em detrimento do diálogo e, acima de tudo, da construção e desenvolvimento psicológico dos personagens. É preciso sublinhar esta origem vital do personagem na voz crepuscular de Cash e, em segundo lugar, o método de trabalho que esta operação inscreve.

Ou seja: Denis questiona o privilégio do discurso como produtor único de sentido, abrindo espaço para outras maneiras de compreensão. O significado de seu cinema é inseparável de sua forma sensível. “Ver ‘O intruso’”, nos diz Denis, é “como um barco à deriva em meio a um mar turbulento” (Smith, 2005). Somos incentivados a sentir as imagens. O que existe são as sensações e a consciência que temos de as estarmos sentido. Um cinema que nos propõe um olhar não mais diante do mundo, mas imerso nele, próximo em excesso, a ponto de não vermos com clareza os contornos dos acontecimentos, sempre recheados de bordas imprecisas.  O que se estabelece com o espectador não é um mecanismo de identificação ou empatia para com os personagens e ou as situações em que eles estão envolvidos, tampouco uma relação baseada em um raciocínio intelectual ou na transmissão de um discurso. “O intruso” como que reproduz a percepção de mundo típica de um bebê: confusão sensorial própria a tudo aquilo que vem ao mundo como acontecimento inteiramente novo, singular, diferente. O impacto que este filme nos causa é da ordem do sonho, onde pensamentos, sentimentos e sensações ainda não ganharam forma dentro de uma gramática bem ordenada e lógica.

Denis jamais abre mão seja da plasticidade da imagem, seja da narrativa, senão antes revela nelas uma potência afetiva, uma força sensível, que parece irromper de maneira semelhante ao processo pictórico pelo qual passam os corpos do pintor Francis Bacon e as paisagens de Cézanne. O interesse maior é a constituição de uma “abertura-às-coisas sem conceito”, na investigação dos modos como a imagem e seus diversos elementos podem “apresentar-nos coisas, florestas, tempestades, enfim o mundo (...) como caso particular de um poder ontológico mais amplo” (Merleau-Ponty, 2004: 26). O que se percebe em um filme de Denis é que só sentimos selvagem e intimamente uma sensação quando não a compreendemos, quer dizer, quando não a vestimos com o quer que seja e nos deixamos afundar em todos os seus possíveis nomes e caminhos. É uma espécie de transgressão da representação pela sensação.

domingo, abril 13, 2014

l'intrus

“O intruso” é inspirado em um breve ensaio de Jean-Luc Nancy. A obra homônima do filósofo francês estabelece uma analogia instigante entre as implicações físicas, psicológicas e metafísicas de um transplante de coração que ele tinha recebido dez anos antes, e o medo de ser invadido por um intruso, no caso um coração que pode lhe salvar a vida. Se seu coração estava desistindo, o deixando na mão, até que ponto poderíamos dizer que aquele órgão era realmente seu? Nancy não reconhece mais seu próprio corpo. Ele agora objetiva parte de seu corpo à sua consciência, algo que jamais havia feito. Ele não é mais completo, mas uma "montagem, um conjunto de órgãos e funções".

O filme de Claire Denis é justamente uma homenagem à riqueza desta viagem metafórica que se esquiva de conclusões simples e se afirma em sua abertura. Dessa maneira, não estamos diante de uma adaptação ou de uma transposição. Ao discutir a relação entre a sua obra e o cinema de Denis, Nancy compara-o a uma forma criativa de "filiação", o que curiosamente aponta para um dos temas centrais do filme: a noção de parentesco ou linhagem, real ou imaginada. Esta filiação se dá na elaboração de novo jogo de metáforas sobre o tema da identidade, da alteridade e da corporalidade.

A adoção deniana se faz, sobretudo, no que Jean-Sébastien Chauvin chama de “perambulação-infiltração”. Em Denis, tudo é transmitido por meio do espetáculo de um corpo em movimento. A câmera busca sempre singularizar este movimento, emulando suas características. Se um personagem anda de bicicleta, deslizamos ao seu lado. Se ele caminha a pé pela floresta, a câmara o segue, na mão, colada à sua nuca, a ponto de sentirmos seu cheiro. Se anda de trenó, é lá que o fotógrafo se posiciona, incorporando o frenesi da corrida. Ao longo do filme, visitamos três paisagens absolutamente diferentes, das montanhas do início ao mar cristalino do final, passando pela cidade grande à noite. Somos transportados e imergimos em diferentes atmosferas, luz, cores. Denis constitui um mundo de fronteiras incertas: sonho e realidade, presente e passado, preto e branco, crianças e adultos, silhuetas e paisagens, figura e personagem, seres humanos e animais... Saad Chakali descreve, muito acertadamente, o trabalho de Denis por seu “impulso oceânico”, onde tudo é pego no limite entre a emersão e a imersão.

Aos poucos, “O intruso” ganha uma atmosfera escura de thriller cujo enredo evoca a presença de uma máfia internacional e o tráfico de órgãos. O que não deixa de ser curioso: Denis não apenas conta histórias, como o faz muitas vezes a partir de um jogo com a noção de gênero. A sinopse de “O Intruso”, por exemplo, nos sugere um filme de espionagem transnacional, e o longa tira algumas vantagens de se apresentar como uma história, negocia nosso engajamento nesse “contar uma história”. O gênero de espionagem já tem seu lugar no cinema, carrega consigo todo um imaginário, um arcabouço interpretativo e emocional. Se por um lado isto ajuda Denis a nos trazer mais para perto, por outro, jamais se configura uma estrutura narrativa reconhecível. A cineasta gera expectativas, mas descarta as convenções do gênero, eliminando do filme aquilo que obriga cada plano a enraizar-se numa continuidade, suprimindo a dimensão narrativa sempre que ela se mostra em vias de se constituir plenamente.